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quinta-feira, 30 de novembro de 2023

A Convidada Escolhe: "Caro Professor Germain – Cartas e Excertos"

Caro Professor Germain – Cartas e Excertos”, Albert Camus, 1945 a 1959

Só recentemente, a 5 de Maio deste ano, no Dia Mundial da Língua Portuguesa, numa conferência promovida pela FENPROF e através da comunicação feita pelo professor António da Nóvoa, tive conhecimento das palavras de Albert Camus dedicadas ao seu professor da primária, quando em 1957 recebeu o Prémio Nobel da Literatura. Quando em Setembro último a Livros do Brasil editou este “Caro Professor Germain – cartas e excertos”, decidi pela compra do livro, curiosa por conhecer esta outra faceta do escritor argelino, já que dele apenas conhecia “O Estrangeiro” e “A Peste”.

Na primeira carta aqui publicada, Camus tinha 34 anos, vivia em Paris, era casado e pai de um casal de gémeos. O professor, então com 61 anos e de regresso a Argel, mostra o desejo de se encontrar com o querido aluno antes de regressar a casa. A fórmula usada na saudação das cartas denota uma grande ternura e respeito entre os dois: “Meu caro rapaz” e “Caro Professor Germain”. Transcrevo algumas declarações de gratidão e carinho nestas cartas muito pessoais, para alguém que foi órfão de guerra e encontrou no professor dos primeiros anos de escolaridade o pai que nunca conheceu –“… um dos dois ou três homens a quem devo praticamente tudo” (pág. 16), “O senhor foi o melhor dos mestres” (pág. 17), “filho espiritual” (pág. 18). A gratidão de Camus para com o mestre é, não apenas porque sempre o tratou como um filho, mas enquanto professor, pelo conhecimento, pela forma motivadora e inovadora como abria perspectivas aos seus alunos, levando-os a pensar, a reflectir e a fazer escolhas. E sobretudo a gratidão por ter acreditado e investido nas suas capacidades, invertendo a roda do destino que o conduziria, devido à sua condição de pobre, a um futuro sem futuro porque “a miséria é uma fortaleza sem ponte levadiça.” (pág. 60). Daí que não se tenha esquecido de nomear o seu mestre no discurso na Suécia e tenha escrito na carta de 19 de Novembro de 1957 o seguinte: “mas quando soube da notícia, o meu primeiro pensamento, depois da minha mãe, foi para si. Sem o senhor, sem essa mão afetuosa que estendeu à pequena criança pobre que eu era, sem o seu ensinamento e exemplo, nada disto me teria acontecido.” (pág. 34)

As cartas trocadas entre Albert Camus e o professor Louis Germain são ternas trocas de palavras e de sentimentos que unem aluno e mestre e persistiram muito para além do período da escola primária, depois de Camus ter seguido o liceu com outros mestres. São cartas simples, falam sobre a família, os problemas de saúde, as erradas escolhas orçamentais que dão pouco à escola pública e os receios pelos ataques à escola laica, os conselhos do mestre ao antigo aluno para ter cuidado com a vida e não fazer excessos. Na última carta, de Outubro de 1959, Camus mostra o seu desapontamento com o estado do mundo “O mundo atual é um peso difícil de suportar. São homens como o senhor que ajudam a tolerá-lo. E, além disso, é feito de cimento armado.” (pág. 48)

A segunda parte do livro é um excerto de “O Primeiro Homem” um livro autobiográfico, inacabado, ainda em rascunho. O capítulo “A Escola” aqui publicado traz a público esse período decisivo na vida e no futuro de Camus, através das personagens Jacques e Bernard. É recriado o ambiente dos bairros pobres de Argel a cheirar a “especiarias e pobreza” (pág. 53), os cães e os gatos à procura de restos nos caixotes do lixo, os comerciantes árabes que vendem no mercado, o porto, os cais de carvão, a escola na rua Aumerat, as reguadas e os castigos corporais ainda vistos como método, as ofensas e as lutas entre alunos, o empenhamento do professor Bernard (Germain) para que os seus alunos mais desfavorecidos, porque órfãos da guerra, pudessem aceder a bolsas para continuar os seus estudos. É neste excerto que surgem a mãe e avó de Jacques (Camus) com personalidades tão diversas – a primeira uma mulher doce, a segunda dura e decidida – mas ambas familiarizadas com a pobreza, o trabalho e a morte. Sem a intervenção do professor junto à avó “uma velha mula teimosa” (pág. 75) o pequeno Jacques não teria continuado a estudar e ficaria apenas com os estudos básicos.

Apesar da grande evolução da escola e da mudança nos métodos pedagógicos desde a altura em que o livro foi escrito, “Caro Monsieur Germain” é uma homenagem à escola pública, ao professorado e à relação aluno/professor. Para além de local de aprendizagem e de socialização, a escola pode e deve ser um espaço de felicidade e de sonho. A certa altura, no seu romance autobiográfico, Camus parece que se esquece que criou a personagem Bernard e troca o nome pelo nome do seu professor primário: “Nas aulas do senhor Germain, pela primeira vez, eles sentiam que tinham uma existência própria e que eram tidos em grande apreço: eram considerados dignos de descobrir o mundo.” (pág. 61)


Almerinda Bento

22 de Novembro de 2023


terça-feira, 28 de novembro de 2023

"A Lua de Joana" de Maria Teresa Gonzalez

Claro que já tinha ouvido falar deste livro mas ainda não o tinha lido. Uma oferta fantástica para o Natal para quem não sabe o que dar a alguém que ronde os 10/12 anos! 

Joana tem 13 anos, uma melhor amiga vítima de uma overdose sem que ela tenha desconfiado que ela se metia com substâncias perigosas. Aparentemente os pais da amiga constituíam uma família exemplar, sem problemas de maior, que a apoiavam e ouviam. 

Joana escreve a Marta. Pôe no papel o que lhe vai sucedendo no dia a dia, as suas inquietações e o seu desamparo pois tirando a avó, que vive com eles, a sua família sofre de algo muito em voga nos dias de hoje: não tem tempo! É muito boa aluna e gosta de estudar. Mas a sua avó, o seu porto de abrigo, morre e uma torrente de acontecimentos chegam para desestabilizar os dias de Joana. 

"Espera aí. Que cara é essa? Sabes perfeitamente que tenho muito que fazer, Joana.  Por mim, claro que ia para casa mais cedo, filha. Tomara eu ter tempo para jantar com a família! Não acreditei, mas voltei a sorrir, porque nada tinha para dizer. E percebi que os sorrisos servem para uma data de coisas, como, por exemplo, para tapar buracos que aparecem quando o mar das palavras se transforma em deserto." Pág 34

"De qualquer forma, não me distraiu nada, simplesmente porque não sabe ter qualquer espécie  de conversa. Aprendeu a ler e a escrever, mas, como a maior parte das pessoas da minha familia, não aprendeu a falar." Pág 94

A toxicodependência, a depressão, os problemas da adolescência e sobretudo, a falta de comunicação entre gerações, a falta de tempo das famílias, espelhadas num livro que já possui uns bons anos. Foi publicado em 1994 e, infelizmente, continua actual. Recomendo muitíssimo para todas as idades.

Terminado em 31 de Outubro de 2023

Estrelas: 5*

Sinopse

Ao lermos a «A Lua de Joana», não podemos deixar de pensar na forma como, muitas vezes, relegamos para segundo plano aquilo que realmente é importante na vida. Este livro alerta-nos para a importância de estarmos atentos a nós e ao outro, e de sermos capazes de, em conjunto, percorrer um caminho que conduza a uma vida plena…

Foi já há quinze anos que «A Lua de Joana» foi publicada. Com mais de 360 000 exemplares vendidos nas suas inúmeras edições, com traduções em seis países, impôs-se como uma referência incontornável na literatura juvenil portuguesa e mundial.

Cris

quarta-feira, 22 de novembro de 2023

"A Livraria dos Gatos Pretos" de Piergiorgio Pulixi

Há livros que chamam a nossa atenção e que "precisam" de passar à frente dos outros. Este foi assim.

A capa apela à leitura, pelo título e pelas imagens também. A leitura devora a nossa atenção, começando logo por um assassinato macabro dada a metodologia utilizada pelo assassino na execução do crime. E no final do primeiro capítulo ficamos logo presos à trama. 

Depois, os ingredientes interessantes somam-se rapidamente. Um professor de matemática, deposto da sua profissão por agressão a um pai, cria uma livraria direcionada aos livros policiais e tenta sobreviver financeiramente. O seu carácter, meigo com os miúdos mas rezingão com os adultos, não ajuda a conquistar novos clientes. A livraria já teve melhores dias, muito pela ajuda de uma amiga idosa, que criou um grupo de leitura, mas que por motivos de saúde deixou de participar. No entanto, um pequeno grupo mantém-se e reune-se lá. E existem dois gatos pretos, a Miss Marple e o Poiroit, que são a cereja no cimo do bolo!

Final surpreendente, até à última palavra. Nada expectável! Personagens bem caracterizados, com as suas nuances positivas e negativas. 

Leitura rápida. Absorvente. Um assassino "diferente" e uns "investigadores" muito sui generis. Gostei muito! 

Terminado em 29 de Outubro de 2023

Estrelas: 5*

Sinopse

VENCEDOR DO PRÉMIO GIORGIO SCERBANENCO

Um thriller repleto de suspense e ironia que homenageia os grandes clássicos policiais.

Uma livraria peculiar.

Um livreiro com um passado como professor de matemática.

Uma investigação sobre um assassino implacável que se move nas sombras.

Um grupo de detetives amadores, leitores inveterados, cada um com a sua própria fraqueza.

Um reformado melancólico, um frade vivaço, uma octogenária obcecada com assassinos em série, uma jovem que se veste de preto e sonha matar alguém e um livreiro à beira da falência.

Confiaria nestes detetives para conduzir a investigação de um crime?

Cris

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

"A Malnascida" de Beatrice Salvioni

O começo de um livro pode prender ou afastar-nos da sua leitura. O início desta obra é super forte, agarra de imediato. Se quiserem mergulhar nesta leitura sem nada saberem só têm a ganhar mas, aconselho que não leiam a sinopse pois revela um acontecimento descrito logo nas primeiras páginas.

Estamos em Monza, Itália, em 1936. Francesca tem 13 anos e é educada de uma forma rígida, "com as maneiras e propósitos" de uma menina burguesa de então. No entanto, o seu olhar cai sobre outra miúda, apelidada de "Malnascida", de quem todos falam mal e atribuem poderes maléficos, que vê bastantes vezes na rua, junto ao rio Lambro, juntamente com dois rapazitos. A sua curiosidade vence e uma amizade nasce entre as duas. Amizade que tem de esconder a todo o custo, sobretudo da mãe, a quem aprende a mentir para poder sair de casa e ir ter com a amiga.

A autora poder-se-ia ficar pelos relatos das peripécias inocentes que estas amigas vivenciaram se a guerra não estivesse como pano de fundo deste romance numa Itália fascista de Mussolini. A guerra e as mortes, os que são chamados para lutar e os que ficam porque pertencem a famílias "de bem", as atitudes fanáticas que levam à cegueira completa e que descambam numa crueldade e violência sem fim, o luto, a miséria e famílias disfuncionais, e sobretudo a situação da mulher no período fascista, são temas abordados quando deambulamos pelas situações algo caricatas e complicadas em que duas amigas se metem.

Ouvi dizer que vai servir de argumento a filme ou série. Vou querer ver! 

Gostei muito da escrita da autora e recomendo.

Terminado em 7 de Novembro de 2023

Estrelas: 5*

Sinopse

Com ecos de autores como Natalia Ginzburg, Alberto Moravia ou Elena Ferrante, eis a estreia fulgurante de uma escritora cuja mestria literária se dedica, neste romance, à procura da origem do mal e dos obstáculos à liberdade individual.

PRÉMIO SCUOLA HOLDEN

Monza, Itália, 1936. Francesca, de 13 anos, está nas margens do rio Lambro, vergada sob o peso de um homem morto que tentou violá-la. Maddalena, amiga de Francesca, sai da água e ajuda-a a livrar-se do corpo: escondem-no no meio de arbustos. Este momento é um marco inolvidável na relação entre as duas raparigas, que começa um ano antes, quando Francesca se deixa fascinar por aquela a quem todos chamam «a Malnascida»: uma rebelde de origens humildes e com estranhos poderes. Contrariando a vontade da sua mãe, obcecada pelas convenções sociais burguesas, e ignorando os rumores que atribuem várias mortes à «Malnascida», Francesca junta-se ao seu bando de amigos «problemáticos», ávida por descobrir um modo de vida em absoluta liberdade. Entre as duas amigas, contudo, imiscui-se a guerra e o fascismo. Francesca e Maddalena terão de fazer uma difícil escolha: aliar-se contra a opressão social e a injustiça, ou deixar que o curso da História as separe para sempre. 

Cris

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

"Um Detalhe Menor" de Adania Shibli

Que livro impactante este! Lido, então, nesta época de guerra na Palestina, foi um murro no estômago! 

Basicamente são contadas duas histórias com um espaço temporal de 25 anos entre elas. A primeira, fala-nos de um crime ocorrido em Agosto de 1949 no deserto de Negueve, em Israel que vitimou uma adolescente - "um ano depois de Nakba, a catástrofe que expulsou mais de 700 mil palestinianos das suas terras, e que os israelitas celebram como a Guerra da Independência". 

Numa segunda parte, muitos anos mais tarde, uma jovem, habitante de Ramallah, Cisjordânia, lê uma notícia sobre esse crime, que teve lugar no mesmo dia do seu nascimento. Esse pequeno detalhe leva-a a tentar saber mais sobre ele e, pedindo um passe a uma colega, entra em Israel e tenta deslocar-se ao local onde tudo se passou. 

E depois há o fim! Abrupto, inacreditável e que nos faz refletir e "viver" um pouco do que se passa hoje em dia. Um final que fica connosco. Aconselho muitíssimo.

Terminado em 27 de Outubro de 2023

Estrelas: 6*

Sinopse

De uma escritora palestiniana um poderoso romance inquietante e sublime sobre a guerra, a violência, a memória e a injustiça. No verão de 1949 – um ano depois da Nakba, a catástrofe que expulsou mais de 700 mil palestinianos das suas terras, e que os israelitas celebram como a Guerra da Independência –,uma unidade de soldados israelitas, ataca um grupo de beduínos no deserto do Negueve, dizimando-o. Entre as vítimas encontra-se uma adolescente que sobrevive ao massacre. É capturada e violada, e depois assassinada e enterrada na areia. É a manhã de 13 de agosto de 1949.
Muitos anos mais tarde, quase na atualidade, uma jovem mulher em Ramallah descobre acidentalmente uma breve menção a esse crime brutal. Obcecada com o assunto, não só devido à natureza macabra do caso, mas também devido ao «detalhe menor» de ter acontecido precisamente vinte e cinco anos antes de ela nascer, irá embarcar numa viagem para tentar desvendar alguns - dos detalhes que envolvem o crime.
Adania Shibli sobrepõe magistralmente estas duas narrativas translúcidas para evocar um presente para sempre assombrado pelo passado. Com uma prosa inquietante e precisa, Um Detalhe Menor evoca a experiência palestiniana do apagamento, da expropriação e da vida sob a ocupação, ao mesmo tempo que revela a complexidade permanente de se juntar as peças de uma narrativa ocultada por fragmentos de linguagem.

Cris


quarta-feira, 15 de novembro de 2023

"Falar Pela Noite Dentro" de Claire Daverley

As cores coloridas da capa atrairam-me e pensei logo num romance leve, o que me apetecia na altura. Muitos são os temas abordados mas a forma como a autora os trata não tornou o livro nem denso nem pesado.

Acompanha um casal de namorados pela vida fora, desde os seus dezasseis anos, e acompanha também e sobretudo os seus desencontros. Com características de personalidades diferentes, Will e Rosie são atraídos um pelo outro de uma forma arrebatadora e, quiçá, permanente. 

Esta história fala-nos, pois, de amores e de desencontros, de decisões que tomamos na vida que nos levam aos mesmos, muitas vezes tomadas para não ferir opiniões alheias. Caminhos que se tomam e que nos afastam das pessoas que nos podem fazer felizes ou infelizes. Como na vida.

A acompanhar este tema central, outros surgem, também eles nada leves: a perda de alguém e o luto que a acompanha, a depressão, o cancro, o suicídio e questões de género. A autora aborda todos estes assuntos de uma forma crua mas pouco aprofundada. Tampouco o poderia fazer dado a quantidade de páginas que não o torna num "tijolo"!

Todos os personagens possuem várias camadas, que vamos descobrindo no decorrer da leitura e que fazem o leitor refletir em muitos dos aspectos falados.

Porém, considero este Falar Pela Noite Dentro um livro prazeroso de se ler, nada pesado. A previsibilidade dele dá-nos segurança para avançar, sem medos de sermos surpreendidos no final, o que pode agradar a uns leitores e não a outros, ou, como foi o caso, lido no momento certo, este livro devora-se!

Terminado em 22 de Outubro de 2023

Estrelas: 4*

Sinopse

A história de amor do ano. Por vezes, as conversas mais importantes da nossa vida só terminam de manhã… O que fazer quando a única pessoa que devíamos esquecer é aquela que não conseguimos largar? Esta é uma história de amor belíssima e convincente entre duas personagens inesquecíveis, que nos vão deixar acordados pela noite dentro… Quando Will e Rosie se cruzam no final da adolescência, reconhecem-se imediatamente como almas gémeas. Rosie é muito focada e tem o futuro cheio de planos, uma rapariga perfeita aos olhos de todos, apesar da mãe controladora. Já Will tem o seu quê de rebelde e preocupa a sua avó, mas não deixa de mostrar uma maturidade muito própria. Apesar de todas as suas diferenças, um e outro são dois opostos que se atraem irresistivelmente. Apaixonam-se por entre olhares cúmplices, longas caminhadas até casa e telefonemas intensos no coração da noite, até ao momento em que uma tragédia que marcará as suas vidas para sempre apaga a possibilidade de ficarem juntos. Mas não consegue apagar a química inegável ou quebrar o sentimento de amor verdadeiro que os une, e Will e Rosie, incapazes de esquecer a história do que podia ter sido, continuam, com o passar dos anos e a partir das vidas que escolheram para si próprios, unidos como que por um fio invisível e infinito. William e Rosie. Rosie e William. Por mais que o tempo passe, esta é uma paixão impossível de conter. Às vezes estamos no sítio certo à hora errada. Esta é uma história sobre os caminhos imperfeitos e complicados pelos quais o amor nos conduz. Uma história de segundas oportunidades, e outras perdidas, das palavras que dizemos e das que ficam por dizer, da vida que se mete no caminho e talvez, quem sabe, da hipótese de corrigir o amor. Aquele amor, o único, que nos faz sempre voltar.  

Cris

segunda-feira, 6 de novembro de 2023

"Três" de Valérie Perrin

Sabia que, ao ler este livro, o iria comparar com o primeiro desta autora. O "Breve Vida das Flores" apanhou-se de surpresa. Gostei muito da história, da escrita e da caracterização muito humana das personagens. Tal comparação não é justa porque os livros são diferentes mas é natural que um leitor a faça e eu fi-la…

Gostei também desta leitura porque a história flui muito bem e os três personagens principais possuem mistérios e dilemas que vão surpreendendo o leitor ao logo das páginas, não havendo espaços mortos na trama. Os temas: amizade e traição, amor e ódio, luto e culpa, julgamentos e relações familiares complicadas são constantes e não nos deixam ter sossego! ;)

Creio que o facto do meu kobo ter começado a dar problemas fez com que eu demorasse mais a ler e, literalmente, a virar as páginas!!! Estive quase para desistir e pedir emprestado o livro. Tirando esse aparte achei que a escrita é muito sólida, tal como o anterior, e apelativa. A trama é contada com analepses e prolepses mas não fazem com que o leitor se perca. Muito pelo contrário, fica-se mais preso aos acontecimentos.

Se tiverem que escolher uma obra, leiam "A Breve Vida das Flores". De seguida, este.

Terminado em 18 de outubro de 2023

Estrelas: 5*

Sinopse

O regresso da autora de um dos romances mais lidos em Portugal.
Uma história em que a adolescência, a passagem para a vida adulta e as dores de crescimento nos mostram de que matéria é feito um dos mais profundos sentimentos da vida: a amizade.
Adrien, Étienne e Nina têm dez anos quando se conhecem na escola, em 1986. Rapidamente, tornam-se muito próximos, criam um laço fortíssimo e fazem um pacto: vão partir, juntos, para Paris e jamais se separarão.

Muitos anos mais tarde, em 2017, é encontrado um carro no fundo de um lago, no lugar onde os três amigos cresceram. Virginie, uma jornalista com um passado nebuloso, faz a cobertura do caso. Pouco a pouco, ela vai descobrindo o que aproximou aqueles três amigos. Que pessoas são, hoje, Adrien, Étienne e Nina? Qual é a relação entre este estranho acontecimento e a história de amizade que une os três?

Valérie Perrin regressa com um romance tocante em que, uma vez mais, consegue não só imprimir beleza às pequenas coisas da vida, mas revelá-la perante os nossos olhos. É um mergulho nas águas tumultuosas - e tantas vezes turvas - da adolescência e, sobretudo, no tempo que passa e nos separa das pessoas que fomos então.

Cris

 
    

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

“O Terceiro País” de Karina Sainz Borgo

Antes de mais quero alertar-vos para a necessidade (vossa, não minha!) de lerem o primeiro livro desta autora, "Cai a Noite em Caracas", porque é deveras fabuloso e repleto daquela “droga boa” que nos impele a ler sem nunca querer poisar o livro! Eu gostei mesmo muito. Podem ler a minha opinião aqui.

Este é também muito forte, pelo tema tratado, mas o anterior ficou-me no coração pela surpresa inesperada que foi lê-lo.  Este "O Terceiro País" tem como pano de fundo um problema que afeta cada vez mais o mundo em que vivemos, as migrações. Angústias Romero, junto com o seu marido e seus filhos gémeos prematuros, recém nascidos, procura fugir do seu país. O local nunca nos é referido, e esse foi um ponto de que senti falta porque gosto de localizar geograficamente os acontecimentos reais ou ficcionados. Mas se pensarmos bem, não é necessário, pois não? Porque esta história pode decorrer em tanto lado!

Os pequeninos gémeos não resistem à viagem e Angústias procura um sítio seguro, preferencialmente calmo, para os enterrar. Por isso leva-os consigo numa pequena caixa. O ambiente descrito é de guerra, fome e devastação. A escrita de Karina é crua, certeira e dura. Na sua viagem encontra Visitación Salazar, responsável por um cemitério ilegal que as autoridades pretendem destruir. Uma amizade estranha nasce entre estas duas mulheres. Ambas estão sozinhas e juntam forças para combater a corrupção, embora não possuam meios para tal.

Gostava de poder afirmar que este livro é uma distopia. Um mundo inventado. Mas os pormenores relatados fazem-nos acreditar e visualizar toda a violência descrita nesse mundo cruel sem compaixão onde conseguimos, por comparação com os relatos que assistimos hoje em dia, imaginar bem o horror por que passam os migrantes. Que faríamos em situações limite para sobreviver?
 

No entanto, aqui e ali, um toque de esperança.

Capa lindíssima. Recomendo.


Terminado em 30 de Setembro de 2023

Estrelas: 5*

Sinopse

Angustias Romero e o marido fogem da peste, a caminho das montanhas e da ansiada segurança no país vizinho; levam, atados às costas, os dois filhos ainda bebés. À sua volta, apenas miséria, calor e poeira. Os gémeos não sobrevivem à viagem, e Angustias é abandonada pelo marido. Na fronteira, Angustias chega ao Terceiro País, um cemitério ilegal vigiado pela mítica Visitación Salazar. Contra a oposição dos barões da droga e da violência, a coveira garante aos sem-terra um último local de descanso.

É aqui que Angustias encontra finalmente lugar para os filhos. Determinada a ficar sempre perto deles, junta-se a Visitación na sua luta, num lugar onde a lei é ditada por quem empunha as armas, e o tempo é marcado pelas festas e os misteriosos brinquedos que alguém deixa na campa das duas crianças. O perigo e a violência ameaçam implodir a qualquer momento, esbatendo os limites entre a vida e a morte.

N’O terceiro país, história poderosa de fuga e esperança, Karina Sainz Borgo mistura com mestria o mistério e a realidade, a tragédia clássica e a narrativa contemporânea, confirmando a sua pertença à vibrante nova geração literária latino-americana.

Cris