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terça-feira, 9 de julho de 2019

"A Holandesa" de Ellen Keith

Quando soube da existência deste livro, pensei que seria, provavelmente, uma leitura de que iria gostar. Mais uma sobre este tema pelo qual tenho particular interesse: o Holocausto. Assim parecia. Fiquei presa logo no primeiro parágrafo: Marijke e seu marido, Théo, vivem em Amesterdão, ano de 1943. São holandeses e não são judeus. Pertencem à Resistência. A história continua como seria de esperar. Apanhados, são detidos e levados para um campo de concentração. 

Alguns capítulos depois uma nova história surge. Desta feita passada em 1977 em Buenos Aires, Argentina. Periodo conturbado, ditadura militar instalada. "Nos anos do autodenominado "Processo de Reorganização Nacional" (1976-1983), a ditadura argentina formada pela junta militar impulsionou a persecução, o sequestro e o assassinato de maneira segreta de pessoas por motivos políticos e religiosos no quadro da que é conhecida como Guerra suja na Argentina. A razão de que um Estado totalitário recorra a este método é o efeito da supressão de todo direito: a não existência de corpo do delito garante a impunidade, o desconhecimento impede os familiares e a sociedade realizar ações legais, infunde terror nas vítimas e na sociedade, e mantém divididos os cidadãos frente ao Estado. O "desaparecimento" de pessoas gera uma situação de agravamento da repressão e as feridas, devido às dificuldades para os familiares de "dar por mortos" os seus seres queridos, e eventualmente dar por finalizada a procura dos seus restos e a pesquisa do que realmente aconteceu.(...) Os "voos da morte" foram uma atroz prática da Guerra suja na Argentina, durante o chamado "Processo de Reorganização Nacional" (1976-1983). Mediante os "voos da morte" milhares de detidos-desaparecidos foram atirados ao mar vivos e drogados, de aviões militares. Estima-se que os voos vitimaram 4 mil pessoas." (Retirado de wikipédia)

Surpreendeu-me esta leitura. Diferente, muitas vezes demolidora, este livro constituiu para mim uma forte aprendizagem, possuindo factos sobre as duas épocas que desconhecia por completo: a existência de bordéis para alguns prisioneiros que se destacassem e fossem merecedores de alguma recompensa e a extrema dureza dos interrogatórios e torturas infligidas a pessoas na Argentina que discordassem politicamente do regime e ainda o seu desaparecimento. Pesquisar sobre esses assuntos foi uma consequência desta leitura! 

A riqueza dos personagens principais de ambas as histórias é fabulosa. Os seus sentimentos são aprofundados ao máximo. As suas dúvidas, os seus medos, são expostos de uma forma que toca quem lê. São personagens muito fortes porque imperfeitas, cheias de contradições, muitas delas criadas pela guerra em si. Que ligação possuem estas duas histórias separadas por trinta e tal anos? Deixem que vos diga que essa ligação é muito subtil, e as histórias correm em paralelo sem que haja elementos aparentes que as liguem. Este facto intriga o leitor e torna-se um elemento de suspense no livro.

Esta obra não retrata duas histórias felizes. A História tem-nos mostrado que essas são as mais comuns. As histórias de muitos desconhecidos que sofreram às mãos de homens sem escrúpulos, ligados a ideologias de esquerda ou de direita que manobraram a vida e a morte de milhares de pessoas como se fossem deuses (ou diabos).

Adorei e recomendo. Qualquer das duas histórias é baseada em factos verídicos, constituindo um murro para estômagos delicados. Preparem-se! O sub-título é bem verdade: "Em tempo de guerra somos capazes de tudo". 

Terminado em 7 de julho de 2019

Estrelas: 6*

Sinopse
Amesterdão, maio de 1943. Ao mesmo tempo que as túlipas florescem, os nazis intensificam a opressão à cidade ocupada e os últimos sinais da resistência holandesa vão sendo eliminados. Marijke de Graaf e o marido são detidos e deportados separadamente para campos de concentração na Alemanha. Em Buchenwald, Marijke é confrontada com uma escolha impiedosa: sujeitar-se aos cruéis trabalhos forçados impostos aos prisioneiros ou, numa tentativa de sobrevivência, tornar-se prostituta no bordel do campo.

Do outro lado do arame farpado, Karl Müller, oficial das SS, espera alcançar a glória militar que o seu pai acalenta. Porém, o encontro com Marijke muda radicalmente o seu destino.

Buenos Aires, 1977. Está-se em plena Guerra Suja, num cenário de repressão implacável sobre os dissidentes do regime que vigora então na Argentina. Luciano Wagner está detido numa cela, sem esperança de algum dia escapar ao cativeiro político.

Da Holanda à Alemanha, até à Argentina, a Holandesa é um romance soberbo que narra a história de três pessoas que partilham um segredo sombrio e que faz um relato impressionante de dois dos regimes mais violentos e repressivos da história moderna.

Um livro que fala de amor, da ténue linha entre o bem e o mal, e da resiliência de pessoas comuns para perseverarem e fazerem o impensável em circunstâncias insólitas.

Cris

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