Gosta deste blog? Então siga-me...

Também estamos no Facebook e Twitter

quarta-feira, 31 de março de 2021

"Kingsbridge: O Amanhecer de uma Nova Era" de Ken Follett

Ken Follett é uma autor seguro para o qual gosto sempre de voltar. Creio que as primeiras obras que li dele foram precisamente as desta série relacionadas com a Idade Média e giram em torno de construções edificadas nessa altura e as famílias dos construtores das mesmas, numa Inglaterra muito diferente da que sabemos existir hoje.

Dito assim parece que pouco há a contar mas isso é porque não conhecem a escrita de Follett. É completamente apaixonante e a trama que ele constrói é tão grande quanto as obras construídas pelos personagens!

Li, pois, Os Pilares da Terra e O Mundo Sem Fim, cuja história decorre 300 anos depois. Adorei! Fui para mundos completamente diferentes e a escrita prendeu-me por completo, aspectos que procuro com sofreguidão nas minhas leituras.

Este livro é a prequela dessas histórias. O factor surpresa já não aconteceu aqui porque sabia bem ao que ia e não esperava menos... e ao fim de duas páginas já estava embrenhada na vida de Edgar, um jovem construtor de barcos que se levanta de madrugada para fugir com a mulher que ama, casada com um habitante da aldeia onde mora com seus pais e irmãos.

São quase 700 páginas que passam sem darmos por isso. Claro que sentimos que a história vai terminar de forma positiva, ou pelo menos, esperamos que assim seja mas as peripécias por que Edgar passa são muitas vezes devastadoras e ansiamos por esse final logo desde o princípio. Princípio que começa tragicamente com a morte da mulher que ama, por isso não pensem que Edgar tem a vida facilitada... 

Com um enredo de cortar a respiração, mais vezes do que aquelas que gostaria, fiquei maravilhada com os pormenores cuidadosamente estudados e trabalhados sobre uma época onde comer e matar podiam ser os pratos de uma refeição diária. A extrema pobreza do povo em contraste com o esbanjamento dos nobres e clero, a justiça desigual criada para proteger e aumentar o poder destes últimos, tudo é sabiamente conjugado numa trama magnífica.

Se não conhecem não sabem o que estão a perder! Podem começar por este e avançar para os outros mas preparem-se para uma leitura compulsiva. Li conjuntamente com dois amigos e avancei sempre mais do que o previsto, tal era a ânsia de ficar a saber mais. Não se assustem com o volume porque não vão dar por ele e que o peso não vos faça desistir... Por falar nisso, há em ebook também. É um dos casos em que se torna favorável ter um e-reader.

Recomendo muito.

Terminado em 22 de Março de 2021

Estrelas: 6*

Sinopse

Corre o ano de 997 d. C., aproximando-se o final da Idade das Trevas. A Inglaterra enfrenta os ataques dos galeses vindos do Oeste e dos viquingues a Leste. Os poderosos usam a justiça a seu bel-prazer, ignorando o povo e entrando muitas vezes em conflito com o rei. Na ausência de leis claras, reina o caos.

Nestes tempos conturbados, cruzam-se os destinos de três personagens. A vida de um jovem construtor de barcos é arruinada quando o único lar que conhece é atacado pelos viquingues, obrigando a que ele e a sua família mudem de terra e recomecem a vida num lugarejo ao qual não se conseguem adaptar… Uma mulher nobre da Normandia casa-se por amor e segue o marido até uma terra nova além-mar. Contudo, os hábitos da nova pátria são profundamente diferentes e, à medida que começa a aperceber-se de que, em seu redor, se desenrola uma luta constante e brutal pelo poder, compreende que um único passo em falso poderá redundar em catástrofe… Um monge tem o sonho de transformar a sua humilde abadia num centro de conhecimento que suscite a admiração de toda a Europa. E os três entram num perigoso conflito com um bispo arguto e impiedoso que tudo fará para aumentar a riqueza e o poder que detém. 

Há trinta anos, Ken Follett publicou o seu romance mais célebre, Os Pilares da Terra. Agora, a nova prequela magistral, Kingsbridge: O Amanhecer de uma Nova Era, leva-nos numa viagem épica a um passado rico em ambição e rivalidade, mortes e nascimentos, amor e ódio, que termina quando se inicia Os Pilares da Terra." 

Cris

terça-feira, 30 de março de 2021

Para os Mais Pequeninos: "O Lobito Azul"


Hoje venho falar-vos de um livro pequenino dedicado ao pai. O Lobito quer oferecer um presente ao seu pai mas quer uma coisa muito especial porque quer algo do tamanho do amor que sente por ele! 

Um cavalo? Um elefante? Um urso? Como escolher uma prenda do tamanho do mundo? Do tamanho do seu amor?

Um livro de capa dura e almofadada, pequeno e cheio de ideias para serem trabalhadas com os mais pequeninos. O amor pode traduzir-se em coisas muito pequeninas mas feitas com muito carinho e isso é o  que realmente tem importância para quem recebe.

Ilustrações especiais para os nossos pequeninos que são especiais também!



Cris

segunda-feira, 29 de março de 2021

"D.A.D." de Alexandre Esgaio

Uma leitura muito divertida e com ilustrações feitas pelo autor que valem pela sua expressividade. É uma BD que se lê rapidamente e que dispõe muito bem. 

Conta-nos as peripécias de um pai divorciado com as suas filhas pequenas, no seu dia a dia. Situações caricatas, cheias de humor e que o levam ao limite.

Mas o que achei mais engraçado mesmo foram os desenhos muito expressivos e cheios de humor. Lê-se com um sorriso e é certo que o leitor se vai rever nalgumas situações.

Querem uns bons momentos para se divertirem, com ilustrações cheias de perspicácia e muito inteligentes? Ei-lo!

Terminado em 15 de Março de 2021

Estrelas: 4*

Sinopse

Um pai, duas filhas. Uma casa para arrumar, roupa para lavar, comida para fazer, crianças para ir buscar à escola, birras, quedas, caos, alegria, humor e amor.

Assim são os desenhos de Alexandre Esgaio, umas vezes amorosos, outras hilariantes, misturados com referências a grandes nomes da arte, pequenas homenagens espalhadas ao longo do livro e que nos apanham de surpresa.

Um livro de banda desenhada feito de pequenos momentos na vida de um pai de duas filhas irrequietas, inteligentes e muito senhoras de si.

Cris

domingo, 28 de março de 2021

Ao Domingo com... Norberto Morais

 



 


sou um próximo dos melancólicos esquivos
dos saudosos de um futuro que não vem
um semelhante dos realistas depressivos
dos homens bem medidos que se não consideram ninguém
vivo na casa periclitante 
da árvore inclinada sobre o abismo
não por uma tristeza edificante
ou qualquer casta de romantismo
sou de luto feito todo
sem qualquer outra razão
que a do lodo ser lodo
porque não pode ser chão

Norberto Morais

sexta-feira, 26 de março de 2021

A Convidada escolhe: "Palavras em Tempos de Crise"

“Palavras em Tempos de Crise”, Luis Sepúlveda, 2012

Há um ano tomámos conhecimento de que Luis Sepúlveda, que tinha estado nas Correntes d’Escritas na Póvoa de Varzim, estava infectado com o novo coronavírus. Viria a falecer em meados de Abril com apenas 70 anos e para quem gostava do homem e dos seus livros, foi um choque e uma grande tristeza. Ainda tenho por ler alguns dos seus livros e este ano, quando seleccionei os livros que iria ler, fui buscar um deles e, no “sorteio” dos 27 títulos a ler este ano, tirei o papelinho que dizia “Palavras em Tempos de Crise”.

Não sei se foi o facto de “Rosas de Atacama” ter sido um dos primeiros livros que li de Sepúlveda, esse livro sempre teve um lugar muito especial no meu coração. Mal comecei a ler “Palavras em Tempos de Crise”, percebi que a estrutura era parecida: pequenos artigos, experiências e reflexões pessoais. 

Embora abarcando temas muito diversos, o facto de ter sido escrito em 2012, quando Espanha, Portugal e tantos outros países sobreviviam debaixo do garrote do défice e da dívida e os governos se baixavam na vassalagem aos mercados e aos poderes da finança, faz com que muitos dos artigos deste “Palavras em Tempos de Crise” sejam verdadeiros manifestos de um homem de esquerda que não poupa Aznar, Rajoy, Felipe González e outros, que permitiram que as consequências da corrupção, da especulação imobiliária e a miragem de dinheiro fácil com o turismo desabassem sobre os povos, para pagarem os desmandos de desgovernações sucessivas. Sepúlveda, o andarilho que escolheu as Astúrias como segunda pátria, não esquece neste livro os mineiros e as suas greves prolongadas e corajosas, lembrando também os mineiros chilenos e as suas lutas. A sua escrita, vincadamente militante e poderosa, usa expressões como “solidariedade de classe” em contraponto aos eufemismos com que os governantes vassalos tentam adocicar a luta de classes que não morreu. Por isso, Sepúlveda fala do peso do Sul em todos os seus livros, porque como escritor tem um compromisso de dar voz aos que não têm voz, sejam os emigrantes, os oprimidos, os mineiros explorados, lembrando aquela visita que fez ao campo de extermínio de Bergen Belsen onde, junto a um dos fornos crematórios leu a seguinte inscrição: “Eu estive aqui e ninguém contará a minha história.”

Sepúlveda foi um homem de paixões, pelos seus amigos, pelos seus animais, pela família. Numa vida em constante movimento, a lembrar o pássaro de corda de Haruki Murakami, o autor chileno fala da alegria que é juntar a família dispersa pelo mundo em torno de um churrasco e do prazer que sente por os filhos o tratarem por “velho”. E pergunta-se: terei sido um bom pai? Terei estado presente quando eles precisaram? Terei sido um companheiro? Escreve também sobre os amigos e nomeia-os, recorda episódios, alguns hilariantes e marcantes, inesquecíveis, não esquece amigos que já partiram: Tonino Guerra, Gabo, Neruda, Nicanor Parra, Allende e os amigos que com ele faziam a segurança pessoal do presidente assassinado pela ditadura. E entre os animais, a cadela Laika a lembrar-nos Zorbas num dos belos contos de “As Rosas de Atacama”. E ainda a ternura das primeiras paixões de adolescente…

Por fim e porque Sepúlveda fala com carinho e admiração das Correntes d’Escritas, “um dos melhores festivais literários que se fazem na Europa”, referência ao artigo Pilar e José e ao documentário de Miguel Gonçalves Mendes, exibido em 2011 numa noite particularmente fria.

Este ano, já não tivemos Sepúlveda fisicamente presente na Póvoa de Varzim, mas o festival de 2021 foi-lhe dedicado em permanência e ele esteve sempre presente. Bem haja, Luis Sepúlveda, por dar voz a quem não tem voz. 

21 de Março de 2021 

Almerinda Bento


quinta-feira, 25 de março de 2021

Para os Mais Pequeninos: "Ser Pequeno na Cidade"


Este livro é uma pequena maravilha de tão expressivas são as suas ilustrações! Quase não precisam de texto e foi isso que o seu autor fez. Sendo o ilustrador pode conjugar a imagem e a palavra de uma forma magnífica!

Do título, o tema. Ser pequeno na cidade às vezes pode assustar. São sons muito esquisitos que surgem sem aviso prévio e que por isso, a história mostra-nos alguns dos perigos e alguns conselhos...

Maravilhoso! Ora vejam:





Cris

quarta-feira, 24 de março de 2021

Experiências na Cozinha: "As Receitas - O Poder do Jejum Intermitente"


Hoje trazemos-vos um docinho. Porque às vezes apetece e sabe muito bem mas devemos ter consciência que o açúcar provoca e alimenta as inflamações que possam existir no nosso organismo. Então, um doce mais saudável é muito bem vindo!

Já faço jejum intermitente há mais de um ano e, neste ano tão atípico, foi o que me ajudou a manter (e inclusive baixar) o peso. Mas o intuito quando comecei gradualmente a praticá-lo foi a melhoria da minha saúde e, com isso, a perca de peso estava implícita. 

Mas este livro não é só para quem pratica o jejum intermitente. É para quem se preocupa com a sua saúde e pretende aprender a comer melhor! É basicamente um livro de receitas que complementa o livro anterior da Dra. Alexandra Vasconcelos, O Poder do Jejum Intermitente.

Saber o que comer, que alimentos privilegiar em detrimento de outros... Vejam estas trufas sem o típico açúcar. Boa dica esta de o substituir por tâmaras. As tâmaras possuem muita fibra que vai contrabalançar o seu doce...

Vejam, provem com os olhos e façam-nas. São muito fáceis e rápidas!




 


Palmira e Cris


terça-feira, 23 de março de 2021

A Convidada Escolhe: "Um Postal de Detroit"

“Um Postal de Detroit”, João Ricardo Pedro, 2016

Um livro vertiginoso, delirante, perturbador, alucinante. Foram os adjectivos que me saíram, mal acabei de ler este livro, cuja leitura foi rápida e viciante. Partindo de um acontecimento que constituiu o mais dramático acidente ferroviário em Portugal – Alcafache, Setembro de 1985 – o autor cria um verdadeiro puzzle de personagens, momentos e situações em torno de Marta, de quem só foi encontrada uma mochila no meio dos destroços daquele terrível acidente.

Marta é uma estudante de Belas Artes, desenhadora à vista. Tudo é motivo para os seus desenhos em cadernos, os seus diários visuais. Esses desenhos podem ser feitos durante uma viagem de metro, numa rua do Intendente, numas férias em Lagos ou na casa de Sofia perto de Grândola, ou a partir da janela do quarto que dá para a Praça de Londres. Em qualquer sítio. E podem aparecer aqui ou ali, fazendo parte duma história maior, contada por um narrador que junta peças, que junta falas, que recorda situações, que traz memórias de episódios ou de vozes. Ele, criança, o irmão mais novo de Marta, que ela nunca desenhava e não deixava entrar no quarto para espreitar os seus desenhos. Ele, agora, passados trinta anos. 

Tudo no livro é muito visual e nítido: os desenhos de Marta, as brincadeiras de João (o narrador) com os seus exércitos de índios e generais, os relatos do acidente ferroviário feitos por jornalistas, por bombeiros, por feridos e sobreviventes, o trabalho de Silvana a limpar cada objecto do quarto de Marta, sem esquecer o postal de Detroit. E tem partes hilariantes, bem dispostas, ligando histórias dispersas e desconexas, que me fizeram recordar “A Tia Júlia e o Escrevedor” de Mario Vargas Llosa. 

Bem perto do final do livro, o narrador dirige-se ao leitor neste termos: “Querido leitor, prometo-te desde já que esta é a última vez que te interpelo nestes termos. Na verdade, detesto fazê-lo. Porque o faço, então? Para te lembrar que deste lado está um homem doente, e que este livro que seguras nas mãos é apenas uma das muitas manifestações da sua doença. Se ainda guardas alguma expectativa a respeito das páginas que te restam, apelo à tua boa vontade, faz uma de duas coisas: deita fora as expectativas ou deita fora o livro.”

Claro que mantive as expectativas e fui até ao final do livro. A cidade de Detroit tinha aparecido inúmeras vezes ao longo do livro, para além do postal de Detroit que Silvana sempre limpava e colocava no mesmo sítio no quarto de Marta, entre os livros sobre Caravaggio ou Cézanne, as pilhas de cadernos de desenho ou a fotografia da equipa feminina de voleibol de que Marta fazia parte. Foi preciso um estorninho entrar pelo quarto de Marta e atirar uma série de objectos ao chão, entre eles o postal de Detroit, para João o apanhar e finalmente ler o que lá estava escrito.

E mais não digo. Leiam o livro. Leiam-no e saberão quem escreveu aquele postal a Marta.

13 de Março de 2021 

Almerinda Bento

segunda-feira, 22 de março de 2021

"O Sítio do Lugar Nenhum" de Norberto Morais

Gosto tanto quando um livro me vai surpreendendo no decorrer da leitura e quando, depois de mundos e fundos, não deixa nada solto, tudo se encaixa. Sei que este livro demorou alguns anos a estar pronto e não me admiro. Escrita cuidada, sem ser pretenciosa. Tudo foi pensado ao pormenor ou, pelo menos, com extrema atenção. Porque seria fácil deixar pontas soltas, esquecer alguns detalhes, tal a riqueza de personagens e lugares aqui descritos.

Mas voltemos ao início, se é que é possível ordenar as ideias logo depois de ter terminado. Escrevo a quente, portanto. Como gosto. Uma parceira do crime recomendou-mo. Aliás, recomendou os outros livros do autor. Mas, já sabem como é... as vontades vão sendo muitas e vão ficando esquecidas!

Então, primeiro, quero elogiar a escrita do autor. Ela e a trama imaginada formam um casal perfeito. Tudo encaixa nos seus devidos lugares sem nunca deixar de surpreender pela riqueza, ora de uma, ora de outra. Os personagens com as suas peculiaridades e seus nomes diferentes, imaginativos, são de uma complexidade humana que fiquei a admirar. Parecem reais e, ao mesmo tempo, não. E os lugares, os povoados e cidades de uma país que pensamos reconhecer mas que não existe. Fantástico!

Gostei muito dos trocadilhos, da forma como o autor brinca com as palavras, de como no meio do nada nos damos conta que elas passam a rimar, de como somos "obrigados" a voltar atrás e a ler em voz alta porque o que estamos a ler é bonito demais para ficar cá dentro, sem voz.

Gostei de ter sido surpreendida com o tempo da acção (quem já leu sabe do que falo) e de como aprendi a deixar ir os personagens, a dizer adeus a tantos que ficaram cá dentro por serem especiais.

Criar personagens assim não é para todos. Criar um mundo inventado que nos parece plausível também não.  Parabéns Norberto! Fiquei fã!

Terminado em 10 de Março de 2021

Estrelas: 6*

Sinopse

Um homem pendurado pelos pés no centro da praça. Um jovem que trai a família no dia do casamento. Uma menina sem história que só conhece uma palavra. Um país em êxodo no rasto da fortuna. Um menino órfão como promessa de eternidade. Uma luta armada no coração da montanha. Um homem capaz de transformar vícios em ouro. Um amor destinado desde o princípio dos tempos. Uma velha que aguarda o noivo enforcado. Um grupo de viajantes que se perde para sempre. Um batoteiro que se regenera por apego a uma criança. Uma prostituta que ensina rapazes a amar. Um jornalista à procura da história perfeita. Um escravo cego que encanta ao piano. Uma carrinha azul e o seu enorme chofer. Um amor impossível entre dois homens. Um cigano que rouba uma menina da vida. Uma ilha de loucos no meio do oceano. Um velho que dá saltos mortais para espantar a morte. Um padre que vende a alma ao Diabo por uma noite de amor. Uma história esquecida no meio do nada... Um sítio perdido em lugar nenhum.

Cris

sexta-feira, 19 de março de 2021

"Se Com Pétalas ou Ossos" de João Reis

Confesso que estava muito expectante com esta leitura. Tinha lido e gostado muitíssimo, de A Avó e a Neve Russa e pensei que este livro me conquistasse de imediato como o outro. A leitura faz-se bem mas li-o sempre com a certeza que iria surgir algo de inesperado, repentino e isso não aconteceu. Fiz mil imagens, esperando sempre que algo me surpreendesse. 

As dificuldades de um jovem escritor por não ter sequer uma ideia do que escrever, que história engendrar enquanto o prazo para entrega do manuscrito se aproximava rapidamente. Queria e esperava algo mais. Por isso quando cheguei ao final, soube-me a pouco.  

Terminado em 7 de Março de 2021

Estrelas: 3*

Sinopse

Um jovem autor português instala-se numa residência para escritores em Seul para escrever o seu próximo romance. Em vez disso, deambula pela cidade com a namorada, possivelmente grávida, e entrega-se a todo o tipo de fait divers mais ou menos absurdos, não obstante a pressão dos editores. Nesta quase variação indolente do escrivão Bartleby, João Reis apresenta-nos uma personagem que parece cair dentro de si numa espiral vertiginosa e quase joyceana, lançando, ao mesmo tempo, um olhar amargo e mordaz sobre os colegas de profissão, os editores e outras figuras do meio editorial português.

Ao deixar-se levar pelo fluxo dos acontecimentos, detendo-se obsessivamente num e noutro pormenor irrelevante, Rodrigo encarna o protótipo do anti-herói desencantado e imperfeito, derrotado à partida pela ficção da vida. Se com Pétalas ou Ossos retoma a ideia iniciada com o seu primeiro livro, A Noiva do Tradutor, levando-a ao paroxismo, para lá do qual a inércia se confunde com a redenção.

Cris

quinta-feira, 18 de março de 2021

"O Pequeno Caderno das Grandes Verdades" de Clare Pooley

Uma leitura muito simpática e leve mas que prendeu a minha atenção de imediato! Com uma história cheia de imaginação, a autora leva-nos a pensar em como os acontecimentos do dia a dia podem ser alterados através de algumas considerações e análises mais profundas sobre as nossas intenções, propósitos e retrospectivas dos nossos actos e vontades. 

Um caderno é posto a circular com o intuito de o fazer passar entre várias pessoas que não se conhecem. A regra é simples: quem escreve tem de ser honesto consigo próprio e revelar os seus segredos. E vai passando de mão em mão e, sem ser esse o propósito, vai ligando os vários donos do mesmo. E assim, seis desconhecidos acabam por ficar ligados por esta ideia, de iniciativa de um septuagenário, a que chama "Projecto da Autenticidade". 

Engraçado e envolvente. Enganadoramente simples. Porque nos fala de temas mais pesados (as várias dependências que muitos possuímos e criamos ao longo da vida), e nos leva a pensar em assuntos mais sérios, deixando-nos bem dispostos. 

Gostei muito.

Terminado em 2 de Março de 2021

Estrelas: 5*

Sinopse

Seis desconhecidos que têm em comum algo de universal: as suas vidas nem sempre são o que eles fazem parecer. O que aconteceria se em vez disso dissessem a verdade?

Julian, Monica, Hazard, Riley, Alice e Lizzie, seis pessoas muito diferentes, com vidas distintas, com algo em comum: a solidão. Através do pequeno caderno verde iniciado por Julian vão-se tornar amigos e ver as suas vidas transformadas para sempre. Considerado o livro feel-good de 2020.

Cris

quarta-feira, 17 de março de 2021

Experiências na Cozinha: "Cozinha das Emoções"


Hoje trazemo-vos uma sopa de cevada, um cereal recomendado pela macrobiótica para ser consumida na Primavera, porque se acredita que a cevada ajuda a função hepática que, de acordo com a medicina oriental, está mais activa, energeticamente, nesta estação.

Não estamos muito habituados a comer cevada em grão, mas é um cereal muito nutritivo e que pode servir de acompanhamento ou em saladas quentes e frias.





Palmira e Cris

terça-feira, 16 de março de 2021

"Sobre a Leitura" de Marcel Proust

Oferta de anos, inesperada, com direito a leitura imediata. Peguei nele porque é realmente pequeno este livro e mais parece um conto. 

Sei que é um lugar comum dizer isto mas é assim mesmo... não foi uma leitura para mim, de momento, nem sei se o será num amanhã próximo. O título diz quase tudo mas achei difícil acompanhar as divagações do autor e, agora, passado que foram alguns dias não tenho lembranças que cheguem para poder comentar muito mais que isto. Não me marcou mas sei que leituras destas não são as minhas preferidas nos dias de hoje. Quero algo que me agarre, que me prenda.

Trata-se de considerações sobre a leitura, algumas bonitas e com muito sentido. Outras não as senti e li sem grande atenção. Talvez mais tarde, um dia. Fica na estante para pegar nele quando estiver na "mood" certa.

Terminado em 27 de Fevereiro de 2021

Estrelas: 4*-

Sinopse 

Ler era, para Proust, mais do que a procura de conhecimento, uma atividade espiritual, um meio de se transformar e transcender. Ao lermos os grandes romances, afirma, entramos em contacto com ideias fantásticas e as mentes mais inspiradoras do mundo.

Cris

segunda-feira, 15 de março de 2021

A Convidada escolhe: “Caderno de Memórias Coloniais”

“Caderno de Memórias Coloniais”, Isabela Figueiredo, 2009

Um livro sem rodriguinhos, em que a narradora recorda a sua infância vivida em Moçambique até aos 13 anos e os seus primeiros tempos em Portugal, então já como retornada. Organizado em capítulos, alguns bastante breves e sincopados, são como flashes, diapositivos do colonialismo e da vida colonial. 

As personagens centrais deste “Caderno de Memórias Coloniais” são o pai da narradora (uma menina branca) e a própria narradora. O pai é o homem que ela ama e que vai trair (verbo que usa várias vezes ao longo da narrativa) porque renega os comportamentos incompreensíveis, reprováveis e inaceitáveis que ele tinha para com os naturais daquele país de África. Um livro forte, directo, a descascar o complexo colonial de ocupação abusiva e de desrespeito pelo outro, porque o outro é de cor diferente, tem uma natureza inferior, era um animal. “Venham falar-me do colonialismo suavezinho dos portugueses… Venham contar-me a história da carochinha”, diz a narradora quase no final do livro.

Para além de ser um livro desassombrado e honesto, tem honras de prefácios de Paulina Chiziane e de José Gil, já eles dignos de serem lidos e aqui referidos. “Este livro trata das relações de género, do colonialismo e do nacionalismo. Poucas são as obras literárias que tratam destas questões com tanta profundidade.” escreve a escritora moçambicana. E continua: “ Estávamos eu e tu, cada uma no seu lado da barricada, quando o colonialismo aconteceu. Tu, branca, filha de um colono racista e eu, negra, filha de um colonizado, também racista.” Já José Gil assinala, a terminar: “Estas “memórias” são mais do que lembranças, são a própria vida, ontem-agora, a nossa vida de filhos de colonos (ou não) de Moçambique. Neste sentido, o “Caderno de Memórias Coloniais” de Isabela Figueiredo é mais do que um inventário romanceado de factos e acontecimentos: consegue exprimir-nos como se nós, leitores, tivéssemos todos atravessado o que autora experienciou. Nós todos somos “a pequena colona branca” com alma de preta, com a existência estilhaçada e o violento desejo de viver.”

Mas ainda antes dos prefácios, a autora dirige umas palavras prévias a quem a lê, explicando o porquê deste “Caderno”: “Não havia com quem falar sobre as coisas que me interpelavam, nomeadamente as que juntavam e separavam um ser humano de outro. Não existia essa linguagem nem discurso. Ninguém era capaz de me explicar.” (…) “O paradoxo reside no facto de só se ultrapassarem os choques de uma vivência, desenterrando-a, revolvendo os seus restos. O tempo silencioso apenas se abstém de produzir ruído.” (…) “A História enfrenta sempre esse grande óbice, que cabe aos investigadores ultrapassar: o silêncio sobre o que muito se calou ou escondeu. O que não honra. O lixo faz-se desaparecer, os cadáveres emparedam-se e tudo deixa de existir. Não vimos, não sabemos, nunca ouvimos falar, não demos por nada.”

“O “Caderno de Memórias Coloniais” relata a história de uma menina a caminho da adolescência, que viveu essa fase da vida no período tumultuoso do final do Império colonial português. O cenário é a cidade de Lourenço Marques, hoje Maputo, espaço no qual se movem as duas personagens em luta: pai e filha. São símbolos de um velho e de um novo poder; de um velho mundo que chegou ao fim, confrontado por uma nova era que desponta e exige explicações. A guerra dos mundos em 1970.”

“Mas o “Caderno” transcende as questões de poder colonial, racial, social e de género, transformando-se, também, numa narrativa de amor filial conturbado e indestrutível.”

A linguagem é crua, capaz de escandalizar espíritos mais sensíveis. Aliás, o livro foi mal amado por muitos que se viram retratados, mas que não assumem as marcas odiosas do colonialismo e do racismo; mas também foi muito bem recebido “pela crítica, pela Academia e pelos leitores em geral”, tendo sido lido e estudado no mundo inteiro, com várias edições desde 2009, indo já na 9ª edição. Pretas e senhoras (mulheres decentes), pretos e brancos, havia uma clara separação e hierarquização, pelo que embora um branco pudesse casar com uma negra, uma branca assumir uma relação com um negro levaria à inevitável proscrição social. A estratificação estava claramente estabelecida: quem vendia na rua; quem tinha acesso só ao elevador de serviço para ir buscar o lixo do prédio; quem recebia as sobras; quem recebia roupa velha e rasgada; quem se sentava em determinados lugares no cinema e só naqueles. 

A filha do electricista que observa tudo e que ouve as conversas do pai com os outros homens e que, quando é mandada para a Metrópole, com a incumbência de contar o que os pretos estavam a fazer aos brancos que só sonhavam transformar África numa Califórnia, sente que traiu o pai porque nunca foi capaz de o fazer. Ou de o fazer, como ele queria. A verdade é que “o tempo dos brancos tinha acabado.” 

Há pois, nesta obra, um antes e um depois da independência. A menina branca, filha do colono racista, vai viver para a casa miserável da avó, vai ser a retornada gorda, vai sentir o desenraizamento e o desamor com que é olhada pelos portugueses da Metrópole. 

Estes são breves traços do livro e da leitura que faço dele, mas acho que ele ainda fica mais rico com os prefácios com que Paulina Chiziane e José Gil brindaram este livro imprescindível para se fazer a história do colonialismo e racismo português.

5 de Março de 2021 

Almerinda Bento