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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

“Meus Desacontecimentos” de Eliane Brum

Há momentos bons dentro das páginas deste livro, pedaços de escrita com que nos revemos, nós os apaixonados pela leitura! Começo logo com este excerto lido nas primeiras páginas: “Pressenti algo que só racionalizaria muitos anos depois: o poder da história contada” Pág. 27

Da história contada e da leitura à escrita foi uma descoberta que a autora brasileira, jornalista e repórter premiada, nos revela neste relato íntimo, introspetivo. A história da sua vida com as palavras. Não-ficção, portanto.

“Hoje, ao lançar meus anzóis no lago nebuloso do passado, em busca de um mapa cujo único destino sou eu, percebo que escrever me salvou de tantas maneiras e também desta. Desde pequena eu tenho muita raiva – e quase nenhuma resignação. A reportagem me deu a chance de causar incêndios sem fogo e espernear contra as injustiças do mundo sem ir para a cadeia. Escrevo para não morrer, mas escrevo também para não matar.” Pág. 61

E esta pequena maravilha? Referindo-se à pessoa que a fez descobrir os livros: “Só Lili sabia que os livros não eram objetos, eram portais.” Pág91

Para além deste aspecto que me encantou, embrenhamo-nos numa narrativa algo dispersa pelo seu passado mas que nos agarra. Não achei uma leitura corrida, tampouco devia ser esse o objetivo da autora, pelo que nos traz um texto que impõe reflexão ao leitor. A dor e a perda de voltar atrás e relembrar. Mas também um sentimento bom ao fazê-lo.

Gostei e recomendo.

Terminado em 2 de Janeiro de 2025

Estrelas: 5*

Sinopse
«Lembro que, quando tudo começou, era escuro. E hoje, depois de todos esses anos de labirinto, todos esses anos em que avanço pela neblina empunhando a caneta adiante do meu peito, percebo que o escuro era uma ausência. Uma ausência de palavras. Essa escuridão é minha pré-história. Eu antes da história, eu antes das palavras. Eu caos.»

Era uma vez uma menina que parecia estar sempre a piscar o olho à morte. Essa menina revela, neste livro, como foi resgatada pela escrita. A cada página, desfilam, vivíssimos, lugares e personagens fantasmáticos, que pertencem ao imaginário coletivo ou a um álbum de família: a «casa-túmulo»; a praça da cidade pequena; a irmã morta, que é afinal a mais viva entre todos; a mãe, despovoada de alegria; o pai, filtrado pela sombra de peripécias domésticas e de um país amordaçado; a avó, comedida em tudo menos na imaginação; as tias, transformadas em flores para não murcharem.

Meus desacontecimentos marca a estreia em Portugal de uma escritora singular e multipremiada, que aqui regista a história da sua vida com as palavras: um relato delicado, impressivo e inquietante sobre como nos tornamos quem somos a partir da língua, da escrita, da memória. Neste itinerário de dentro para dentro, afiadíssimo e despudorado, Eliane Brum conta como se tornou uma narrativa de si, conduzindo o leitor numa viagem encantatória.

Cris


1 comentário: