Gosta deste blog? Então siga-me...

Também estamos no Facebook e Twitter

domingo, 19 de abril de 2020

Ao Domingo com... Nuno Franco Pires

Escrevo-vos desde o Alentejo. Sou dos que acredita que a paisagem nos molda o caráter, o sentir e o viver. Na escrita encontro a forma de me exprimir, emitir opiniões, manifestar sentimentos, libertar sonhos e frustrações numa espécie de catarse.

Em dezembro de 2014 publiquei o meu primeiro romance, “Searas ao vento”, aliando duas paixões: a escrita e a genealogia. Tornei personagens os meus antepassados , obreiros anónimos do Alentejo que conhecemos, e as suas histórias de superação e luta foram o enredo, imortalizado como forma de homenagem pelo que foram e pelo que me transmitiram.

Saber-me lido foi simultaneamente assustador e gratificante. Saber as minhas histórias e os meus personagens comentados por outros pareceu-me estranho, mas ao mesmo tempo muito agradável. Era finalmente possível falar deles em voz alta, depois de um diálogo mudo que há muito travava comigo mesmo.

Quis repetir a experiência, mas sucumbi à angústia do segundo romance. Foi-me difícil construir uma história que me apaixonasse outra vez. Ao fim de quase cinco anos aconteceu.

“Um dia a aldeia acabou” é o meu segundo livro, um grito de alerta para a realidade das aldeias do interior, envelhecidas e desertificadas, a clamar por futuro. O vírus que veio da China trocou-me as voltas, deixou-o em suspenso por tempo indeterminado. Não teve direito a apresentação formal com a presença de familiares e amigos, nem a abraços e outras manifestações de afeto. O dia chegará, tenho
a certeza.

Até lá fico em casa, como compete, a organizar ideias, estruturar novos projetos e a deixar que as emoções do momento sejam fonte de inspiração – as maiores provações inspiram os autores, é na dor e na angústia que encontram o expoente máximo da criatividade.

Resta-nos esperar que termos como “curva epidemiológica”, “confinamento” ou “isolamento social” voltem ao dicionário de onde nunca deviam ter saído e a normalidade seja restabelecida.

Cuidem-se e cuidem dos vossos. Que nunca acabe a aldeia que guardamos em nós.

Nuno Franco Pires

11 de abril de 2020

1 comentário:

  1. Gosto muito do Alentejo (vivi em Beja 5 anos). Quanto às aldeias, é uma pena o abandono a que assistimos. Lembro-me de 2 aldeias que visitei no norte do país. Uma já sem população e a outra (quando lá fui há vários anos) só com um casal idoso. Fiquei curiosa com os dois livros.

    ResponderEliminar