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domingo, 14 de julho de 2024

"Cada Letra, Uma História" de Pedro Fernandes e Ilustração de Romont Willy


Uma história para cada letra! São histórias pequeninas de, em média, duas páginas. Divertidas algumas, outras apontam alguns medos e outras sensações que os protagonistas sentem e como lidam com elas.
Para cada título um nome próprio começado por uma letra segundo a ordem do abecedário e outro também da mesma letra, normalmente um animal ou um objecto, por exemplo: " O Igor e a iguana".
Com ilustrações alegres e coloridas que dão sentido às histórias, faz todo o sentido ler ou contar uma por dia, ou melhor, uma por noite, ao deitar.
E o melhor? Os pequenitos podem ouvir, enquanto acompanham a leitura, todas as histórias através de um sistema de acesso via QR code.
Aprendendizagem e diversão juntas num livro que aconselho para os pequeninos!




Cris

quarta-feira, 10 de julho de 2024

Resultado do Passatempo "Toca a comentar!" - Mês de Junho

Anunciamos o vencedor deste passatempo referente ao mês de Junho.

Este é o link para o post onde se encontra anunciado o passatempo.

Assim, através do Random.Org, de todos os comentários efectuados nesse mês, foi seleccionada uma vencedora! Foi ela:

Isabel 

Parabéns! Terás que comentar este post e enviar um email para otempoentreosmeuslivros@gmail.com até ao próximo dia 22, com os teus dados e escolher um de entre estes dois livros:

Cris

quarta-feira, 3 de julho de 2024

"Cadente" de Mário Rufino

Primeiro romance deste autor. Conta-nos a relação entre uma avó e um neto. A avó, cujo neto criou e muitas "noites" perdeu à sua conta pelas preocupações que lhe foi dando ao logo do seu crescimento, vai perdendo faculdades, a sua memória, sem que o seu neto, já homem feito, se aperceba quanto.

Que maravilha de escrita tão cuidada, tão profunda na sua abordagem aos sentimentos da avó e neto ! Fiquei encantada com a sensibilidade com que este tema foi abordado, O neto que não se apercebe do declínio da avó e que depois não o quer ver, e a avó que vai sentido medo, dor e aflição por estar a perder as suas capacidades. É impossível ficar indiferente à escrita apurada, ao amor que se sente nas palavras escritas, que se adivinham próximas do coração do autor e que chega directamente ao nosso, como leitores. Adorei, na verdade. É livro que quero reler.

Um livro que recomendo muitíssimo!

"As pastas, as pastas. Um simulacro de controlo, mas nada controlamos. Por mais que obedeçamos às leis, estamos a um passo de sermos acusados pelo infortúnio. Perder o emprego seria mais um e estava perto disso. Teria de voltar à casa de partida e assumir o papel contrário, o papel de cuidador de uma criança riscada pelas rugas. O papel que não queria assumir." pág. 124

"Foste abençoada por teres sido burlada. Deus abriu as portas do teu cérebro e a corrente de ar levou tudo ou quase tudo. Mas olho para ti e sei que pouco ou nada existo. Vejo-te mas não te tenho. Partiste e o corpo não sabe." pág 162

"Entreguei-a ao portão e deixei-a com ansiedade de primeiro dia de creche. Agarrou-se aflita à minha mão, como em todas as outras primeiras vezes. -Fiz asneira? Vens-me buscar? Não tinha feito nada, o corpo é que a traía e a esquecia. Deixei-a e ela foi de mão dada com a auxiliar. Ela ia e sentava-se junto a outras crianças velhas, entalava as mãos entre as pernas trementes. Agarrava o choro por uma ponta, a vergonha puxava as lágrimas para dentro e ela afogava-se em temor de ficar sozinha, de padecer de um castigo sem culpa." pág. 194

Terminado em 25 de Junho de 2024

Estrelas: 6*

Sinopse

A avó é forçada a cuidar do neto, quase adolescente, quando a mãe lho entrega. Depois de ter sofrido durante a revolução (por estar «no lado errado da história»), de perder tudo e de regressar à vida, tem de cuidar de um neto que mal conhece. Quando ele entra na adolescência e na droga, ela procura um emprego duro para conseguir pagar as contas. Até que a doença muda tudo – é lenta, mas imparável. Ela precisa de cada vez mais cuidados; ele quer começar uma vida nova, mas vai percebendo que morre um pouco de cada vez que a avó se esquece das suas histórias e do seu nome. Para se resgatar, tem de lidar com o passado e com a sua própria culpa. Mais do que isso: tem de aprender a olhar para ela, ouvi-la e guardar as memórias para a salvar do esquecimento.  

Cris

 

segunda-feira, 1 de julho de 2024

"Coração-Castelo" de Raquel Ochoa

Este livro, romance finalista do Prémio Leya, foi um chamamento para os meus olhos. A sinopse agradou-me por se tratar de um assunto para mim desconhecido. No séc. XVII, por volta de 1637, cerca de 35 000 camponeses japoneses refugiaram-se no castelo de Hara, fugidos que estavam dos tributos excessivos que não lhes deixavam, sequer, víveres para sobreviverem e também fugidos da proibição de professarem o cristianismo (kirishitans). Resistiram ao longo de vários meses e foram comandados por um jovem de 16 anos a quem atribuíam poderes especiais, "milagres", e era conhecido pelo "mensageiro do céu". Esta tentativa de resistência e revolta da população ficou conhecida pela Rebelião de Shimabara. O xogunato de Tokugawa enviou uma força de mais de 125 000 tropas para combater os revoltosos e após um cerco prolongado, obtiveram a vitória, exterminando os sobreviventes. A política de perseguição formal aos cristãos continuou até à década de 1850. (Informações retiradas da Wikipédia).

Finda esta explicação histórica, que adorei conhecer ao longo destas páginas, vamos ao romance e à escrita de Raquel Ochoa. Podia ser uma "seca" contar tudo isto? Podia, mas não foi. Ao introduzir a história de uma mãe e do seu filho - Jana e Tago - que se juntaram à multidão que caminhava em direcção a Hara, uma pitada de romance e mistério foi colocada acertadamente na trama o que levou a fixar a minha atenção e a ler com muito gosto esta obra. 

Haru, um ex-samurai; Clarimundo, um missionário português; a irmã e o pai de Haru, invisual de muita idade, apimentam e completam esta trama. Segredos antigos, um fim que todos temem e que o leitor suspeita, fazem querer ler mais depressa. Mas há sempre surpresas na ficção e Jana é uma mulher lutadora, que sabe manejar armas e faz de tudo para salvar o seu filho. Que fim a aguarda?

Escrita cuidada mas simples (algumas palavras preferiria que tivessem notas de rodapé em vez de um glossário no final) que me conquistou. No meu coração permanece sempre a lembrança do primeiro livro que li desta autora em Setembro de 2010, A Casa-Comboio. Posteriormente li Mar Humano e O Vento dos Outros.

Recomendo muito se for uma temática que vos interesse, esta de um país culturalmente muito diferente do nosso.

"- Toda a vida sempre pensei que a fé é o maior dom - dizia-lhe a avó, preparando-a para o desconhecido, suspeitando não ser compreendida pela neta. -E não precisas de pôr esse ar sério, a fé ajuda-nos a imaginar o futuro.

- Que interessa o futuro? O futuro vai ser igual ao presente, que já é igual ao passado.

- O futuro é sempre melhor porque nele colocamos a esperança." (pág. 113)

Terminado em 21 de Junho de 2024

Estrelas: 5*

Sinopse

Japão, 1637.

Com a proibição de professar o cristianismo e a imposição de avultados tributos à população, cerca de 35 000 camponeses liderados por um general-menino com reputação de fazer milagres invadiram várias fortalezas governamentais e acabaram por se refugiar na ruína do castelo de Hara.

Reconstroem-no em conjunto para resistir, ao longo de vários meses, à resposta do xogum – um cerco implacável levado a cabo pelas suas tropas.

Entre os que lutam contra a tirania, encontram-se Jana e o seu filho pequeno, bem como o ronin Haru – samurai renegado e agora ao serviço do seu povo.

Apesar do ódio mútuo inicialmente sentido, Haru não consegue ficar indiferente a essa mulher que carrega um mistério e sabe pegar em armas, nem ao ciúme provocado pela relação dela com o missionário Clarimundo, um dos poucos portugueses que ainda não deixaram o Japão.

Mas são forçados a lutar em conjunto e, no caos que só a guerra poderia causar, os sentimentos entre estas três personagens vão exacerbar-se.

Tal como no final do cerco, não existirá redenção, só a grande busca da liberdade.

E a certeza de que há vida enquanto houver amor.

Este é um extraordinário romance sobre um episódio real, que foi finalista do Prémio LeYa em 2023.

Cris

quinta-feira, 27 de junho de 2024

“Um Brinde à Morte” de Agatha Christie

Mais uma vez a tia Agatha baralhou bem as cartas e ganhou o jogo, ou seja, não descobri quem era o assassino. Que é necessário dizer mais?

Com uma apresentação das personagens onde ficam bem realçados os motivos pelos quais os suspeitos tinham motivos para matar a bela e tola Rosemary, o leitor (aka eu) inventa razões e descortina um suposto assassino. A bem dizer escolhi aquele que era o mais improvável supondo que a dama do crime também o escolheria a ele… Estava errada!

Mas, no grupo de leitura conjunta onde lemos Agatha Christie, há sempre alguém que chega lá muito próximo, explicando até como o assassino teria agido para praticar o acto. Que amigas com mentes criminosas eu tenho!

Leitura que se faz rápida e compulsivamente. Um descanso (mórbido?) para leituras mais pesadas que normalmente escolho.

Terminado 10 de Junho de 2024

Estrelas: 5*

Sinopse

Seis pessoas sentam-se numa mesa posta para sete no restaurante Luxembourg. Em frente ao lugar vazio está um ramo de rosmaninho, em homenagem a Rosemary Barton, que morreu nessa mesma mesa há exactamente um ano atrás. Um sentimento estranho paira no ar, tendo em conta que ninguém esquecerá tão cedo aquela noite e a agonia de que foram testemunhas: o belo rosto de Rosemary contorcido em espasmos, irreconhecível.
Mas Rosemary era uma mulher impossível de esquecer. Ela tinha a capacidade de despertar fortes paixões entre as pessoas que conhecia. Paixões essas que poderão ter ditado a sua morte…

Um brinde à morte (Sparkling Cyanide) foi originalmente publicado no Reino Unido em 1945, ano em que apareceria também nos Estados Unidos, sob o título Remembered Death. Foi adaptado à televisão em 1983 e 2003.

Cris

 


quarta-feira, 26 de junho de 2024

"A Carteira" de Francesca Giannone

Às vezes um livro atrai-me pela capa e título, depois, quando assim é, leio a sinopse. Foi o caso deste. E que surpresa agradável foi...

Não posso deixar de começar pelo facto de ter achado o final espectacular. Tudo remetia para um "e foram felizes para sempre" mas a forma como a autora soube contornar isso foi de mestre. Se calhar, e porque o livro é baseado na história de vida da sua bisavó, os factos de que ela tinha conhecimento remeteriam para esse fim. Se assim foi, mais uma vez, a vida a superar a ficção!

Viajamos no tempo para 1934, para uma pequena aldeia em Itália, pouco aberta a novidades e a pessoas audazes. Anna, acabou de chegar junto com seu marido que ali nasceu. Estranha alguns hábitos, sobretudo religiosos, que não adopta como seus, mas estranha sobretudo a sua dependência financeira face ao marido, facto a que não estava habituada. Pretende continuar a dar aulas mas as vagas são inexistentes. Até que surge um lugar de carteira, profissão até então preenchida por homens...

Com um personagem marcante e em torno do qual roda toda a acção a que a autora soube dar vida, este livro prende desde o início. O forte carácter de Anna, que vai sendo caracterizado com o decorrer da leitura, faz com que o leitor antecipe problemas. Mas a trama, urdida com mestria, vai sempre à nossa frente e pouco acertamos nas previsões. Anna é uma mulher muito à frente do seu tempo e faz frente às convenções rígidas que governam os habitantes. Luta por aquilo em que acredita e isso deixa marca nas pessoas em seu redor.  

Acompanhamos Anna até ao fim dos seus dias e as surpresas constantes, a intensidade da narrativa, os acontecimentos a nível mundial que interferem na sua vida, marcam este romance pela positiva. Gostei muito e recomendo. Leitura que se faz rápida e com muito gosto. A História foi feita de mulheres assim, muitas delas perfeitas desconhecidas. É realmente pena e conhecê-las, mesmo que seja através da ficção, é muito bom. 

Terminado em 2 de Junho de 2024

Estrelas: 6*

Sinopse

Apaixonante, esta é a grande história de uma mulher à frente do seu tempo.

Em 1934, a uma pequena aldeia italiana, chega um casal: Carlo, que é do Sul, e está feliz por regressar; Anna, a sua mulher, de uma beleza helénica, parece triste e preocupada.

Como será a sua vida naquela terra desconhecida? Apaixonada pelo marido e desejada pelo cunhado - a quem nunca cederá -, Anna é uma figura completamente diferente de todos: não vai à igreja, é dona do seu nariz, diz o que pensa e nunca se irá vergar às leis e costumes que oprimem as mulheres.

E, para espanto de todos, em 1935, decide concorrer ao lugar de carteiro e torna-se a primeira mulher a distribuir correspondência.

Na verdade, será muito mais do que isso.

Ao longo das duas décadas seguintes, sem querer, mas sobretudo sem que os habitantes o queiram, Anna será a pessoa que mudará aquela aldeia.

A pé, e depois de bicicleta, ela é a carteira, aquela que escuta todos, que leva cartas dos soldados da Segunda Guerra, postais de quem partiu para longe, confidências de amantes secretos.

Anna é o fio invisível que liga centenas de vidas e as vai mudar para sempre.

Retrato familiar e de época, este romance é, sobretudo, a história de uma mulher extraordinária e a prova de como uma só pessoa, cheia de alma e coração, pode fazer a diferença nas alegrias e tristezas de tanta, tanta gente.

«Quando encontrei um cartão de visita com cem anos, numa gaveta, li: Anna Allavena. Carteira.

Segui o rasto daquele nome e descobri uma mulher incrível: a minha bisavó.

Nasceu assim este romance.» Francesca Giannone 

Cris

 

terça-feira, 25 de junho de 2024

"Um Dedo Borrado de Tinta" de Catarina Gomes

Título brilhante para um tema escrito com o mesmo brilhantismo porque abordado com muita sensibilidade. Catarina Gomes é assim que escreve. Leiam, se não o fizeram já "Coisas de Loucos" (opinião aqui) porque se reconhece no tratamento do tema aí tratado, o mesmo cuidado com o intuito de não ferir susceptibilidades. 

Nesta obra, e porque se trata de entrevistas a pessoas de muita idade e com um caminho de vida duro a quem o não saber ler impactou sobremaneira, o cuidado e o respeito mostrava-se necessário. 

Gosto particularmente quando a autora se coloca na narrativa, explicando as dificuldades sentidas na abordadem ao fazer as entrevistas sem, mesmo assim, se colocar num lugar de destaque. A personalidade e a vontade dos entrevistados são respeitados e a informação brota porque se sentem bem.

Um périplo por tempos em que não saber ler era uma coisa aceitável à qual nem todos tinham acesso. Gostei muitíssimo e recomendo!

"Não saber ler é a vida não ser só nossa, guardada em nós, não a darmos a conhecer se não tivermos vontade. Não conseguir ler é ter de partilhar, mesmo que não se queira. Resta à pessoa, ao menos, escolher quem nos lê a vida." pag 82 - referência feita aos leitores amáveis que lêem cartas/documentos a todos os que não sabem ler. 

Terminado em 26 de Maio de 2024

Estrelas: 6*

Sinopse

Casteleiro, no distrito da Guarda, é uma das freguesias nacionais com maior taxa de analfabetismo. Este livro retrata a vida e o quotidiano de habitantes desta aldeia que não tiveram oportunidade de aprender a ler e a escrever. É o caso de Horácio: sabe como se chama cada uma das letras do alfabeto, até é capaz de as escrever uma a uma, mas, na sua cabeça, elas estão como que desligadas; quando recebe uma carta tem de «ir à Beatriz», funcionária do posto dos correios e juntadora de letras. Na sua ronda, o carteiro Rui nunca se pode esquecer da almofada de tinta, para os que só conseguem «assinar» com o indicador direito. Em Portugal, onde, em 2021, persistiam 3,1% de analfabetos, estas histórias são quase arqueologia social, testemunhos de um mundo prestes a desaparecer. 

Cris

segunda-feira, 24 de junho de 2024

"Filhos da Fábula" de Fernando Aramburu

Fernando Aramburu conquistou-me com o seu romance, "Pátria". Com as suas (tantas!) páginas fiquei um pouco mais conhecedora do quanto sofreram as famílias no País Basco, muitas vezes amigas que a guerra cível fez rivais, inimigas. Uma história que nos conta as feridas pelas quais duas famílias passaram. Impossível esquecer, necessário perdoar. Tão bom!

Confesso que não li ainda "O Regresso dos Andorinhões", sobretudo pelo tijolo que é e pela dificuldade de o transportar no dia a dia. Sei que a temática é diferente do "Pátria" mas o interesse está lá e, espero que chegue a sua vez!

Este "Filhos da Fábula", sendo de Aramburu e possuindo menos de 300 páginas, suscitou o meu interesse imediato. O tom da escrita é completamente diferente mas como pano de fundo encontra-se, à semelhança do "Pátria", o conflito basco. Asier e Joseba são dois jovens que em 2011 partem para o sul de França com o intuito de se juntarem à ETA. Não fosse a sua situação - e atitudes - desesperadamente ridículas, dado julgarem-se prestes a serem heróis, poderia ter dado algumas gargalhadas. Este tom na escrita não é o meu preferido mas reconheço em Aramburu uma mestria ímpar. E porquê?  Porque independentemente de não apreciar este tom jocoso na narrativa, o autor conseguiu conquistar-me com esta trama logo de início.

Asier e Joseba, Sancho e Pança. Foi de quem logo me lembrei. Dois personagens bastante patéticos na sua forma de encarar os acontecimentos, nomeadamente a extinção da ETA, porque lutam contra moinhos inventados. A sua perseverança fá-los caminhar para situações que se não fossem trágicas, seriam cómicas. A reflectir.

Leiam!

Terminado em 19 de Maio de 2024

Estrelas: 4*

Sinopse

O novo romance do autor de Pátria sobre gentes bascas: uma obra irónica, demolidora, divertidíssima. Dois jovens empolgados, Asier e Joseba, partem em 2011 para o Sul de França com a intenção de se converterem em militantes da ETA. Esperam instruções numa quinta com um aviário, acolhidos por um casal francês com quem pouco se entendem. É lá que ficam a saber que o grupo anunciou o fim da atividade armada. Abandonados à sua sorte, sem dinheiro, sem experiência nem armas, decidem continuar a luta por sua conta, fundando uma organização própria, na qual um assumirá o papel de chefe e disciplinado ideólogo, e o outro o de subalterno mais descontraído. O contraste entre o ensejo de feitos heroicos e as peripécias mais ridículas, sob uma chuva persistente, vai conduzindo a história para uma espécie de drama cómico. Até que conhecem uma jovem que lhes propõe um plano. Depois do sucesso de Pátria, este novo romance de Fernando Aramburu arrasta-nos, de uma forma muito ágil e surpreendente, para uma aventura inesperada com um desenlace magistral. Contado com um humor permanente, cáustico e veloz, e escrito com frases cuja brevidade são um autêntico virtuosismo, Filhos da Fábula é mais uma prova de que Fernando Aramburu pertence à estirpe dos grandes escritores, aqueles que nos contam histórias como mais ninguém é capaz de o fazer. 

Cris

sexta-feira, 21 de junho de 2024

"Nas Suas Mãos - A Incrível Vida de Suzanne Nöel" (GN) de Leïla Slimani e Clément Oubrerie

Saber que existia esta Graphic Novel escrita pela Leïla Slimani e traduzida pela Tânia Ganho fê-la entrar directamente para o topo da minha whishlist. Confesso que desconhecia quem era Suzanne Nöel e esta biografia pareceu-me muito bem conseguida e completa. Que vida fascinante a dela!Uma mulher muito à frente do seu tempo. 

Cirurgiã plástica numa altura em que a profissão era maioritariamente exercida por homens, feminista e uma lutadora pelos seus direitos, como mulher livre, e pelos direitos das mulheres, a quem reconhecia todo o direito a fazer uma operação estética para se sentirem melhor consigo próprias. Suzanne desde cedo mostrou que queria ir o mais longe possível na luta pela emancipação da mulher. Lutou contra preconceitos e pelo direito ao voto. Foi pioneira na cirurgia estética e reconstrutiva sendo que no início do séc XX é uma especialidade considerada perigosa e desnecessária.

Foi uma boa surpresa conhecer a vida desta médica.

As ilustrações bonitas mas são maioritariamente em tom escuro, carregadas mais ainda quando a palavra escrita sugeria uma situação mais pesada.

Recomendo. Para um dia reler! 

Terminado em 18 de Maio de 2024

Estrelas: 5*

Sinopse

Feminista convicta, Suzanne Nöel foi uma brilhante estudante de Medicina e uma pioneira da cirugia estética e reconstrutiva, especialidade considerada perigosa e desneccesária pela comunidade médica do início do século XX.

Tendo-se apercebido de que a cirugia plástica poderia constituir um instrumento valioso e útil para a emancipação da mulher, Suzanne Noël decídiu dar um contributo essencial nesse campo incipiente.

Através da cirurgia, conseguiu corregir sinais de envelhecimento e de doençã, mas também os resultantes de condições de vida difíceis e precárias.

Durante a Primeira Guerra Mundial, desenvolveu igualmente técnicas cirúrgicas revolucionárias em veteranos de guerra desfigurados, devolvendo-lhes a dignidade.

Suzanne Noël não só enfrentou os preconceitos do seu tempo como lutou incessantemente pelo direito de voto das mulheres, pela sua independência e pelo reconhecimento do seu trabalho como cirugiã plástica, tornando-se uma celebridade no seu país e no mundo inteiro.

Cris

 

 


quinta-feira, 20 de junho de 2024

"A Filha Única" de Guadalupe Nettel

Creio ja ter referido que fui à apresentação deste livro que contava com a presença da autora. Para ir munida de bagagem li o seu livro "O Corpo Em Que Nasci" (opinião aqui) e, claro, "A Filha Única". Gostei muito de a ouvir falar, de como surgiu o tema desta história, de como ela a interpretou. Gostei sobretudo da forma interventiva como vê o mundo e de a ouvir falar do processo de escrita.

Esta obra é baseada na história de uma amiga e a intenção primeira da autora foi contar momentos significativos passados na sua vida. As questões que se lhe colocaram e que são aquelas que se nos colocam a nós leitores, estão ligadas com a maternidade, o luto e a violência doméstica.

O que é ser "boa mãe", que papel a sociedade impõe às mulheres e que carga possui, que formas de ser mãe existem... são questões que se colocam ao lermos estas páginas. 

É, também, um livro sobre a esperança. Gostei muito.

"Existe uma palavra para designar aquele que perde o seu conjuge, e outra para os filhos que ficam sem pais. No entanto, não existe nenhuma palavra para os pais que perdem os seus filhos. (...) É algo tão temido, tão inaceitável, que decidimos não o nomear." Pag 68

Terminado em 15 de Maio de 2024

Estrelas: 6*

Sinopse

Multipremiada, Guadaluppe Nettel é um nome a fixar na nova geração de escritores latino-americanos. Pouco depois de atingir os oito meses de gravidez, anunciam a Alina que a sua filha não irá sobreviver ao parto. Ela e o companheiro embarcam então num processo doloroso, e ao mesmo tempo surpreendente, de aceitação e luto. Esse último mês de gestação transforma-se para eles numa estranha oportunidade de conhecer aquela filha a quem tanto lhes custa renunciar. Laura, a grande amiga de Alina, fala-nos do conflito deste casal enquanto reflete sobre o amor e a sua lógica por vezes incompreensível, mas também sobre as estratégias que os seres humanos inventam para superar a frustração. Simultaneamente, Laura vai-nos contando a história da sua vizinha Doris, mãe solteira de um menino encantador com problemas de comportamento. Escrito com uma simplicidade apenas aparente, A Filha Única é um romance profundo e cheio de sabedoria que nos fala de maternidade, da sua negação ou aceitação, das dúvidas, incertezas e até dos sentimentos de culpa que a rodeiam, das alegrias e angústias que a acompanham. É também um romance sobre três mulheres – Laura, Alina, Doris – e os laços – de amizade e amor – que estabelecem entre elas. 

Cris

quarta-feira, 19 de junho de 2024

"Comer Beber" de Filipe Melo e Juan Cavia (GN)

O "casamento" deste autor com este ilustrador não poderia dar "filhos" mais bonitos! Que venham muitos mais porque eu cá estou para os apreciar!

Então, duas histórias diferentes fazem parte desta Graphic Novel e o título está directamente relacionado com elas e só ele as une. Nada mais possuem em comum. Mas mais uma vez, uma simbiose perfeita entre a palavra e a ilustração.

A primeira foi criada em torno de uma história verídica, baseada na vida de Franz e Frieda Majowski, donos de um restaurante que se vê inundado de nazis após a ocupação da Polónia pela Alemanha. É uma história de resiliência humana onde uma garrafa de champanhe tem um papel principal! ;) 

A segunda, é a história de um filho, de uma mãe e de uma tarte de maçã. Amor e dor muito forte e muito cru. Aproveitem e vejam a curta metragem inspirada nesta história. É tão maravilhosa! Se quiserem experimentem fazer a Tarde de Maçã. A receita vem no final do livro.

Uma GN para se apreciar! Recomendo!

Terminado em 11 de Maio de 2024

Estrelas: 5*

Sinopse

"Durante a Segunda Guerra Mundial, o polaco Franz Majowski esconde uma garrafa de champanhe no cofre do seu popular restaurante em Berlim.

Quatro décadas mais tarde, uma célebre tarte de maçã é o motor da viagem de um homem pelo interior da América.

Paladar e memória cruzam-se nestas duas histórias de magnífica simplicidade, uma delas real e a outra imaginada, em que a comida e a bebida são pretexto de reflexão sobre algo maior.

Comer / Beber é o quarto livro dos multipremiados criadores de Os Vampiros e Balada para Sophie." 

Cris

 

terça-feira, 18 de junho de 2024

"O Corpo Em Que Nasci" de Guadalupe Nettel

Sabendo que a autora mexicana vinha a Lisboa apresentar o seu último livro editado cá, "A Filha Única", apressei-me a tentar encontrar este livro anteriormente editado em Portugal e que me passou completamente despercebido. 

É um relato muito intimista do que foi a sua infância e juventude na cidade do México, marcada por um defeito de nascença num olho. Auto-ficção, muito provavelmente mas baseada em muitos acontecimentos que a marcaram. Não só essa marca física, que a limitava muito, mas também toda a educação dos anos 70 e ideologia da época: o casamento aberto dos seus pais, as comunas hippies e toda a liberdade sexual em oposição à educação fechada da sua avó.

A narradora, num divã de uma psicóloga, relembra a sua vida, questionando-se. Aceitando-se, por fim, tal como era.

"Por fim, depois de um grande périplo, decidi-me a habitar o corpo em que tinha nascido, com todas as suas particularidades. Ao fim de contas, era o único que me pertencia e me vinculava de forma tangível com o mundo, ao mesmo tempo que me permitia distinguir-me dele." (pág. 159)

Este livro lê-se muito rapidamente porque a escrita é muito atraente, convidativa e os episódios são narrados com muito humor. 

Terminado em 11 de Maio de 2024

Estrelas: 5*

Sinopse

Inspirado na infância da autora, O Corpo em que Nasci é a história de uma menina com um defeito de nascença num olho. A sua vida, durante os anos setenta, é influenciada pela sua escassa visão, mas também pela ideologia dominante nessa época: o casamento aberto dos seus pais, a escola activa, as comunas hippies e a liberdade sexual. As diferenças físicas e psicológicas que a distinguem levam a protagonista a identificar-se com os seres que vivem à margem das modas e das convenções sociais.
Escrito como um solilóquio no divã de uma psicanalista, a narradora faz-nos participar das suas recordações mais íntimas e das interpretações que faz da sua própria vida. Trata-se de uma história cheia de sentido de humor, mas também de realismo, na qual o mundo infantil se mostra muito mais ominoso do que à primeira vista parece.
Um romance de iniciação à vida e à literatura, um bildungsroman entre a América e a Europa, nas suas facetas menos óbvias. O exílio sul-americano, a migração do Magrebe, as prisões da cidade do México constituem parte do contexto deste comovedor romance que percorre o caminho de volta à dignidade e à aceitação de si mesmo.

Cris

segunda-feira, 17 de junho de 2024

"Tu Não És Como As Outras Mães" de Angelika Schrobsdorff

Este livro merece uma leitura atenta. A autora pretende relatar, o mais fielmente possível e sem quaisquer juízos de valor, a vida de sua mãe sendo que, na minha opinião, consegue fazê-lo bastante bem. Isso é de louvar porque se trata de contar também um pouco da sua própria vida. O narrador a maior parte das vezes é omnisciente mas, de quando em quando, passa a ser narrado na primeira pessoa, ou seja, pela própria autora, revelando uma intensidade de sentimentos aos quais não consegue ficar indiferente. Ao escrever esta ficção auto-biográfica tem necessariamente que falar do ambiente socio-político e económico vivido nesses anos.

Não se pode afirmar que Else obedecesse às convenções, bem pelo contrário, mas a sua preocupação com os filhos foi uma constante durante toda a sua vida, pese embora a forma de mostrar esse amor não encaixasse nos padrões habituais. Else era alemã, judia e pertencia a uma família burguesa. Tinha uma vida despreocupada e viveu os loucos anos 20 em Berlim, fazendo tudo o que achava ter direito. As convenções eram para ser quebradas e o amor era para ser vivido, sempre à revelia dos pais, escondendo-lhes factos que achava que iam quebrar a imagem que tinham dela. O leitor começa aos poucos a aperceber-se, conhecendo a História Mundial, do que está para suceder, nomeadamente, a subida de Hitler ao poder e a perseguição cada vez mais intensa aos judeus. A perplexidade era um sentimento comum: aquilo não podia estar a acontecer e a opinião generalizada era que não poderia piorar!

O ambiente familiar que Else criou durante a sua vida, muito pouco tradicional, junto com os seus ex-maridos, suas mulheres e filhos, a sua fuga para a Bulgária, quando as coisas pioraram e a sua vida lá, a vivência no pós-guerra, tudo faz com que estejamos presos a estas páginas e não queiramos perder nada. 

Baseada em cartas e outros registos escritos deixados pelos seus avós à autora, que guardaram os “escritos” de Else, este livro leva-nos para um mundo que é difícil largar. Ler é bom assim!

Terminado em 4 de Maio de 2024

Estrelas: 6*

Sinopse

Enquanto jovem mulher, Else, uma menina mimada da burguesia de Berlim, fez duas promessas a si mesma: viver a vida intensamente e ter um filho de todos os homens que amasse.

"Tu Não és Como as Outras Mães" é a história real dessa vida intensa, extravagante, inconformista que foi a de Else Kirschner, uma mulher verdadeiramente livre, e uma mãe diferente de todas as outras.

Nascida na conservadora burguesia judia de Berlim, Else estava prometida para casar com um bom partido. Mas os encantos de um artista cristão - «o maior amor e pior partido da sua vida» - foram o trampolim que procurava para renunciar ao conforto da casa paterna e ser dona do seu destino num mundo cheio de promessa.
Corriam os loucos anos vinte, dias efervescentes numa Berlim que parecia a capital do mundo, um tempo irrepetível de cultura, esplendor e liberdade. Else vivia no centro dessa boémia, incapaz de suspeitar que uma ameaça arrepiante cercava inexoravelmente a sua família.

Quando as sombras do Nacional Socialismo tingiram a Europa de negro, Else, judia, teve de fugir com a família da cidade que tanto amava. No exílio, na Bulgária, tudo é miserável, tudo é muito pouco quando comparado com a primeira vida. Nessa segunda vida, Else arrepender-se-á de não ter protegido a família da calamidade, que se revela trágica para alguns.

Esta é a história de uma vida maior que a vida, um retalho de História extraordinário. Quem nos conta a história é Angelika Schrobsdorff, importante escritora de origem alemã. Era filha de Else e demorou quinze anos a pôr no papel a história da mãe, sem sentimentalismo mas com o amor e a admiração inevitáveis, criando um pedaço de grande literatura, um clássico do nosso tempo.

Cris