Gosta deste blog? Então siga-me...
Também estamos no Facebook e Twitter
sábado, 11 de agosto de 2018
Na minha caixa de correio
Todos os livros recebidos esta semana foram adquiridos por mim na Feira da Ladra e nos saldos da Bertrand Online, excepto A Biblioteca dos Livros Proibidos, ofertado pela editora Alma dos Livros.
sexta-feira, 10 de agosto de 2018
A Escolha do Jorge: "Campo de Sangue"
“(…)
A felicidade é pouco mais do que alguém a cantar por cima de uma
música (…).”
“Campo de Sangue” – Dulce Maria Cardoso
(Tinta da China)
Quase
duas décadas após a publicação de “Campo de Sangue”, o
primeiro romance de Dulce Maria Cardoso (n. 1964) regressa às
livrarias sob a chancela da Tinta da China que tem apostado na edição
das obras da escritora desde o aclamado romance “O Retorno”
(2011).
“Campo
de Sangue” é um romance tenso e violento, evoluindo num crescendo
de asfixia até o leitor ser esmagado perante a evidência da
tragédia anunciada na abertura.
A
narrativa alude recordar, em certa medida, aos romances de H. G.
Cancela no que respeita aos poucos personagens existentes, o ambiente
tenso em que se movem e o culminar de um crime.
A
narrativa desenrola-se a partir de uma sala de interrogatório onde
quatro mulheres que, aparentemente, nada têm em comum entre si a não
ser o facto de terem ou terem tido uma relação com o responsável
do crime.
A
mãe, a ex-mulher, a senhoria e a rapariga grávida são as mulheres
que aguardam de forma impaciente a sua vez para serem ouvidas na
tentativa de poderem dar luz, alguma explicação ao acto hediodo que
fora cometido pelo homem. Não falam entre si, mas cada uma culpa as
demais presentes, em pensamento.
“Mas
cada uma das três mulheres culpa as outras e é isso que as desune,
atiram para as outras o dever de o salvar, é acima de tudo a culpa
que as desune.”
“Campo
de Sangue” é passado numa cidade nos dias que correm e reflecte,
na sua essência, a complexidade das relações humanas no contexto
de uma sociedade que tende a isolar-se, fragmentar-se, a perder-se,
talvez, e onde todos, com as suas vicissitudes nos tornamos culpados
dado o nosso contributo, mas também inocentes porque não soubemos
fazer melhor.
À
medida que a narrativa evolui, o leitor vai ficando cada vez mais
inquieto, por vezes até dilacerado, porque há palavras,
pensamentos, histórias que magoam e que também não temos para onde
fugir ou onde nos podemos esconder. A culpa…
A
mãe disse que “um filho pode ser um azar muito grande que ninguém
consegue explicar.” Palavras que ferem, palavras que nunca deveriam
ou poderiam ser ditas porque são contra a natureza de ser mãe. “(…)
A única coisa que se tem é tanta vergonha que os olhos dos outros
nos queimam”, continua.
Eva,
a ex-mulher, é também um reflexo da complexidade das relações
amorosas na medida em que, separa-se para poder levar a vida de
mulher rica, sem preocupações, mas nunca deixou de amar o
ex-marido, pagando-lhe o alojamento e alimentação com o dinheiro do
marido que nunca amou. “Não consegues amar-me, não consigo deixar
de te amar, somos dois casos perdidos”, disse Eva ao ex-marido.
“Tens muito tempo e o tempo por gastar é perigoso. O tempo é uma
coisa que só existe para se gastar, para se gastar rapidamente”,
disse-lhe Eva noutra altura.
Eva
acusa a ex-sogra de toda a situação, do crime que veio a perpetrar.
“Se o amasse como devia nunca teria deixado de acreditar que o
filho podia ser alguém na vida, nunca o teria deixado dormir em
restos de lençóis por bordar, os que sobravam e que lhe davam azar
aos sonhos. Se a mãe o amasse como devia, teria acreditado que eles
podiam ser felizes e a mãe nunca acreditou.”
A
rapariga grávida, igualmente presente na sala, desejava que
passassem depressa os quatro últimos meses da gravidez para que o
seu tormento acabasse e se visse livre da criança não desejada e de
toda aquela história não calculada. Um envolvimento fugaz com o
potencial assassino que se viu seduzida pelas promessas (com o
dinheiro da ex-mulher) e deslumbramento daquele homem mais velho em
relação a si enquanto jovem. A rapariga grávida foi assim seduzida
passando a fazer parte de uma história pérfida com um mau fim, sem
dar importância ao dia de amanhã que tanto poderia ser na cama com
esse indivíduo ou outro, tanto poderia abandoná-lo quando se
entediasse ou ser abandonada, tanto fazia, estava por tudo, tudo
valia e assim era porque já tinha passado por tudo isso outras vezes
no seu passado recente.
“Já
te dei o meu coração, já não o posso dar a ninguém, mas estava
farta de tanto amor, disse-lhe muito séria, se queres viver comigo
tens que confiar em mim porque não gosto que me prendam, um pardal
também morre se o aprisionam, sobrevive apenas na rua.”
A
senhoria, uma senhora de idade, proprietária de uma pensão
decadente, com ordem camarária de despejo devido ao perigo que
derrocada iminente do prédio. É a quarta mulher à espera de ser
interrogada em virtude de ter sido o local onde foi cometido o crime.
A senhoria é uma das figuras centrais da narrativa. Se nos diverte
por um lado, pela sua forma de falar, pelos estratagemas que utiliza
na tentativa de manter em pé o prédio e a pensão, o seu ganha-pão,
é também a personagem que reflecte aquela forma comezinha e tacanha
da mentalidade bem portuguesa, uma herança tenebrosa, horrenda, uma
sombra salazarenta ainda tão bem vincada e demarcada na mentalidade
e forma de estar do nosso país. A senhoria é o oxigénio envenenado
que nos mortifica o corpo e a alma, é a pobreza de espírito e a
miséria latente e que se lamenta em cada intervenção que faz. Se
nos diverte por um lado, até porque é das personagens bem definidas
e conseguidas, por outro lado também nos magoa e envergonha porque é
um espelho fidedigno de uma parte do país, triste, cinzento.
Mas é preciso procurar nos
interrogatórios a origem do mal. Qualquer uma das mulheres que
conviveu de perto com aquele que veio a ser criminoso, quando é que
terá percebido do traço agressivo da sua personalidade, nas
palavras e nos actos? Desconfiariam alguma vez que semelhante
indivíduo, pacato, quase invisível perante todos, fosse capaz de
cometer semelhante acto terrível, um verdadeiro campo de sangue?
Poderemos
até questionar se no que concerne a comportamentos obsessivos, o que
é que define, o que é que é preciso dizer ou fazer antes de alguém
perder por completo o controlo das suas emoções ao ponto de ser
capaz de matar de uma forma selvática? Qual é a linha que separa a
razão da loucura? Quem são os loucos que estão ao nosso lado sem
que se dê por isso? Não estaremos nós próprios loucos e não
damos por isso? Será o mal a origem da loucura ou a loucura a origem
do mal? “Comiam e dormiam juntos e no entanto não sabiam quase
nada um do outro, ilhas, uma ausência de amor rodeada de amor.”
A
narrativa avança, procura responsáveis ou pelo menos os
co-responsáveis face ao assassinato cometido, mais não seja como
forma de lavar as mãos e a consciência também perante algo que não
se fez, não se conseguiu prever a tempo.
Falamos
em sociedade porque é sempre mais fácil de falar em alguém ou
naqueles que não têm rosto, é o monstro dos nossos dias que
adquire proporções inimagináveis, capaz de cometer tudo o que, em
consciência, e dotados de razão não imaginamos, mas que, em
conjunto, todos fazemos parte do mesmo processo, da mesma massa, dos
mesmos órgãos, cérebro, sangue. E culpa…
“Quando
espetei a faca à procura do coração que sempre pensei estar a meio
do peito, verifiquei que a carne ainda é mais mole do que parece. A
faca entrou com tamanha facilidade que me pareceu estar a espetar um
pedaço maior de pão. Claro que foi só até apanhar os ossos. Os
ossos são muito difíceis ou talvez a faca não estivesse
suficientemente afiada ou não fosse adequada. Mas abrir o peito a
alguém não é difícil.
Difícil
é tirar o coração a alguém.”
Texto da autoria de Jorge Navarro
quinta-feira, 9 de agosto de 2018
"Ala Feminina" de Vanessa Ribeiro Rodrigues

E são mulheres (como nós) que nos contam como foram parar por detrás das grades, como é estar limitada na sua liberdade, quem deixaram cá fora, o que lhes pesa na alma e como sonham com o mundo que vão encontrar quando saírem. Mas também nos falam do que aprenderam com tudo o que lhes aconteceu e como sentem a falta da palavra liberdade. Dos filhos e da saudade que doi, do trabalho na prisão para passar o tempo e de como e porque foram ali parar.
São muitas as histórias que nos são contadas. Outras, demasiadas, ficam por contar. Agostinha, Mónica, Nádia, Soraia, Margarida... A ala feminina em muitas prisões de Portugal e do Brasil. Um retrato das desigualdades sociais, da reclusão mas também de como o dinheiro fácil ainda (ingenuamente?) é o motor de muita gente que procura a "felicidade".
Terminado em 7 de Julho de 2018
Estrelas: 5*
Sinopse
Pode a reclusão revelar mistérios da condição da mulher?
O que têm em comum uma colombiana, uma romena, uma angolana, uma venezuelana, uma uruguaia, três brasileiras e nove portuguesas? Para elas, a liberdade é um desejo que carregam na mente, livre para sonhar, com o corpo preso num cárcere, labirinto entre o Rio de Janeiro, o Porto e Lisboa.
São mães, vaidosas, filhas, amantes, sonhadoras, escrevem cartas, leem livros, amam. São barqueiras invisíveis entre dois mundos: o mundo cá de fora e um céu gradeado. Este é mais do que um livro-reportagem, é a intuição subjetiva a partir de conversas com mulheres privadas de liberdade: os medos, os desafios, as conquistas, os desabafos, a ânsia de ser livre.
Cris
segunda-feira, 6 de agosto de 2018
Para os Mais Pequeninos: Vamos Ajudar a Terra
A falta de água nalguns países, o lixo que invade os oceanos e que faz perigar a vida no seu interior, a agua potável e quais os meios existentes para podermos aproveitá-la e purificá-la são alguns dos temas que são abordados neste livro e que podem constituir um bom alerta para os mais pequenos. Estar atento e pensar sempre que todos devemos e podemos participar com a pequena/grande contribuição que nos é possível.
Uma viagem no pequeno avião da Pena Branca que as crianças vão adorar pois as ilustrações são giríssimas e muito atraentes. Querem espreitar?
Cris
domingo, 5 de agosto de 2018
Ao Domingo com... Gabriela Oliveira
Publiquei recentemente “Cozinha Vegetariana à Portuguesa”, o quinto título da coleção Cozinha Vegetariana. Quando idealizei estes projetos de livros, tinha como objectivo tornar a alimentação 100% vegetariana acessível e atrativa, chegando a todos os que quisessem mudar ou simplesmente diversificar e melhorar os seus hábitos alimentares. Sendo jornalista de formação e profissão, a culinária vegetariana foi encarada como um desafio criativo. Para mim, não era suficiente a explicação teórica, não bastava detalhar as vantagens de uma alimentação de base vegetal, era preciso mostrar na prática quão fácil e saborosa poderia ser! A pesquisa constante, a experimentação culinária e a produção fotográfica passaram a fazer parte do meu quotidiano e surgiram os livros “para quem quer poupar”, “para quem quer ser saudável”, “para bebés e crianças” e “à portuguesa”, sempre com o mote da “Cozinha 100% Vegetariana”.
A gastronomia portuguesa é riquíssima e, com este livro mais recente, tive a oportunidade de recuperar alguns pratos tradicionais originalmente vegetarianos (como sopas e açordas), bem como converter outros em versões 100% vegetarianas, portanto, sem recorrer à carne, peixe, ovos, leite ou queijo. Nos livros anteriores evitava fazer uma “colagem” aos nomes dos pratos tradicionais mas percebi que as pessoas gostam efetivamente dessa ideia, e tentam reproduzir pratos da culinária portuguesa, por revivalismo ou saudade. Procurei pratos tradicionais, por regiões do país, tendo em conta o tipo de confecção, os ingredientes usados e o seu equilíbrio nutricional. O livro tem receitas como francesinha, pão com chouriço, caldeirada, rancho, migas, feijoada, alheira, pastéis de feijão, queijadinhas, bolos de arroz, borlas de Berlim, entre outras iguarias do receituário tradicional adaptadas à culinária vegan.
Tornei-me vegetariana há mais de vinte anos e encaro o vegetarianismo como algo natural e benéfico, por proteger a vida (a nossa e a dos animais), promover a saúde e o equilíbrio do planeta.
Desejo boas leituras e bons cozinhados!
Gabriela Oliveira
A gastronomia portuguesa é riquíssima e, com este livro mais recente, tive a oportunidade de recuperar alguns pratos tradicionais originalmente vegetarianos (como sopas e açordas), bem como converter outros em versões 100% vegetarianas, portanto, sem recorrer à carne, peixe, ovos, leite ou queijo. Nos livros anteriores evitava fazer uma “colagem” aos nomes dos pratos tradicionais mas percebi que as pessoas gostam efetivamente dessa ideia, e tentam reproduzir pratos da culinária portuguesa, por revivalismo ou saudade. Procurei pratos tradicionais, por regiões do país, tendo em conta o tipo de confecção, os ingredientes usados e o seu equilíbrio nutricional. O livro tem receitas como francesinha, pão com chouriço, caldeirada, rancho, migas, feijoada, alheira, pastéis de feijão, queijadinhas, bolos de arroz, borlas de Berlim, entre outras iguarias do receituário tradicional adaptadas à culinária vegan.
Tornei-me vegetariana há mais de vinte anos e encaro o vegetarianismo como algo natural e benéfico, por proteger a vida (a nossa e a dos animais), promover a saúde e o equilíbrio do planeta.
Desejo boas leituras e bons cozinhados!
Gabriela Oliveira
sábado, 4 de agosto de 2018
Na minha caixa de correio
Esta semana chegaram cá a casa seis livros que tenciono levar comigo nas férias. Foram oferta das editoras:
- Nix, Fantasmas do Passado e Mindhunter - Editorial Presença
- Procura-me Quando a Guerra Acabar e Nome de Código Verity - Topseller
- Fahrenheit 451 e O Mapa de Sal e Estrelas - Saída de Emergência
- Monteperdido - Suma de Letras
sexta-feira, 3 de agosto de 2018
A Escolha do Jorge: "O Dia de Amanhã"
“Todos,
todos os amigos e conhecidos daqueles anos ficavam sob suspeita, e
esta parecia contaminar tudo: as pessoas, o sítio, a própria
época.” (p. 82)
Ler
“O Dia de Amanhã” é mergulhar a ferro e fogo nas décadas de 60
e 70, numa época em que o regime franquista continuava a marcar o
país vizinho do ponto de vista político ainda que desse já alguns
sinais de enfraquecimento. Passada maioritariamente em Barcelona,
esta narrativa retrata-nos uma sociedade que faz o que pode para
sobreviver face às agruras da ditadura, assim como de todos aqueles
que beneficiam do exercício de funções num estado ditatorial,
fazendo-se notar o grande desejo de uma qualquer revolução iminente
que nunca aconteceu ou o desejo da morte do ditador que só acontece
em 1975, altura em que a Espanha instaura o regime democrático, à
semelhança do que tinha acontecido no ano anterior, em Portugal.
Ignacio
Martínez de Pisón (n. 1960) consegue de forma magistral fazer a
fusão entre literatura e historiografia, uma vez que perdemos a
noção onde começa uma e a outra. Com uma escrita elegante tanto
quanto apaixonante, e com o suporte de uma tradução rigorosíssima,
o leitor ao longo de quase trezentas páginas mergulha num período
conturbado da vizinha Espanha que, em variadíssimos aspectos, tem
muito em comum com a História recente do nosso país.
Personagens
bem fundamentadas, com personalidade forte, com a descrição do seu
dia-a-dia, dão, no seu conjunto, a ideia de como se teria vivido nos
anos 60 e 70 na cosmopolita Barcelona. Ao longo da narrativa vão
desfilando um leque variado de personagens que se vão intercalando e
que nos contam não só o seu cadinho de história que, no fundo, vão
construindo aquele retrato da Espanha franquista, mas também são
esses mesmos personagens que nos vão dando a conhecer quem foi Justo
Gil.
Justo
Gil é um emigrante que chega a Barcelona com o desejo de uma vida
que nunca teria na sua longínqua aldeia e que, graças à sua
esperteza e todo um conjunto de artimanhas, consegue tudo por tudo
para também sobreviver no seio do regime.
Justo
Gil é seguramente um dos personagens mais incríveis tanto quanto
horríveis que a literatura pode alguma vez conseguir. Poucos são
aqueles que conseguem fugir ao poder sedutor de Justo Gil, ainda que
se trate de uma das figuras mais hediondas que podem alguma vez
existir.
Se
“O Dia de Amanhã” é um livro electrizante, deve-o em grande
parte à figura de Justo Gil de quem alguns dos personagens, e até o
leitor, acabam por ter pena (?), pois, nalguns casos chegaram mesmo a
nutrir amizade e afecto por ele.
Justo
Gil é um indivíduo camaleónico que se adapta a todas as
dificuldades e circunstâncias no intuito de sobreviver num regime
asfixiante, tendo mesmo acabado por se tornar num eficiente
informador, o Ratazana, a alcunha com que ficou conhecido, da Brigada
Social, a polícia política do regime franquista.
Tudo
vale para Justo Gil! De boa aparência e com falinhas mansas, é
difícil não cair no conto do vigário. Tanto no que concerne à
forma com que se aproxima das mulheres no intuito de lhes extorquir
dinheiro e também por puro prazer físico, Justo Gil não sente
qualquer pudor em abandonar as mulheres que lhe demonstraram afecto.
Quanto
às amizades, não deixa de ser curiosa a forma como se aproxima das
pessoas com a finalidade de as denunciar ou de denunciar terceiros à
Brigada Social.
Justo
Gil é um verdadeiro crápula, um facínora social que partilha da
desgraça alheia para a aniquilar, unicamente com a intenção de
ganhar reconhecimento e dinheiro a partir de um sistema decrépito.
Tal
como acontece com a queda das ditaduras, a sociedade procura
equilibrar-se e reajustar-se na nova conjuntura política, com a
instauração da democracia e, nos sectores mais conservadores, o
recurso ao silêncio e às aparências da defesa do liberalismo são
uma constante em oposição à vergonha que sentiriam ao serem
apontadas como defensoras dos valores franquistas.
Neste
aspecto, Justo Gil também se soube adaptar às novas circunstâncias
políticas. De informador e delator no regime franquista, passa a ser
um dos infiltrados num dos movimentos de extrema-direita na
Catalunha, durante os primeiros anos da democracia.
Mais
uma razão pela qual “O Dia de Amanhã” é uma obra tão
significativa, grandiosa até. Ajuda-nos a compreender as
manifestações e rebelião que têm decorrido na Catalunha ao longo
do último ano na tentativa de esta província alcançar a
independência.
Não
aludirei ao fim de Justo Gil ainda que se possa apresentar mais ou
menos previsível, justo, quiçá, como que de alguma forma o seu
nome assim o exigisse.
“O
Dia de Amanhã” é, pois, uma obra marcante e inesquecível e que
ao mesmo tempo nos transporta para um passado recente e que tanto tem
condicionado as décadas da democracia em Espanha.
Excertos:
"Como
é que não havíamos de ser franquistas se foi Franco quem nos tirou
da rua e nos deu cama, comida, educação, trabalho...?, diz Mateo
Moreno. Para os meninos-bem, os que tinham pai e mãe e casa própria,
era muito fácil ser antifranquista. A nós, aos que crescemos nos
Hogares Mundet, isso nem sequer nos passava pela cabeça. Possuíamos
poucas coisas, mas as que tínhamos devíamo-las ao regime, e quem
não é agradecido não é bem-nascido." (p. 85)
"O
pouco que sabia do Justo estava de acordo com a ideia que se tinha
dum informador da polícia: a presença em Montserrat, o hábito de
apontar tudo o que se dizia, a atitude esquiva, própria de quem tem
muito a esconder... Lembrei-me dos livros que o vira comprar, mas
onde é que está escrito que um bufo não pode ter um fraquinho por
Santa Teresa e São João da Cruz? Lembrei-me também da frase dele
sobre a purificação através da palavra: uma afirmação
significativa vinda de alguém como ele, que usava o poder da palavra
para sujar e não para limpar, para fazer mal e não para curar."
(pp. 201-202)
"O
liberalismo desprezado pelos franquistas, imaculado, oferecia-se
agora como uma árvore boa para se encostar, e muitos conservadores
limitavam-se a trocar um abrigo por outro: a sombra protectora do
franquismo pela sombra protectora do liberalismo. A minha aproximação
à extrema-direita não era, pois, uma coisa de que pudessem
sentir-se orgulhosos lá em casa, porque lhes recordava a sua própria
deslealdade. Lá no fundo, talvez me tivesse ligado a essa gente só
para atirar à cara dos meus pais a cobardia e a mediocridade deles.
Nessa altura, não gostava nada dos meus pais: ele tão submisso, tão
cumpridor, a tratar das contabilidades dos vizinhos nas tardes
livres, a fingir um interesse excessivo pela saúde dos clientes, e
ela tão arranjadinha e tão poupadinha, tão própria com aqueles
seus casaquinhos de malha que já ninguém usava, sempre tão
preocupada com a opinião dos outros.” (p. 243)
Texto da autoria de Jorge Navarro
cara dos meus pais a cobardia e a mediocridade deles. Nessa altura,
não gostava dos meus pais: ele tão submisso, tão cumpridor, a
tratar das contabilidades dos vizinhos nas tardes livres, a fingir um
interesse excessivo pela saúde dos clientes, e ela tão arranjadinha
e tão poupadinha, tão própria com aqueles seus casaquinhos de
malha que já ninguém usava, sempre tão preocupada com a opinião
dos outros."
quinta-feira, 2 de agosto de 2018
"Um de Nós Mente" de Karen McManus

A trama arrebata o leitor logo no início das primeiras páginas: cinco jovens são chamados ao gabinete de um professor (sala de castigo) porque não tinham deixado os telemóveis nos seus cacifos e truxeram-nos nas mochilas para as aulas. Mas, o que primeiro pensaram ser uma partida de mau gosto, já que os telemóveis confiscados não eram deles, transformou-se num pesadelo! Um deles morre ali mesmo com um choque anafilático, resultado de ter bebido um copo de água onde foi colocado óleo de amendoim, substância a que ele era alérgico.
Os restantes quatro colegas são, lentamente, acusados de o terem matado. Motivos? Todos tinham. Mas daí a cometer um acto tão cruel contra aquele que, através de um jornal estudantil, lhes punha a descoberto segredos que não queriam revelar, vai um passo muito grande! Quem foi afinal o assassino?
Os personagens são-nos apresentados através de capítulos alternados e onde eles se vão expondo, cada um deles na primeira pessoa. Desde logo se cria uma empatia com todos eles o que torna difícil para o leitor discernir se algum esconde mais do que parece...
Como referi, é um livro que se lê rapidamente porque a envolvência com a história e com os personagens faz-se logo nas primeiras páginas e a trama mantém-se activa no decorrer da história. Recomendo sem reservas para todos, mesmo tratando-se, segundo creio, de um YA (young adult).
Terminado em 31 de Julho de 2018
Estrelas: 5*
Sinopse
Simon Kelleher é o criador do Má-Língua, uma nova aplicação que está a encurralar a elite de Bayview High, revelando pormenores da vida privada dos alunos da escola.
Mas o caso torna-se mais grave quando Simon e quatro colegas ficam fechados de castigo numa sala, e ele morre diante das suas vítimas.
Os quatro que se tornam suspeitos imediatos do homicídio, são:
A melhor aluna da escola, Bronwyn que nunca viola uma regra e quer entrar em Yale.
A estrela da equipa de basebol de Bayview, Cooper.
Nate, o criminoso, que está em liberdade condicional por vender droga.
A menina bonita, Addy, que parece ter a vida perfeita ao lado do namorado perfeito.
Que segredos queriam esconder para eliminar Simon?
Quem será o culpado?
Cris
terça-feira, 31 de julho de 2018
"Submersos" de J.M. Ledgard

Disso vamo-nos apercebendo lentamente com o decorrer da história e também é lentamente que nos vão sendo descritos os relatos do seu cativeiro na Somália, junto com descrições do ambiente social e político dos seus captores, jihadistas. Paralelamente vamos acompanhamdo Danielle no seu trabalho de pesquisa do e no oceano.
Assim, a leitura é intercalada com cenas do mais puro horror, que se não verídicas, pelo menos verosímeis, e outras mais suaves e românticas, espelho de um passado feliz entre os dois personagens.
Uma leitura dura que adorei mas que não recomendo aos estômagos mais frágeis! Sempre aprendendo com estes meus amigos, os livros!
Terminado em 21 de Julho de 2018
Estrelas: 5*
Sinopse
Confinado a um quarto sem janelas, algures na costa oriental africana, James More é mantido em cativeiro por guerrilheiros jihadistas. Capturado enquanto espiava as operações da al-Qaeda na região, enfrenta agora privações extremas, tortura e marchas forçadas pelas terras áridas da Somália.
A milhares de quilómetros de distância, no mar da Gronelândia, Danielle Flinders, biomatemática, prepara-se para mergulhar nas águas profundas do oceano a bordo de um submarino. Apesar da distância que separa James e Danielle, as memórias de ambos fazem-nos regressar ao Natal do ano anterior, passado num hotel na costa atlântica francesa, num encontro do qual resultou um intenso romance entre os dois. E é sempre de um para o outro e para o oceano que as suas mentes os conduzem num magnetismo poderoso, ao mesmo tempo ameaçador.
Para saber mais sobre este livro, aceda ao site da Editorial Presença aqui.
Cris
sexta-feira, 27 de julho de 2018
A Escolha do Jorge: "A Noite do Professor Andersen"
“A Noite do Professor Andersen”
Dag Solstad
(Cavalo de Ferro)
“O
que agita os corações das massas são as consequências da nossa
própria inadaptabilidade.” (p. 80)
“(…)
Já não temos uma consciência histórica, porque isso significa que
o nosso tempo desaparecerá connosco.” (p. 81)
Romancista,
contista e dramaturgo, Dag Solstad (n. 1941) é um dos nomes mais
importantes ligado às letras norueguesas na actualidade. Para quem
leu “Pudor e Dignidade” (Ahab, 2009), rapidamente se recordará
do estilo irónico, contido, reflexivo e também corrosivo na forma
como expõe as suas ideias no que concerne aquilo que interpretamos
por vida moderna e aquilo que nos move no sentido da felicidade.
Neste
romance “A Noite do Professor Andersen” (1996) de Dag Solstad,
publicado agora pela Cavalo de Ferro e com uma tradução
elegantíssima tanto quanto soberba a cargo de João Reis,
apresenta-nos uma obra que tem uma vez mais como figura central um
professor, desta vez, um professor universitário de Literatura
Norueguesa, um especialista das obras de Ibsen, o grande dramaturgo
de todos os tempos da Noruega.
A narrativa parte de um
episódio singular de o professor Andersen, na noite de Natal,
estando sozinho em casa, assiste ao assassinato de uma mulher, a
partir da janela da sua casa, no prédio em frente. Não sabendo
como, nem porquê, o professor Andersen decide não comunicar o
sucedido à polícia, optando por deixar o assassino em liberdade
ainda que se questione sobre quem seria a mulher, entretanto
assassinada, e o que acontecera com o corpo.
É
este episódio de grande comoção e estremecimento que leva o
professor Andersen a reflectir sobre a importância das obras de
Ibsen e a sua relação com as tragédias gregas de há 2500 anos.
Sob o mote de “Quando é que te comoveste pela última vez ao ver
ou ler uma tragédia grega?” (p. 80), o professor Andersen reflecte
sobre o estímulo que nos liga à vida e simultaneamente ao passado,
não esquecendo a reflexão sobre a durabilidade de uma dada obra de
arte, literatura, neste caso, por exemplo as obras de Ibsen, no
contexto da cultura norueguesa, mas como participantes de todo um
espírito herdado da cultura grega.
É
esta ideia de emoção/comoção impulsionada pela literatura que
constitui o estímulo que nos liga à vida, num ciclo que avança no
tempo através das novas gerações face à inquietação que sentem
ao compreenderem a obra de arte. Tal só é possível graças à
consciência histórica que temos enquanto homens e mulheres, mas
esta consciência é em si mesma limitada graças à batalha que
travamos com o tempo, o tempo linear, onde vivemos e morremos.
O
professor Andersen reflecte sobre esta temática na medida em que, de
um modo geral, o ser humano apenas consegue ter recordação ou
memória até duas gerações. A partir daí entramos na escuridão.
Em função desta ideia, desenvolve-se precisamente a capacidade de
as obras de arte sobreviverem ao tempo em que foram criadas. “A
suspeita de que a consciência humana não era capaz de criar obras
de arte que sobrevivessem à sua própria época. A batalha fútil da
consciência contra o tempo.” (p. 84) “A corrosão do tempo
destrói até os maiores feitos intelectuais, torna-os pálidos,
esbatidos.” (p. 82)
Neste
sentido, é, pois, necessário, ao apresentar as obras de Ibsen,
proceder a uma articulação com as tragédias gregas, de forma a que
se perpetue a ideia de cultura, num sentido mais abrangente. É esta
percepção da humanidade no que concerne à consciência história
que constitui o estímulo, a ligação passado-presente como que uma
ideia ancestral que remonta aos primórdios da Civilização
Ocidental, neste caso, a Grécia Antiga, o berço da Civilização
Ocidental, que constitui a identidade cultural que nos permite saber
quem somos e de onde viemos.
Neste
sentido, a obra de arte, literária ou não, deverá resistir ao
tempo em oposição à vida do Homem em geral, mas porque participa
da História, porque conta, em certa medida, a História do Homem.
Assim,
o estímulo constitui a força geradora que fomenta a criatividade
para a “construção” de obras de arte; o estímulo é uma
espécie de grito como resultado do choque em detrimento de ideias e
paradigmas estabelecidos.
Sobre
este ponto em particular, o professor Andersen reflecte sobre a sua
atitude, enquanto jovem, no que respeita ao seu interesse pela arte,
na medida em que “não procurava conforto, mas inquietação. Não
procurava a ordem que fora programado para ver e compreender, mas a
dissolução dessa ordem. Não se voltou para a arte para receber,
mas para ver.” (p. 39)
Passados
trinta anos, o professor Andersen é levado a concluir que estagnou
no tempo. A sua vida, a boa vida que leva face ao estatuto social que
a sua profissão lhe confere, à semelhança dos demais amigos da sua
geração, igualmente bem-sucedidos, apesar do conforto e qualidade
de vida adquiridos por via do dinheiro que coleccionam e esbanjam em
luxos e caprichos, não é sinónimo, contudo, de continuarem a
sentir a força, a energia que os move para a construção do futuro
ainda que com ligação ao passado, numa perspectiva cultural.
O
professor Andersen é cáustico no que respeita a esta ideia de
comodismo dado que é este comodismo que é interpretado por
inadaptabilidade pelas gerações mais jovens que permitem que a vida
e o futuro avancem. “(…) Não somos intelectuais intemporais,
somos intelectuais numa época comercial e profundamente influenciada
pelo que agita os corações das massas. O que agita os corações
das massas são as consequências da nossa própria
inadaptabilidade.” (p. 80)
Regressando
ao episódio do assassinato na noite de Natal a que o professor
Andersen assistiu, talvez tenha sido a luta entre o dever moral, o de
informar as autoridades face ao sucedido, e o ter o poder de decidir
a liberdade ou a prisão do assassino que tenha gerado a ideia ou
mesmo o sentimento de emoção/comoção que há décadas não o
vivia e que, agora, com 55 anos, já um homem maduro, voltou
novamente a sentir a ilusão conferida pelas tragédias gregas de há
2500 anos filtradas pela linha do tempo e assimiladas pela cultura
que se construiu.
Ao
mergulharmos neste romance-ensaio de Dag Solstad, somos levados a
reflectir sobre nós e o mundo, assim como a arte em geral, como
manifestação do espírito criativo, que tenta sobreviver ao seu
tempo.
Mordaz
e inteligente, “A Noite do Professor Andersen” é uma obra
singular que apresenta a literatura como obra de arte nessa difícil
tentativa de subsistir no tempo como as obras de Ibsen.
Texto da autoria de Jorge Navarro
quinta-feira, 26 de julho de 2018
A Convidada Escolhe: "O Nervo Óptico"
O
Nervo Óptico, María Gainza, 2014
Tive
com este livro uma experiência que nunca tivera antes. Li-o e quando
cheguei ao fim decidi voltar a lê-lo, desta vez com mais vagar,
pesquisando os pintores e os quadros que são nomeados ao longo do
livro, como se eu também acompanhasse a narradora/autora nas suas
deambulações pelos museus, galerias e salas onde ela encontra os
seus quadros favoritos ou aqueles que de alguma forma a levam “a
sentir aquela agitação que alguns descrevem como borboletas no
estômago…”
Também
a capa me atraiu e me criou repulsa. A imagem é sugestiva e
corresponde à imagem de uma mulher sozinha numa sala de um museu a
observar aquele quadro especial e único. Mas o título tal como está
grafado, numa subserviência ao novo acordo ortográfico é um
disparate. “O Nervo Ótico” para traduzir “El Nervio Óptico”!
O Dicionário da Língua Portuguesa distingue de forma clara: ótico=
do ouvido; relativo ao ouvido e óptico= referente à óptica ou à
vista; visual.

O
livro é constituído por onze capítulos distintos em que a
autora/narradora nos guia por momentos diversos da sua vida enquanto
criança, jovem adolescente, adulta, desvendando-nos acontecimentos
em que os pais, ou os irmãos, amigas/os, familiares, o marido ou ela
própria são protagonistas. São quadros da sua vida que vai
associando a quadros de pintores que ela visita em museus na
Argentina ou noutras partes do mundo, alguns argentinos menos
conhecidos, outros mais famosos. A sua formação em História da
Arte permite-nos seguir pelo livro como se acompanhássemos uma guia
em visita a um museu, enquanto nos convida a reflectir sobre temas
tão diversos como os medos, a infância e a velhice, a fragilidade
da vida, mas usando frequentemente um tom bem humorado.
Alguns
breves traços desses capítulos:
Como
para ela os museus são uma espécie de abrigo, pois “o meu
instinto de sobrevivência leva-me sempre aos museus”, a recordação
de um dia em que o ar da cidade de Buenos Aires ficou irrespirável
devido à poluição e às cinzas de um fogo descontrolado, levou-a a
tentar ver as telas de Candido López, um pintor argentino conhecido
pelas cenas de guerra para quem o fogo e o fumo eram o mais difícil
de pintar.
A
partir da ideia presente em todo o livro de que “escrevemos uma
coisa para contar outra”, a cena de caça pintada por Alfred de
Dreux em que um cervo é encurralado por cães fá-la recordar a
morte acidental de uma amiga apanhada por uma bala perdida.
Quando
fala da amiga de infância - Alexia - a sua outra metade, uma espécie
de “amiga genial”, cheia de contradições e de disfarces,
associa-a à personalidade do japonês Fujita, o pintor de gatos, um
verdadeiro camaleão ao longo da sua vida.
A
atracção de Courbet pelo mar tempestuoso fá-la recordar uma prima
invulgar também chamada María que um dia se afogou e que cobria as
paredes do quarto com recortes azuis de revistas, numa colagem de mar
revolto.
Os
cavalos, um dos temas favoritos de Toulouse-Lautrec dão ensejo a que
recorde um episódio vivido pela prima – Amalia – que conhecera
duas japonesas a quem dera aulas de conversação em espanhol e que
viviam numa casa encostada a um hipódromo. O traço comum entre a
jovem japonesa e Toulouse-Lautrec foi o destino trágico de ambos
cuja vida os marcou por uma deformidade física.
A referência a Rothko aparece em dois momentos: numa reprodução na
sala de espera do consultório de um oftalmologista que a narradora
consultou por causa do “olho louco” e numa imagem junto à cama
do hospital onde o marido está internado. São apenas reproduções.
Mas para ver Rothko, tem que se ver uma tela ao vivo, porque uma
reprodução não consegue ter a força das cores vibrantes deste
pintor. Artistas invulgares e que ganham notoriedade dificilmente
conseguem deixar de ser alvo de críticas e de invejas, mas ao
contrário de outros pintores que são engolidos pelo sistema, Rothko
não se vendeu ao “dinheiro podre”.
A
imagem do tio Marion fica associada à liberdade, ao desejo de romper
com as prisões, com as convenções, mesmo quando nas visitas que
faz aos sobrinhos lhes leva um colibri numa gaiola, sabendo que
dificilmente ele irá sobreviver. Com efeito, “encerrarias num
frasco os raios de sol?”
O medo de andar de avião, coisa que passou a ser persistente com a
idade, leva a narradora a falar sobre a arte de Henri Rousseau e de
como os balões de ar quente o fascinaram e em muitas das suas
pinturas o céu é cortado por balões e outras máquinas de voar.
María
Gainza fala da sensação que teve ao olhar “La Niña Sentada”
uma pequena tela de Schiavoni e reconhecer-se nesse quadro quando era
criança. Embora seja para ela um motivo de alegria rever-se naquele
quadro, com a idade tem evitado visitar-se com frequência. O
confronto com o que fomos e o que somos nem sempre é feliz!
O
último capítulo, episódio, conto… é ensejo para falar da
pintura de El Greco, pintor cuja obra ela viu numa visita que fez ao
irmão mais velho que vive nos Estados Unidos. Um irmão com quem
sempre teve uma relação difícil. Anos mais tarde, a família
recebeu a notícia do seu falecimento repentino. Também um dia, a
autora se vê confrontada com um tumor que a vai pôr em contacto com
“um grupo de iluminados que vem diariamente fazer rádio” e
parece que há em todos eles uma tranqulidade, uma capacidade de
viver sem ansiedade. Cito as frases com que termina este livro
diferente, especial: “Sinto uma suave felicidade no cair da neve,
felicidade poética, acho que é assim que dizem. Daria um braço
para me lembrar de quem lhe chamou assim.”
24
de Julho 2018
Almerinda
Bento
quarta-feira, 25 de julho de 2018
"A Música da Fome" de J. M. G. Le Clézio

Sabia vagamente que a época retratada rondava a II Guerra e foi esse o meu principal apelo para o ler. Contudo, não foi uma leitura semelhante às que tenho feito e, se por um lado, tive pena que as personagens não tivessem um papel mais participativo na guerra, por outro lado, gostei de ler algo diferente do habitual.
A guerra está lá, é certo, e isso vê-se na falta de alimentos que grassava na altura, na ida dos homens para a frente, na mudança de vida que se verificou sobretudo ao nível dos personagens secundários. Mas, é como se ela caminhasse paralelamente à história de Ethel Brun, a personagem principal, sem lhe tocar verdadeiramente. Foi isso que senti. Ethel passa quase incólume à devastação que foi o holocausto, não tendo sido este acontecimento o principal motor da mudança que se deu na sua vida. O amor pelo seu tio-avô, a inconstância do seu pai que os levou à ruina, marcou muito mais a sua vida. Este foi um aspecto de que verdadeiramente não estava à espera.
A escrita de Clézio é suave, descritiva e bastante pormenorizada, o que nos leva a imaginar os lugares e as situações muito detalhadamente.
Da amizade da protagonista com Xenia, uma colega da escola, espera-se que resulte algo mais do que o descrito no final. Não sei bem se isso me agradou ou não. E digo isto porque a vida é mesmo assim e às vezes prega-nos partidas: quem não teve já um(a) amigo(a) importante na sua infância e que, simplesmente, o "perdeu"?
Gostei, recomendo e fiquei com a sensação que poderia perfeitamente ser um romance baseado em factos verídicos.
Estrelas: 4*
Sinopse
Ethel Brun é filha de um casal de exilados, formado por Justine e Alexandre, um homem afável e irrequieto que muito jovem deixou a ilha Maurícia e que, na alegre Paris dos anos 20 e 30, se dedica a delapidar a herança em negócios pouco recomendáveis. Na infância, o único prazer de Ethel é passear pela cidade com o seu tio-avô, o excêntrico Samuel Soliman, que sonha ir viver para o pavilhão da Índia Francesa construído para a Exposição Colonial. E, na adolescência, Ethel conhecerá algo parecido com a amizade pela mão de Xenia, uma colega de escola, vítima da Revolução Russa e que vive quase na miséria. O bem-estar de Ethel começa a resvalar quando, nas refeições que o seu pai oferece a parentes e conhecidos, se repete cada vez mais o nome de Hitler. Serão os primeiros sinais do que ameaça a família Brun: a ruína, a guerra, mas, sobretudo, a fome. Ela marcará o despertar da jovem Ethel para a dor e o vazio, mas também para o amor, num romance em torno das origens perdidas, durante uma época que culminou com um apocalipse anunciado.
Cris
terça-feira, 24 de julho de 2018
"999+1 Piadas Ainda Mais Secas" de Pedro Pinto, Gonçalo Castro e João Ramalhinho

Mantive este livro alguns dias na mesa de cabeceira e, de quando em vez, lia algumas piadas. São, na verdade, piadas que nos dispoēm bem, algumas meias parvas de tão ridículas e evidentes que são. O subtítulo sugere "tenta lá (não) rir". E é mesmo verdade! É mesmo impossível não sorrir!
Querem divertir-se? Este é o livro!
Terminado em Julho de 2018
Estrelas: 4+
Sinopse
Depois de porem milhares de portugueses a rir, e a pedido de muitas famílias que já não aguentavam ouvir as mesmas 500 tentativas de ter graça, os autores do bestseller O Caderno das Piadas Secas voltam à carga com 999+1 Piadas AINDA Mais Secas.
O dobro das piadas, mas metade da graça… Porque para bom entendedor, meia palavra basta.
Dos autores do bestseller «O Caderno das Piadas Secas» - livro revelação de 2017 - com mais de 40 mil exemplares vendidos.
Cris
segunda-feira, 23 de julho de 2018
"O Pecado da Gueixa" de Susan Spann

É uma verdadeira viagem no tempo a que este livro nos propõe. 1560, aproximadamente. Quioto, Japão. Uma gueixa é encontrada junto a um homem morto numa casa de chá, completamente desfeita emocionalmente e com as roupas manchadas de sangue. Tudo indica que foi a autora do crime...
A partir daí uma sucessão de acontecimentos rápidos e envolventes dão origem a dois dias de uma procura relâmpago do verdadeiro assassino por parte de Hiro, o samurai, e do Padre Mateus. Mas também, e sobretudo (tratou-se da parte que mais gostei) de um explicar muito aprofundado dos costumes dessa época, onde a honra dos samurais obrigava a uma conduta específica e regras que nos são desconhecidas e estranhas.
Se descobri o assassino? Não sou a pessoa mais indicada para chegar a meio de um livro com a "certeza" de ter descoberto quem matou quem e, aqui, também não foi diferente. Embora goste de ler thrillers não é o meu género de leitura dominante. Porém, mesmo para os mais ágeis leitores nestas coisas de mortes, acredito que aqui não será fácil descobrir o assassino! Eu não desconfiei nadica de nada.
Envolvente e enriquecedor, um thriller para guardar na prateleira dos "preferidos".
Terminado em 14 de Julho de 2018
Estrelas: 5*
Sinopse
Um missionário português enfrenta o código samurai para salvar a vida de uma mulher.
Um romance repleto de pormenores de época e com um refinado conhecimento da cultura japonesa.
Quioto, 1564. O padre Mateus, um jesuíta português, está no Japão como missionário. Quando uma gueixa convertida ao cristianismo é acusada da morte de um samurai, o padre compromete-se a ajudá-la, arrastando o seu protetor, o mestre ninja Hiro Hattori, para a investigação.
Ao mergulhar nas perigosas águas do mundo noturno de Quioto, percebem que toda a gente tem um motivo para querer manter a morte do samurai envolta em mistério. As pistas amontoam-se e apontam para demasiados suspeitos: da rara arma do crime a uma mulher samurai, passando por uma relação amorosa, um viajante incógnito e alguns negócios obscuros.
Cris
domingo, 22 de julho de 2018
sábado, 21 de julho de 2018
Na minha caixa de correio
Esta semana o blogue esteve a meio gás... Preguiça (mesmo) de quem chega de férias, após uma semana a dar cumprimento a outra paixão: viajar! Desta feita dei uma volta pela Alemanha
(Frankfurt, Mainz, Munique), França (Estrasburgo e Colmar) e Áustria(Innsbruck e Salsburgo). Adorei! Quem não...?
Mas, se o blogue esteve parado, os livros não pararam de chegar! Então foi assim:
- A Tia Júlia e o Escrevedor, À Luz do que Sabemos e Ensina-me a Voar Sobre os Telhados comprei em segunda mão. Chegaram via CTT.
- Do Liga e Ganha fui buscar: A Última Mentira, A Esposa Secreta, A Fome, Cebola Crua Com Sal e
Broa, Reencontro com o Passado (livro de bolso), A Mulher do Expresso do Oriente, Nó Cego e Visão Mortal;
Oferecidos pelas editoras parceiras (o meu obrigada, desde já!):
- Diz-lhe Que Não, Esfera dos Livros,
- O Manuscrito, Bertrand
- Calvin Esparguete, D. Quixote
- A Filha de Cayetana, Casa das Letras
- Um de Nós Mente, Gailivro
- Vamos Ajudar a Terra, Asa
- Trânsito, Quetzal
- Melhore a sua Visão, Pergaminho.
Em resumo, uma semana sem posts mas recheada de livros! Amanhã saem os resultados do passatempo do 8 Aniversário do blogue. Estejam atentos!
Subscrever:
Mensagens (Atom)