Já tinha lido algumas páginas quando, de repente, voltei a trás. Reli tudo de novo, como se não o tivesse feito antes. Às vezes não estou preparada para determinada escrita e chego ao fim da página com a sensação que perdi algo da leitura acabada de fazer. E então, ou largo o livro, irritada, ou volto ao princípio. Neste caso voltei e ainda bem.
E por falar de "princípio" uma das coisas que gostei neste livro foi a alternãncia que a autora usou para nos fazer saltar nos anos, nos acontecimentos, tornando a história (e seus pormenores) mais cativante. Assim, o princípio e o final entrecruzam-se, sempre com a autora a introduzir pequenas/grandes surpresas. O fio condutor mantém-se sempre o que fez com que isso não prejudicasse em nada a minha leitura.
O narrador omnisciente vai, de quando em vez, deitando uns pózinhos contendo a sua opinião e isso é feito com uma mestria que me encantou. A escrita não é escorreita nem ligeira mas apreciei muitíssimo esse facto. Palavras "novas", desconhecidas para mim, enriqueceram o meu vocabulário e, contudo, não me fizeram andar perdida na leitura, facto que me fez acreditar que Isabel Rio Novo tem uma escrita especial. Encantadora. Estranhei no início mas entranhei-a depressa após algumas páginas!
Mas, voltando à minha linha de pensamento, e como estava eu a dizer, a dada altura voltei à primeira página. Muitas personagens femininas, muitas "Marias", fizeram-me tomar nota mentalmente de quem era quem para que a confusão não se instalasse de novo. E aí sim, a história "pegou-me".
Porto, século XIX. Um português regressa do Brasil com uma fortuna considerável. Está doente, vem morrer onde nasceu. Cá tinha deixado uma filha bastarda que, de um momento para o outro, se vê a braços com novas condutas de vida, novos saberes que teimam em ensinar-lhe. Um marido, por qual ela se apaixona perdidamente, vem completar as suas novas incumbências de "menina rica". E a história estaria encaminhada para um final feliz, se a paixão por ela sentida fosse correspondida... Está lançado o mote para uma história onde aspectos macabros apimentam sabiamente este romance.
Digo-vos: ultrapassem as dificuldades que possam vir a ter com as frases e descrições longas e peguem neste livro. Uma leitura que deve ser atenta aos pormenores. Parabéns Isabel!
Terminado em 23 de Abril de 2016
Estrelas: 5*
Sinopse
Inverno de 1864. Sentindo a morte a aproximar-se, Miguel Augusto regressa do Brasil, onde enriqueceu, e instala-se no velho burgo nortenho, no palacete conhecido como Casa das Camélias, com a intenção de perfilhar Teresa Baldaia e torná-la sua herdeira. No mesmo ano, Nicolau Sommersen pensa em fazer um bom casamento, não só para recuperar o património familiar que o tempo foi esfarelando, mas sobretudo para fugir à paixão que sente por Maria Adelaide Clarange, senhora casada e mãe de três filhos. Maria Ema Antunes, prima de Nicolau e governanta da Casa das Camélias, hábil e amargurada com a sua vida, urdirá entre todos uma teia de crimes, segredos e vinganças.
Subvertendo as estratégias da narrativa histórica, com saltos cronológicos que deixam o leitor em suspenso mesmo até ao final, Rio do Esquecimento descreve com saboroso detalhe a sociedade portuense de Oitocentos e assinala o regresso à ficção portuguesa de uma escrita elegante que consegue tornar transparente a sua insuspeitada espessura.
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