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domingo, 15 de julho de 2012

Ao Domingo com... Patrícia Reis

"Há uma fotografia a preto e branco onde se vê uma menina, despida, cabelos escorridos, sentada na cama com uma almofada em cima das pernas, um lápis na mão, um caderno aberto. Sou eu. Tinha sete ou oito anos. Continuo a escrever assim: na cama, com o computador pousado nas pernas, música de fundo. Não escrevo todos os dias. Escrevo mentalmente. Recolho pedaços, sou como os homens do lixo, e depois, num repente, estou em cima da cama e tenho sete ou oito anos outra vez. Não me lembro de mim sem escrever ou sem ler.

Na mesa de cabeceira estão sete livros. Estão sempre sete. É uma superstição idiota, um tique, uma mania. Pouco importa. Poesia misturada com romances e ensaios e biografias. Leio de tudo. Só escrevo quando posso. Os dedos no computador, a correr, sem rever nada, a pensar mais rápido do que consigo escrever, sem voltar atrás, num estado de emergência que me afasta de tudo, do mundo, dos outros, dos ruídos.

Nunca quis ser outra coisa: uma pessoa que escreve. Não digo que sou escritora, digo sempre que sou jornalista, a profissão que exerci e ainda exerço pontualmente. Não releio os meus livros quando saem, não me apetece comprar os jornais para saber das críticas e tenho pavor de lançamentos. Os livros já não são meus. Entrego um manuscrito e preciso de partir para outra frente qualquer. Começar logo outra história. O processo de publicação de um livro demora e, por isso, quando o livro surge eu já tenho a cabeça numa outra história e há pormenores que não me ocorrem. Há, por outro lado, personagens que não me largam, como Manuel Guerra de No Silêncio de Deus ou Eduardo de Por Este Mundo Acima.

Hoje não escrevo. Fui a uma feira com o meu marido, comprámos alheiras e pão caseiro. Vimos um filme e ele sofre pela selecção nacional enquanto escrevo estas linhas. É preciso dar de comer ao cão e ter uma vida. Ninguém é escritor se não tiver uma vida. Isso é uma das poucas certezas que tenho. É preciso viver e aprender a escutar os outros. Como o mercado editorial é pequeno, convém ainda não ter expectativas, fazer o melhor que se pode e seguir em frente. Escrever é um risco, uma exposição, um acto de coragem. É o nosso suor, a nossa cabeça, a nossa pele e, muitas vezes, pode ser mal interpretada e criar mágoa. Viver sem escrever? Não sei. Sem ler sei que não consigo."

Patrícia Reis

2 comentários:

  1. Descobri há pouco tempo esta autora. Ando numa de tentar ler os seus livros. Adorei a maneira como escreve.

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  2. Se gostar tanto dos livros da Patricia como gostei desta breve "conversa", então ganhou uma nova fã! Adorei...
    Teresa Carvalho

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