Todos devemos ser Feministas e o conto Casamenteiros
Chimamanda Ngozi
Adichie
2012, 2014
À medida que ia lendo este livrinho
da escritora nigeriana, mais forte se tornou a minha convicção de que são estes
livros simples, mas tremendamente eficazes que podem ser o clique que vai
ajudar os/as jovens a questionarem e a questionar-se acerca de muitas ideias
preconcebidas que lhes são inculcadas desde o berço. Um livrinho magnífico, uma
excelente prenda, um magnífico ponto de partida para uma conversa sobre o que é
ser feminista, ou sobre o patriarcado, ou como os estereótipos condicionam a
nossa forma de ver o mundo!
E o livro é eficaz porque com uma
linguagem simples e partindo de exemplos da sua vida enquanto mulher,
Chimamanda nos convida a ter uma perspectiva crítica sobre o que nos é
“servido” como natural e normal. Não apenas na sociedade nigeriana ou nas culturas
africanas, mas a nível global. Quando para alguns, feminista pode vagamente ser
o mesmo que apoiante do terrorismo, a verdade é que para muitos/as a palavra
está ainda dentro da categoria das palavras malditas, percepcionada como
atributo de mulheres infelizes, que odeiam homens, que não gostam de se
arranjar e estão sempre zangadas e sem sentido de humor! Ao longo de umas
poucas páginas, a autora desmonta o mito de que hoje as mulheres já têm tudo o
que querem. Porque elas continuam a ganhar menos do que eles, mesmo quando têm
as mesmas habilitações; elas não podem aceder a certos espaços sem serem
acompanhadas por um homem sob pena de serem molestadas ou humilhadas; elas são
educadas a serem submissas, não serem demasiado ambiciosas, não serem duras,
controlarem os seus impulsos, ao contrário dos rapazes que a sociedade quer
afirmativos, ambiciosos, duros, impulsivos. Ela questiona exactamente essa
educação que é nociva para elas e também para eles, porque lhes rouba, a todos
e todas, a capacidade de ver e agir no mundo de forma plena e inclusiva. E Chimamanda
não deixa também de mencionar quem se posiciona contra o feminismo e as
feministas, invocando os argumentos da biologia, da cultura, ou da classe. E é
clara relativamente aos/às que consideram não ser necessário usar a palavra
feminista, quando se é a favor dos direitos humanos! “Porque seria desonesto. O feminismo faz, obviamente, parte dos direitos
humanos de uma forma geral – mas escolher uma expressão vaga como direitos
humanos é negar a especificidade e particularidade do problema de género. Seria
uma maneira de fingir que as mulheres não foram excluídas ao longo dos séculos.
Seria negar que a questão de género tem como alvo as mulheres”.
“Casamenteiros” é um conto
extraído da colectânea “A Coisa à volta do teu Pescoço”. É um pequeno conto que
questiona a aculturação a que é forçada a jovem Chinaza, vinda de Lagos depois
do casamento que os tios lhe arranjaram com um conterrâneo, médico interno em
Nova Iorque. A ideia de ir viver num paraíso – a América, uma casa, um marido
médico com uma boa situação, um casamento feliz – tudo isso se vai desmoronar
no contacto com a realidade. Afinal o que lhe é apresentado é que se apague
como africana, como mulher, como estrangeira, como diferente e passe a
tornar-se igual aos outros da grande metrópole civilizada, para se tornar parte
dessa massa homogénea e sem alma. E para isso, a metamorfose terá de ser total,
mudando o nome, os hábitos, a cultura, os modos de falar e de estar, a comida,
a língua!
Nia, a vizinha com quem ela se
abre, a única pessoa que afinal ela tem naquele mundo estranho pergunta-lhe:
“ – Tu nunca dizes o nome dele, nunca dizes Dave. É uma questão cultural?
“ – Tu nunca dizes o nome dele, nunca dizes Dave. É uma questão cultural?
– Não – disse eu. Olhei para baixo, para o individual de tecido
impermeável. Apetecia-me dizer que era porque não sabia o seu nome, porque não
o conhecia.”
Julho de 2018
Almerinda Bento
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