Alessandro De Angelis é cientista, professor em Pádua e Lisboa e escreveu, entre outros, ensaios sobre a obra de Galileu. Este “Galileu em Pádua” conta “em forma romanceada os dezoito anos passados por Galileu em Pádua”, aqueles que Galileu considerou “os dezoito melhores anos da minha vida”. Na Premissa do livro, o autor revela que consultou vasta documentação e, sobretudo, correspondência que Galileu recebeu e que guardou, sendo o resultado um trabalho rigoroso do ponto de vista histórico, com personagens que existiram, embora o autor tenha feito “suposições – tanto quanto possível plausíveis – no que respeita à esfera das relações pessoais, das quais Galileu fala com parcimónia.” Com tradução de Bárbara Villalobos, este livro tem revisão científica de Carlos Fiolhais.
Galileu viera de Pisa onde foi leitor. Em Pádua onde chegou em 1592 com 28 anos, era já um homem com muita fama tendo sido escolhido para a cátedra de Matemática. A sua aula inaugural foi um sucesso e ao longo dos 18 anos na Universidade de Pádua, as suas aulas vão ser seguidas por alunos juristas e de outras disciplinas, impressionados pelo seu saber e pela capacidade de manter a atenção e o interesse. O ordenado era reduzido e Galileu precisava consolidar prestígio e reconhecimento, pois precisava de ganhar dinheiro para fazer face às dívidas contraídas pela família com o dote da sua irmã mais velha.
Galileu viveu numa época em que fervilhava o pensamento novo, o espírito de descoberta e da procura de respostas a fenómenos ainda não explicados. A teoria de Ptolomeu de a Terra ser o centro do Universo tinha começado a ser posta em causa cinquenta anos antes pela teoria heliocêntrica de Copérnico que antevira a rotação da Terra e por outros homens da ciência como Kepler, mas estas ideias circulavam através da troca de correspondência, ainda sem serem publicadas ou divulgadas abertamente, pois punham em causa a doutrina da Igreja. Através do Tribunal do Santo Ofício, a Igreja exercia o seu poder pelo terror e pela influência que tinha sobre a chusma ignorante. Giordano Bruno tinha sido queimado vivo e o amigo frei Tommaso Campanella foi preso por heresia e só conseguiu escapar à morte porque se fez passar por louco. Galileu apaixonado pela geometria, pela mecânica, pela observação das marés e pela astronomia, observa, partilha ideias, questiona, constrói instrumentos como o “compasso geométrico e militar” e mais tarde o “cannocchiale” que vai aperfeiçoar cada vez mais com ajuda dos vidreiros venezianos, e lhe vai permitir observar a Lua, as estrelas, a Via Láctea, Saturno e os seus satélites.
Num ambiente de rivalidade entre o doge da república veneziana, o papado de Roma e o ducado da Toscana, Galileu é denunciado ao Santo Ofício porque “em vez de santificar a fé, se dedica à libertinagem e à fornicação, e acrescente-se que pratica horóscopos e exercita a arte da divinação.” (pág. 160). No entanto, devido à intervenção de Venier, reitor da Universidade de Pádua, não foi dado seguimento para Roma à denúncia feita pelo amanuense de Galileu. O destaque que Galileu dá aos Médici e ao príncipe Cosme, ou seja, a Florença, através dos louvores e da dedicatória sobre as “Estrelas Mediceias” gera um afastamento de alguns dos seus grandes amigos e companheiros, que lamentam a ingratidão demonstrada por Galileu quando dedica a publicação desta tão importante descoberta a Florença e se esquece de Pádua e do doge de Veneza que sempre lhe deram todo o apoio ao longo daqueles 18 anos.
Foram anos de trabalho aturado na preparação das suas aulas, de acompanhamento dos seus alunos, de descobertas e teorização, de grandes amizades com Sagredo e Venier, de cumplicidades, de mulheres, de afamados vinhos italianos que terminaram repentinamente. Foi também em Pádua que teve duas filhas e um filho do seu relacionamento com uma jovem que conhecera em Veneza e com a qual nunca casou. Galileu prepara a sua despedida de Pádua, a que nunca mais voltará, regressando à sua Toscana natal.
Este livro é só sobre “os dezoito melhores anos” dos 77 anos de vida de Galileu Galilei, conhecido pela defesa da teoria heliocêntrica até ao fim dos seus dias, nunca se retratando como a Inquisição queria.
16 de Julho de 2023
Almerinda Bento
Parece ser um livro muito interessante. Obrigada pela partilha.
ResponderEliminarSim, é bem interessante. Almerinda
EliminarMuito bem :)
ResponderEliminar.
Beijos e uma boa semana.