Existem até muitas frases perfeitas, daquelas que nos causam um tumulto bom.
Existem histórias que nos tiram o sono e nos levam ao colo.
Existem poemas que são catedrais que esmagam a nossa pequenez.
E existem pessoas, como eu, que andam toda a vida em busca de uma frase perfeita, da história e do poema tumultuoso.
Era Outono e teria uns 8 anos quando esperava pelo autocarro na Avª Alexandre Herculano junto dos meus pais. Olhei para o chão e vi algumas folhas de tom outonal que gostava de ouvir estalar sob os meus pés como biscoitos crocantes. Naquele dia poupei-as e escrevi sobre elas o meu primeiro texto poético. Desde então nunca mais deixei as histórias. Surgem-me muitos enredos quando ando na rua ou me deito à noite e a maior parte das vezes não as consigo recuperar. Perdem-se na traição do esquecimento.
Não gosto de escrever à mão e o computador veio facilitar muito a tarefa. A mão não acompanha a velocidade do pensamento e a caligrafia que nunca foi aceitável tornar-se-ia indecifrável. Não gosto de horários. Escrevo normalmente quando concluo a parte chata do dia. Escrevo quando me apetece e algumas vezes quando não me apetece. Escrevo porque tenho a ideia tola de ser lida e que alguém tenha vontade de voltar a página e continuar a ler.
Para o livro “um dia o dia não se repete”, editado pela Modocromia em 2014, seleccionei 20 contos e convidei uma amiga a recontar algumas destas histórias através da ilustração e o resultado foi absolutamente extraordinário.
Nos meus contos a memória dos dias que estão em nós mas deles tendemos a não lembrar, os pormenores das rotinas que fatalmente nos escapam e que desejamos mais tarde resgatar, a presença dos animais não humanos, o desnudar o insólito e a incursão por caminhos do fantástico, eis as marcas de água que atravessam as minhas histórias.
Como escreveu o João Lima no seu prefácio julgo que este é “um objecto de memórias. Como se fosse um baú. Uma caixa atada com cordel do tempo das mercearias e do papel canelado para levar para casa quase como sendo o mais precioso dos embrulhos. Uma arca de sussurros.”
Paula Timóteo
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