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sexta-feira, 30 de setembro de 2022

"O Colibri" de Sandro Veronesi

Foi uma peripécia ler este livro. Já vos conto... 

Comecei a ler com o meu e-reader, o Kobo, mas não foi um começo fácil. Apercebi-me que a narrativa saltava no tempo quando mudava de capítulo mas não era um simples "antes e depois". Quase que afirmo que cada capítulo se refere a um ano, umas vezes recuando 10, 4, 2 anos outras avançando 8, 5, 3... Um pouco confuso para quem se quer situar na trama e, muito difícil para quem está a ler no Kobo onde, para mim, o folhear para trás ainda é difícil.

Depois, ao fim de algumas páginas, passei para o livro físico que uma amiga me tinha emprestado. E coloquei para o lado essa tentativa de perceber com clareza em que ano se passava o enredo do momento. Foi o que fiz de melhor! A história começou a entrar, os personagens também, o espaço físico e temporal a ser mais claro. A história passou a fazer sentido!

Marco é oftalmologista. De alguma forma, como lembrou uma amiga, faz recordar o personagem do Stoner. Nada se passa na sua vida e, no entanto, a sua vida possuiu momentos de extrema dureza. A morte acompanha-o sempre e está presente durante a sua vida toda. Quando pretende desistir, alguém depende dele e não o pode fazer. 

É um pilar de força e perseverança, mesmo sem querer. Conhece o amor profundo, de vários tipos até, mas ou não o vive activamente ou o amor é efémero. O final é arrebatador. Comove e aperta o coração. Se na vida real a morte pudesse ser assim...

O título tem tudo a ver com a comparação que fazem deste personagem com esta ave aparentemente frágil. A capa, com o pássaro em relevo, é linda.

Se gostei? Sim, muito. Mas só tive consciência disso a meio do livro quando me desliguei do pormenor das datas e deixei fluir a leitura. Discurso direto que nos aproxima dos personagens e faz-nos sentir em maior grau as suas dores; discurso indireto que nos distancia e permite-nos analisar os acontecimentos com o afastamento necessário para não nos envolvermos demasiado. A passagem de um para outro é feita suavemente, sem que se note. Perfeito. Partes da narrativa são-nos contadas através de cartas, correspondência trocada com o seu irmão e, também, com a mulher que amou a vida inteira sem a ter. Segredos que descortinamos aos poucos porque o autor é comedido a revelar.

Foi uma peripécia ler este livro. Mas, boa. Tão boa! É livro para comprar, ler e voltar a ler um dia. Fiquei de olho no livro anterior deste autor, que mora cá em casa há muito e que creio estar esgotado, "Caos Calmo".

Terminado em: 23 de Setembro de 2022

Estrelas: 5*

Sinopse

«Quando as paixões humanas colidem com as forças para além do controlo humano.»

Marco Carrera é um oftalmologista com uma vida boa e organizada - até que lhe entra pelo consultório um desconhecido, que sabe tudo sobre o seu passado e o avisa de que corre perigo. Além disso, diz-lhe que a sua mulher está a ter um caso extraconjugal e vai ter um filho que não é dele.

Estas revelações desencadeiam um longo fluxo de recordações: da infância e juventude, da família, da primeira mulher na vida dele, de um certo amigo, da irmã mais velha que morreu afogada. A narrativa constrói-se de forma empolgante e original, avançando e retrocedendo entre várias décadas dos séculos XX e XXI. E, em lugar da sequência habitual nas sagas familiares - «trauma, dor, recuperação» - tudo aqui parece acontecer ao mesmo tempo. E está sempre a acontecer. 

Cris

quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Para os Mais Pequeninos: "A Ágata Tem Ciúmes"


Muitas vezes as histórias bem simples são aquelas que nos fazem pensar mais e com as quais sentimos empatia. Foi o caso desta! 

A Ágata recebeu a prima em sua casa. Vem para passar uns dias com ela. Vai partilhar a sua escola, os seus amigos, os seus brinquedos e até as atenções dos seus pais. Tudo parece fácil tanto mais que Ágata adora a prima e acha-a o máximo! Mas, então, que coisa estranha é essa que sente no estômago quando vê que Melanie atrai todas as atenções?

Com umas ilustrações atraentes e muito representativas dos sentimentos opostos que abundam nesta história, este livro fala-nos de ciúme e de como através da verdade se pode percebê-lo e aniquilá-lo. Um texto fundamental para que os pequeninos possam perceber que sentimento é esse que muitas vezes possuem quando se sentem preteridos por algo ou alguém.

Gostei muito!


Cris

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

"Boneca de Luxo" de Truman Capote

Nunca tinha lido Truman Capote embora o seu livro mais conhecido, A Sangue Frio, morasse na minha estante há muito. A escolha deu-se porque, este Boneca de Luxo, foi recomendado e escolhido num grupo de leitura a que fui recentemente. Ainda pretendo ler o A Sangue Frio,para poder opinar com mais justiça sobre este autor.

Boneca de Luxo é bastante pequeno, não chegando a ter 100 páginas. Prende rapidamente como se quer num livro destas dimensões. Centra-se na história de uma rapariga, Holly Golightly, que, no tempo em que a história está a ser contada pelo narrador e seu amigo, se encontra em parte incerta. As memórias inundam Fred e ele relata como a conheceu, se tornou seu amigo e se apaixonou por essa rapariga irreverente e mundana de 21 anos, que fugia de todas as convenções da moral burguesa da época. Uma verdadeira corte de apaixonados segue-lhe os passos, abandonando-a quando ela mais precisa.

Holly é uma força da natureza e o seu inconformismo fá-la não desistir nunca. Gostei muito. Não esperem um final. A vida é assim mesmo. Composta por partes, por pessoas que entram e saem.

1958, Nova Iorque. Já na época da Guerra Fria.

Terminado em 11 de Setembro de 2022

Estrelas: 5*

Sinopse

De nariz arrebitado e cabelo despenteado, óculos escuros e acompanhada pelo seu inseparável gato cor de fogo, ela é uma mulher arrebatadora e impulsiva. Com um comportamento nem sempre adequado, as suas festas nocturnas causam o desespero de alguns e o fascínio de outros, mas Holly Golightly é, antes de mais, uma mulher jovem e romântica cujo maior sonho é encontrar um local onde se sinta em casa, um local em que se sinta real, um local em que possa ser ela própria e em que a sua vida possa ser comparada a um pequeno-almoço no Tiffany’s.

Retrato de uma época, esta obra capta o clima inquieto e exuberante da Nova Iorque dos anos 40, quando a incerteza dos tempos de guerra e o fim da Depressão libertaram mentalidades e radicalizaram modos de vida. Obra transposta para o cinema em 1961 Boneca de Luxo (Breakfast at Tiffany’s), com a participação de Audrey Hepburn (a qual foi nomeada para o Óscar de Melhor Actriz) e George Peppard, venceu nesse ano dois Óscares, para Melhor Canção Original e Melhor Banda Sonora, com a inesquecível música de Henri Mancini Moonriver, e é já considerada um clássico do cinema. 

Cris

 

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

"Quarto de Despejo, Diário de uma Favelada" de Carolina Maria de Jesus

Ouvi falar bem neste livro e li-o em ebook na versão brasileira. Creio que há já uma editora que o publicou cá em Portugal. É um diário escrito por uma mulher que viveu numa favela em S. Paulo, Brasil. Foi começado a escrever em 15 Julho de 1955 passando depois para 1958.

São pequenas entradas contando alguns apontamentos diários de sua vida. Carolina vive com os seus três filhos em condições de pobreza extrema. O seu barraco tem chão de terra batida e não tem água. O seu objetivo diário é a sobrevivência dos seus e por isso "cata" papel, ferro e o que consegue aproveitar para vender nas ruas da cidade. A ida para buscar água é diária. Sabe que o seu aspecto é, a maior parte das vezes, imundo e que, fora da favela, a olham com nojo. 

A fome é uma constante. A delinquência, os maus tratos, a violência, os roubos são os seus vizinhos de bairro. A bebida é um paliativo para a maior parte dos seus vizinhos. Bebem para festejar e bebem porque estão tristes. Carolina não bebe e, a maior parte das vezes, é uma mulher alegre, determinada em conseguir um futuro melhor para si e os seus mas as condições em que vive são de tal ordem que se deixa abater em muitas situações para logo se recompor...

Gosta de ler e escreve o que sente e o que vê. Os vizinhos sabem disso e é marginalizada em muitas situações por ser "diferente". Tem uma consciência política da situação vivida no país de então, verdadeiramente fora do que o leitor poderia esperar e escreve porque quer que fiquem a conhecer como vive um favelado e como é difícil prosperar naquelas condições.

Um relato impressionante, algo repetitivo, porque a vida para Carolina são dias e dias de uma luta sem resultados positivos visíveis. E a fome sempre lá.

Terminado a 5 de Setembro de 2022

Estrelas: 6*

Sinopse

«O texto de Carolina é acima de tudo um texto que interroga. Não só a sociedade e a política, mas também a literatura, os processos de tornar-se autor e de manter-se autor, em todo e qualquer lugar no qual o lugar de autor é ainda primordialmente tomado como sinonímia de um tipo muito específico de sujeito - homem, branco. Por essa razão, Quarto de despejo provocou um abalo sísmico no sistema literário; porque foi capaz de traduzir em ato um principio da autora: "na minha opinião escreve quem quer". Em consequência, Carolina abriu os caminhos para que possamos hoje pensar sensibilidade estética e elaboração narrativa como um dever aberto, e não como um a priori restrito a determinadas conjugações sociais, que tornam alguns sujeitos "legítimos" para serem autores e outros não.»

Cris

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

A Convidada Escolhe: Entre Pássaro e Anjo

Entre Pássaro e Anjo”, João de Melo, 1987


Gosto de ler livros que vão saindo, mas não deixo de ir à descoberta de tantos que se foram acumulando numa altura da minha vida em que o tempo de leitura era muitas vezes reduzido e, sobretudo, limitado aos períodos de férias. Faço agora aquilo que me prometi, quando a aposentação parecia uma coisa longínqua. Àqueles que se foram acumulando, juntei os muitos que herdei da minha irmã, leitora compulsiva e muito atenta aos escritores portugueses. Este “Entre Pássaro e Anjo” é um deles.

Quando outro dia na Feira do Livro, enquanto João de Melo me autografava o seu “Livro de Vozes e Sombras”, lhe dizia que estava a terminar “Entre Pássaro e Anjo”, ele fez uma expressão admirada, tanto mais que desde 1987 quando o livro saiu, já produziu mais catorze títulos… “Já está um pouco datado…” disse-me ele. Mas estará mesmo?

Entre Pássaro e Anjo” é um livro de contos. Com a força da presença das mulheres, podem ser “… tão numerosas como todas as mulheres que existem só para nos proteger e salvar” (p. 21), apaixonadas como a adolescente pelo seu professor, ou “viúvas-de-sangue”/ “viúvas-de-padre”/”fêmeas tristes do seu celibato” (p. 148) entre muitas outras designações escolhidas pelo autor para falar das carpideiras no funeral do padre Governo. Da sinopse na contracapa do livro retiro o seguinte: “É bem provável que a figura dominante de “Entre Pássaro e Anjo” seja de facto a mulher, ave pousada na manhã, como de uma delas chega a dizer o autor. E contudo, raras vezes como neste livro se terá ido tão longe na crueldade com que se descreve a ruína do corpo feminino e o velho adormecimento da paixão, o amargo refúgio do homem dentro da realidade autista dos seus sonhos. Voar, diz ainda João de Melo, é a principal vocação de pássaros e anjos. Mas a humanidade está infelizmente sempre pronta a ignorar esse apelo, incluindo as mulheres que não raras vezes se transformam em «mães masculinas» com largo uso de repreensão do próximo…” Ilustro esta ideia com uma citação extraída do conto “A Divina Miséria”: “A gente habitua-se à noite, tanto quanto os pássaros acabam por habituar-se a viver nas gaiolas suspensas das empenas. Se acontece de alguém erradamente os soltar, conhecem apenas a tristeza de umas asas sem préstimo. Perderam o sentido da orientação. Não sabem que as árvores servem para nelas pousarem. Remam no ar, contra o vento, embatem em obstáculos súbitos e inevitáveis. Desconhecem um mundo e recusam-se a aprendê-lo de novo. Cheios do tédio do infinito, permanecem atónitos e dificilmente escapam às doenças que existem só nos desertos. Se os não voltam a fechar nas gaiolas, morrem facilmente, perdidos da alegria. E já não têm idade. E nada sabem a respeito dos outros pássaros de voo largo e horizontal que, sendo livres, pousam tão devagar na alegria. Até medo lhes ganham. Afigura-se-lhes que os objectos que eles se tinham habituado a olhar à distância, por detrás da sua prisão de canas fictícias, estão agora para os devorar.” (p. 157)

Um livro muito político, com mensagens fortes, gritos contra a opressão, os opressores, sejam eles a Igreja, o poder instituído, a ditadura, a guerra, uma relação de casal que morreu e que não é mais que uma rotina. Podia ser qualquer país a viver sob ditadura, mas sente-se Portugal naquelas linhas, seja pela referência ao horror da guerra em África no conto “As Manhãs Rosadas”, ou nas alusões a um país entorpecido pelo sol e pela preguiça, que vive das glórias passadas, subjugado pelos americanos e esmagado pela dívida externa à espera de um homem providencial para as finanças como antes esperara por um ditador, um país sem futuro eternamente à espera de D. Sebastião em “Postumografia de Pedro-o-Homem”. “A Divina Miséria”, que decorre numa Ilha açoriana, parte da morte e do funeral do padre Governo para fazer uma crítica arrasadora à Igreja e ao seu poder. ”A dinastia dos padres era uma sucessão infame cujo único objectivo era perpetuar a mudez e a pobreza dos pobres. Sabe como? Dividiam o poder entre compadres, um braço armado na rua, outro braço na sacristia, e eles sempre na sombra, a fingirem-se, a darem-se ares de boas pessoas. Depois, vinham os ideólogos eclesiásticos, escreviam, propagandeavam que a pacificação do Rozário e do mundo era obra da Igreja e só dela.” (ps. 145 e 146) No entanto, a oposição e a hipótese de uma revolução é abortada com o desembarque dos marines americanos…

João de Melo não deixou de reflectir neste seu livro de contos também a sua experiência enquanto professor e escritor. A sala de professores num primeiro dia de aulas de Outubro, por onde desfilam “os animais docentes” descritos de uma forma tão divertida e real, na sua imensa diversidade, no conto com o mesmo nome. O professor, que partilha a viagem de autocarro para a escola com os seus alunos, que “pensara ao princípio que a sua presença salvaria o ensino do seu país” até que descobriu que “os autores vivos e os mais novos deles não estavam nos programas, quis pôr-se a berrar. Estava no país dos mortos, no país dos génios absolutos e indiscutíveis, só porque tinham morrido. Não valia a pena berrar. O país recusara-se a chegar ao século vinte!” (p. 117). “O Solar dos Mágicos”, último conto do livro, é uma sessão de lançamento e homenagem a um livro que ganhou um prémio literário; um logro, afinal. Não passa de um livro em branco. Mais uma sessão mundana, de gente que quer ser vista, que aproveita para comer e beber, que se quer abeirar de ministros e deputados. Um país com um ministro da Cultura, mas que não tem cultura.

Acho que é um livro cheio de ironia. Sem papas na língua. Muito crítico e, direi eu, actual e intemporal.

12 de Setembro de 2022

Almerinda Bento

sexta-feira, 16 de setembro de 2022

"Os Vampiros" de Filipe Melo e Juan Cavia

Depois de ter lido A Balada Para Sophie (opinião aqui) fiquei fã da dupla, Filipe Melo e Juan Cavia. Gostei mesmo muito da história e das ilustrações. Achei que havia um casamento perfeito e, espero não me enganar, estou a vê-los bem velhinhos ainda a oferecerem-nos história deliciosas, que encantam sobremaneira o leitor.

Foi uma amiga livrólica que me emprestou este "Os Vampiros" e, tanto pela opinião dela como pelo que já referi sobre os autores, confiei. Sabia que ia gostar. 

Suponho que para fazer jus ao título, a mancha lateral de cada página é preta. As ilustrações, maravilhosas. Apetece parar para melhor apreciar mas, ao mesmo tempo, somos impelidos a avançar pela trama em si. Castanhos, verdes e pretos imperam numa belíssima mancha que tem tudo menos de aborrecido!

Fui para esta leitura às cegas, sem saber do que tratava. O tema é pesado e as explicações que surgem nas ultimas páginas podem ser lidas no início, se preferirem saber ao que vão. O livro conta-nos uma história ficcionada de um grupo de forças especiais do exercito português que se encontra no palco da guerra colonial, mais propriamente na província ultramarina da Guiné, cuja luta armada só teve início em 1963. Note-se que em 1961 começaram as revoltas em Angola que se estenderam para Moçambique e Guiné. Muitas missões especiais ficaram por contar porque eram efetuadas no maior sigilo.

Uma explicação socio-geográfica ajuda a perceber melhor este palco que foi a guerra na Guiné. As condições difíceis do terreno - florestas pantanosas, savana densa, marés que as inundam por completo- e o facto do Exército não estar preparado para suportar esse clima, tornava qualquer missão arriscada e perigosa.

Esta história retrata uma possível missão ao Senegal, território vizinho, onde estariam aquartelados os rebeldes (PAIGC). Qualquer incursão ao país vizinho poderia causar um incidente diplomático pelo que estas missões eram mantidas em profundo segredo.

Uma graphic novel para reler. Uma compra a efetuar na Feira do Livro do próximo ano! 

Terminado em 3 de Setembro de 2022

Estrelas: 6*

Sinopse

Guiné, Dezembro de 1972.
Em plena guerra colonial, um grupo de soldados portugueses é destacado para uma operação secreta no Senegal. Porém, à medida que vão sendo consumidos pela paranóia e pelo cansaço, esta missão aparentemente simples vai transformar‑se num verdadeiro pesadelo.
Embrenhados na selva, estes homens terão de confrontar sucessivos demónios – os da guerra e os que trouxeram consigo.

Cris

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Resultado do Passatempo Mensal "Toca a Comentar"

Anunciamos o vencedor deste passatempo referente ao mês de Agosto.

Este é o link para o post onde se encontra anunciado o passatempo.

Assim, através do Random.Org, de todos os comentários efectuados nesse mês, foi seleccionado uma vencedora! Foi ela:

"Os Olhares da Gracinha"

Parabéns! Terás que comentar este post e enviar um email para otempoentreosmeuslivros@gmail.com até ao próximo dia 25, com os teus dados e escolher um de entre estes dois livros: 


Cris

domingo, 11 de setembro de 2022

Para os Mais Pequeninos: "Carta aos Líderes do Mundo"


Este livro é obrigatório! Quando se tem muito a dizer e se quer fazê-lo correctamente, as palavras parecem poucas e pequeninas...

A Sofia tem 12 anos. E já vê perfeitamente o quão de errado estamos a tratar o planeta e o quão urgente é preciso mudar. Infelizmente parece-lhe que o que se está a fazer não chega! O planeta tem uma doença pulmonar e até cardíaca!!!

Os pulmões da terra estão doentes com gravidade. Já todos ouvimos falar disso. Que fazemos individualmente ou em pequenos e grandes grupos? E o coração? Onde estão os valores da solidariedade, da justiça e do amor entre todos?

Afinal, ainda há gente que pensa que é dono do planeta Terra?

Começando pelas ilustrações: são tão, mas tão bonitas! E muito representativas da mensagem que se quer passar! As cores foram escolhidas na perfeição. A primeira imagem é impactante e temos logo uma visão de como as seguintes serão bonitas! Os líderes estão representados pelas cores escuras,  em preto e cinzentos. O restante livro é cheio de cores alegres e fortes.

Quanto à mensagem... que dizer mais? Transmitir estes ensinamentos às nossas crianças é muito importante. Mas, e nós, adultos? Que fazemos? Já começámos por algum lado, individualmente, a fazer alguma coisa para poupar os recursos desta nossa casa que é a TERRA?






Cris


quarta-feira, 7 de setembro de 2022

"As Musas" de Alex Michaelides

Gosto de thrillers que me deixem impacientes. Que me façam duvidar do que parece evidente mas que desconsertem com um final inesperado. Leio com gosto, o meu interesse sempre num crescendo e a minha impaciência sempre a subir de tom.

Mariana, psicoterapeuta e de naturalidade grega, ainda se encontra de luto pela perda recente do seu marido mas quando a sobrinha lhe pede ajuda, não hesita. Parte de Londres para Cambridge para a apoiar. O desaparecimento da melhor amiga e companheira de Zoe, é o mote que leva Mariana numa busca incessante com resultados verdadeiramente devastadores. 

O livro possui muitas referências à arte e literatura Grega, tanto mais que o personagem que vai ser o principal suspeito de Mariana é um professor de literatura e amante da cultura grega. O ambiente retratado - faculdade e jardins ao seu redor - também é propício a toda a tragédia que decorre nestas páginas.

Nada previsível o desfecho final, pelo menos para mim. Só a certeza que a verdade não poderia ser encontrada no caminho mais fácil permaneceu durante a leitura toda. A busca constante do assassino, faz com que tentasse procurar razões e motivos em boa parte dos personagens.

Capítulos curtos, linguagem acessível como se quer num bom thriller psicológico, esta é uma obra para se ler em dois pulos! O que estão à espera?

Terminado em 24 de Agosto de 2022

Estrelas: 4*+

Sinopse

Se Edward Fosca é um assassino? Disso, Mariana tem a certeza. Mas Fosca é intocável. O belo e carismático professor de Tragédia Grega na Universidade de Cambridge é adorado por funcionários e alunos ? principalmente pelas alunas que fazem parte das Musas, uma sociedade secreta.

Mariana é uma terapeuta de grupo extraordinária, mas as suas tragédias pessoais perseguem-na. Quando Tara, membro das Musas, é encontrada esfaqueada e sem vida, Mariana fica obcecada com o caso. Como antiga aluna de Cambridge, suspeita imediatamente de que, por detrás da beleza do edifício medieval que abriga a instituição secular e as suas antigas tradições, se esconde algo sinistro. Apesar de Edward Fosca ter um álibi, para Mariana ele é o responsável por aquela morte. Mas o que faria o professor atacar assim uma das alunas? E por que razão não para de falar dos ritos de Perséfone e da sua viagem ao Submundo?

Quando outro corpo é encontrado, Mariana fica descontrolada. Tem de conseguir provar a culpa de Fosca. Esta obsessão ameaça minar todas as relações que tem, mas ela está determinada e quer deter este assassino, ainda que isso lhe possa custar tudo… inclusive a própria vida.

terça-feira, 6 de setembro de 2022

A Convidada Escolhe: A Força da Idade

 A Força da Idade, Simone de Beauvoir, 1960


“A Força da Idade” é dos livros que herdei da minha irmã, talvez o mais importante. Ela tinha-me oferecido “Os Mandarins”, pediu-me que lho emprestasse para o ler e quase chegou ao fim do 2º volume naquelas férias fatídicas. Chegou a minha vez de ler este belíssimo exemplar de “A Força da Idade” editado pela Bertrand e descobri, ao longo da leitura, sublinhados que inevitavelmente me fazem reviver as suas preocupações, os seus interesses e os seus medos. Foi pois um livro cuja leitura me remeteu invariavelmente para ela e para as nossas vivências. Por isso, as palavras que vou escrever sobre este livro que Simone de Beauvoir dedicou a Jean Paul Sartre, dedico-as à memória da minha irmã Isabel.

Tinha lido “Memórias de uma Menina Bem Comportada” há muitos anos e lembro-me que foi durante muito tempo um livro muito vivo na minha memória, mas passados tantos anos, algumas das referências que Simone de Beauvoir faz no início do livro, naturalmente, pessoas importantes e marcantes na sua juventude, mas que entretanto deixei de identificar. “A Força da Idade”, para além de um livro autobiográfico em que a autora detalha momentos marcantes da sua juventude, como viveu pela primeira vez e de forma intensa a sensação de liberdade, é também um documento histórico valioso sobre o período que antecede a 2ª guerra mundial até ao momento da Libertação de Paris em Agosto de 1944.

No Prólogo, Simone de Beauvoir avisa: “Lancei-me numa aventura imprudente, quando comecei a falar de mim. Começa-se e nunca mais se acaba. “ (…) “No entanto, devo preveni-los que não pretendo dizer tudo” (…) “a minha vida foi estreitamente ligada à de Jean Paul Sartre; mas a sua história espera contá-la ele próprio e deixo-lhe essa tarefa.” E, em nota de rodapé: “Neste livro consenti em omitir; nunca em mentir. Mas é provável que a memória me tenha traído em pequenas coisas…”

O livro está dividido em duas grandes partes; a primeira vai de Setembro de 1929 ao Verão de 1938 e a segunda, desde esse Verão quando a ameaça da guerra era já muito presente até 25 de Agosto de 1944, quando os últimos ocupantes nazis abandonaram a cidade de Paris onde Simone de Beauvoir vivia.

Simone de Beauvoir tem 21 anos, vai viver para Paris onde dá umas aulas que lhe permitem a liberdade de ter um quarto seu. “Quando Sartre voltou a Paris, em meados de Outubro, começou verdadeiramente a minha nova vida” (pág.15). O dinheiro era pouco, liam, iam ao teatro, descobriam o cinema sonoro, discutiam as teorias de Sartre, tinham uma visão idílica sobre a paz, considerando a ascensão das ideias de Hitler “um epifenómeno sem gravidade” (pág.16). O seu ideal de vida era escrever e para este jovem casal “a liberdade era a nossa única regra” (pág.40). Viviam longe da realidade, no entanto, Beauvoir refere numa visita a uma pequena fábrica de tomadas para lâmpadas eléctricas que, ao ver a dureza, insalubridade das condições de trabalho e monotonia das tarefas, que o seu “primeiro encontro com o trabalho foi como um soco no estômago” (pág.53).

As caminhadas solitárias e a descoberta sistemática da região de Marselha, onde é colocada durante um ano, são um deslumbramento para Simone de Beauvoir. Segue-se Rouen, sem os encantos de Marselha, onde vai permanecer durante quatro anos, mas com a vantagem de estar mais próxima de Paris e de Sartre que dá aulas no Havre. Em Espanha, vencem as forças republicanas, mas na Alemanha as ideias de Hitler vão fazendo o seu caminho e na Itália os camisas negras estão cada vez mais presentes nas ruas. No entanto, apesar das perseguições aos judeus na Alemanha, os intelectuais nos quais Beauvoir e Sartre se incluíam encaravam isso com relativa serenidade e tinham uma visão distorcida sobre a situação política. Em finais de 1934, início de 1935 a situação económica deteriora-se, crescem os despedimentos e o desemprego. A xenofobia e as tendências nacionalistas de direita aprofundam-se. É interessante perceber a evolução no pensamento de Simone de Beauvoir que nessa altura só tinha interesse, ao nível da política externa, por o que se passava em Espanha em que as direitas estavam no poder, com a repressão selvática aos operários da Catalunha e das Astúrias. “Uma questão que nessa altura fazia correr muita tinta era o voto das mulheres; no momento das eleições municipais; Marie Vérone e Louise Weiss agitaram-se furiosamente; tinham razão; mas como eu era apolítica e não iria usar dos meus direitos, era-me absolutamente indiferente que nos reconhecessem ou não” (pág.183). O que a movia eram as questões da repressão que se fazia sentir, questiona-se sobre a pena de morte, mas do ponto de vista político a sua postura assim como a de Sartre era de meros espectadores (pág.186). A Frente Popular que introduzira grandes transformações sociais e melhoria na qualidade de vida dos operários franceses entra em declínio; os franquistas avançam em Espanha e Guernica é massacrada; a Grécia vive em ditadura e a pobreza do povo é indisfarçável. Só a URSS se mostrava desejosa de barrar o fascismo, mas “Nunca imagináramos a URSS como um paraíso, mas também nunca tínhamos posto seriamente em questão a construção socialista (…) Não haveria mais nenhum lugar no mundo onde se pudesse alojar a esperança?” (pág.245). As perseguições intensificam-se na Alemanha e a Europa vive uma onda de refugiados que se deslocam e que ninguém quer aceitar.

A Primavera de 1939 marca um ponto de viragem em Beauvoir, que faz um balanço dos seus últimos dez anos numa síntese que encerra a 1ª parte desta autobiografia. “Não é possível assinalar um dia, uma semana, nem mesmo um mês, para a conversão que então se deu em mim. Mas é certo que a Primavera de 1939 marca um corte na minha vida. Renunciei ao individualismo e ao anti-humanismo. Aprendi a solidariedade” (…) “É arbitrário cortar a vida aos bocados. No entanto, o ano de 1929, de que datam, ao mesmo tempo, o fim dos meus estudos, a minha emancipação económica, a saída da casa paterna, a ruptura das antigas amizades e o meu encontro com Sartre, abriu evidentemente para mim uma nova era. Em 1939, a minha existência mudou de uma maneira igualmente radical: a História apanhou-me para não mais me largar; por outro lado, dediquei-me a fundo para sempre à literatura. Encerrava-se uma época. Este período que acabo de contar fez-me passar da juventude à maturidade. Dominaram-me duas preocupações: viver e realizar a minha vocação ainda abstracta de escritor; isto é, encontrar o ponto de inserção da literatura na minha vida.” (pág. 302). “Todavia, ao fazer o balanço destes anos, parece-me que me deram muitíssimo: tantos livros, quadros e cidades, tantos rostos, tantas ideias, emoções e sentimentos! Nem tudo era falso.” (pág. 306)

No Verão de 1938, já com a ameaça iminente da guerra, ainda aproveita a natureza na Provença com Sartre, antes de regressar a Paris. A notícia da conclusão do pacto germano-soviético é o fim de toda e qualquer esperança. Os comboios sobrelotados, a mobilização e a angústia das pessoas são o sinal da viragem. No entanto, há ainda a crença de que a guerra não vai ser longa e que os fascismos vão ser liquidados e que a França e toda a Europa caminharão para o socialismo. É muito interessante o retrato que Beauvoir traça do estado de espírito das pessoas: inquietas, dando palpites, tentando adivinhar o futuro. Ela própria “sentia medo. Não receava por mim; nem por um instante pensei em fugir do País. Tinha receio por Sartre.” (…) ”E uma manhã a coisa aconteceu. Então, na minha solidão e angústia, comecei a escrever um diário. Parece-me mais vivo, mais exacto do que a narrativa que eu pudesse tirar dele.” (pág. 321) Vai então escrever um diário que começa a 1 de Setembro e vai até 14 de Julho do ano seguinte, com alguns períodos intermitentes, ou seja, todo o período em que está afastada de Sartre. Este diário é um retrato/documento vivo do quotidiano da França naquela época. A 1 de Setembro é declarada guerra à Polónia, Sartre é mobilizado para Nancy, as pessoas começam a comprar máscaras de gás, as rotinas alteram-se, os cafés fecham cedo e as boîtes não abrem. “O Flore está fechado. Sento-me na esplanada do Deux Magots e leio Journal, de Gide, de 1914; grande analogia com o momento presente” (pág. 326) Alguns dizem que esta guerra é uma brincadeira. “Durará muito tempo?”, pergunta Simone de Beauvoir. Num passeio pelos campos com Camille, “Voltamos através dos campos e aldeias. É um momento muito comovente e recordo-me do que Sartre me disse em Avinhão, e que é tão verdadeiro: que se pode viver numa grande doçura um presente rodeado de ameaças; não esqueço nada da guerra, da separação, da morte, do futuro bloqueado e no entanto nada pode apagar a ternura e a luminosidade da paisagem; como se fosse invadida por um sentimento que se basta a si próprio, que não pertence a nenhuma história, arrancado à sua própria história, de repente, completamente desinteressado.” (pág. 334). Na entrada de 25 de Outubro do diário, escreve Simone de Beauvoir: “Fernand diz que os jornais estão cheios de mentiras e que a guerra vai ser longa. Já não reajo a estas previsões. Trabalho no meu romance, dou aulas e vivo numa espécie de embrutecimento: nenhum futuro tem realidade.” (pág. 348)

Para se deslocarem, os franceses precisam de salvo-condutos, o que não é fácil de conseguir. As cartas que recebe de Sartre, em parte incerta, são abertas pela censura. Mais tarde, em código, ela consegue perceber que ele está na Alsácia. No PCF há demissões por desacordo com o pacto germano-soviético. Em Maio os alemães invadem a Holanda, a Bélgica e o Luxemburgo e a 4 de Junho a região de Paris é bombardeada. A vida muda radicalmente para Simone de Beauvoir que tem de ficar na cidade por causa da sua profissão. Sente-se enclausurada. Mas, com o avanço das tropas ocupantes, os professores são dispensados e os exames adiados. Paris é o caos, sem gasolina, sem comida para os franceses, mas os alemães pavoneiam-se e culpam os ingleses e os judeus pela situação de penúria que vivem os habitantes da cidade. É nessa altura que Simone de Beauvoir aprende a andar de bicicleta, o que lhe vai ser muito útil e para Sartre nas suas muitas deslocações. A repressão e o peso da ideologia nazi entram no quotidiano das pessoas. As notícias são escassas e deturpadas, alguns amigos começam a vacilar. Outros desaparecem.

Quando Sartre que estivera preso é libertado, quer seguir a política e cria um pequeno grupo – “Socialismo e Liberdade “ – à semelhança de muitos que existiam, que ajude à resistência aos ocupantes e colaboracionistas. O “trio” que Simone, Sartre e Olga constituíram antes da guerra, é agora alargado, como se fossem uma “família”. Partilham o pouco que têm, apoiam-se nas dificuldades que são cada vez maiores, a informação é escassa, os avanços das forças inglesas andam a par das execuções, das prisões e dos envios das pessoas para os campos de concentração, embora nessa altura ainda pouco se soubesse sobre os campos de concentração, as resistências organizam-se, mas há que estar atento aos delatores. Em contraponto ao ambiente hostil da ocupação e da guerra, à rudeza do frio e da fome, este grupo de intelectuais – Camus, Dullin, Picasso, Dora Marr, os Leiris, Éluard, Malraux … – fazia do Flore a sua casa e alimentava a sua amizade com a alegria de viver o momento e de aproveitar ao máximo o facto de estarem vivos. Tinham grandes projectos para o futuro e antecipavam o que fariam no pós-guerra. Sartre cria textos para peças de teatro, Simone trabalha no segundo romance e o seu reconhecimento como escritora surge quando finalmente “A Convidada”, o seu primeiro romance é editado e sobre ele são escritas críticas em jornais de referência. Simone de Beauvoir era finalmente reconhecida como escritora, ganha notoriedade e esse reconhecimento dá-lhe grande satisfação pessoal.

Como referi anteriormente, a parte final de “A Força da Idade” é o retrato dos dias que antecederam a vitória sobre o ocupante nazi e que foi sentida antecipadamente pela “família” que há tanto tempo a desejava. A Libertação não foi conseguida sem muito sofrimento e sem que o terror estivesse presente até ao fim. Simone de Beauvoir faz também aqui um balanço, uma reflexão sobre a guerra e o peso que ela irá transportar para a sua vida do pós-guerra e que não mais se apagará. Dos muitos amigos e amigas que vão surgindo ao longo das mais de quinhentas páginas, ela destaca o jovem Bourla cuja morte lhe é insuportável

Para além da minúcia e detalhe usados ao longo de todo o livro na descrição das paisagens e percursos que fazem ela e Sartre em toda a França, mas também noutros países como a Espanha, a Itália ou a Grécia; Simone de Beauvoir como observadora de tudo o que a rodeia é exaustiva na caracterização daqueles que lhe estão mais próximos e, de forma muito particular, partilha nas suas memórias a importância da literatura na sua vida “a literatura tornou-se-me tão necessária como o ar que respirava” (pág. 509); as dúvidas e inseguranças em todo o processo criativo, os elementos usados na construção de “L’Invitée”, mas também de “Le Sang des Autres” e “Tous les Hommes sont Mortels”, o que acho de grande interesse para quem estudar estas três primeiras obras da autora, na medida em que estão intrinsecamente ligadas à sua vivência e às pessoas que fizeram parte dos seus relacionamentos mais íntimos.

Por fim e assumindo que muitíssimo mais poderia dizer sobre este livro, não posso deixar de aqui transcrever um parágrafo que surge na parte final do livro, que reflecte as preocupações desta professora, filósofa, feminista, fundamental para o pensamento do feminismo e das feministas. A propósito do seu círculo de amigos, intelectuais quase todos oriundos do surrealismo, escreve Beauvoir: “ Tirei ainda um outro proveito dessa intimidade. Conhecia poucas mulheres da minha idade e nenhuma que levasse uma vida clássica de casada; os problemas de Stépha, Camille, Louise Perron, Colette Audry e os meus eram, na minha opinião, individuais e não generalizados. Em muitos pontos, compreendera quanto, antes da guerra, pecara por abstracção: sabia agora que não era indiferente ser judeu ou ariano; mas não me tinha apercebido de que houvesse uma condição feminina. Subitamente, encontrei um grande número de mulheres que tinham ultrapassado os quarenta e que, através da diversidade das suas possibilidades e méritos, haviam tido uma experiência idêntica: tinham vivido como «seres relativos». Como eu escrevia, como a minha situação era diferente da delas, e também, penso eu, como sabia escutar, disseram-me muita coisa; comecei a dar conta das dificuldades, das aparentes facilidades, dos logros e dos obstáculos que a maioria das mulheres encontra pelo caminho; senti também que, naquela medida, eram simultaneamente diminuídas e enriquecidas. Não dava ainda muita importância a um assunto que só indirectamente me dizia respeito, mas a minha atenção foi despertada.” (pág. 481)

10 de Julho de 2022

Almerinda Bento