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terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

A Convidada Escolhe: "Luanda, Lisboa, Paraíso"


Luanda, Lisboa, Paraíso
Djamilia Pereira de Almeida
2018
A belíssima capa deste livro, o título e uma sessão em qua Djaimilia Pereira de Almeida falou sobre a sua obra foram os “ingredientes” que me atraíram para comprar “Luanda Lisboa Paraíso”. A doçura da voz e a riqueza do discurso da jovem autora angolana nesta sessão moderada por Anabela Mota Ribeiro fui encontrá-las ao longo das pouco mais de duzentas páginas do livro.
Um livro muito belo, cheio de subtilezas, de figuras de estilo na sua prosa poética. Uma história com vidas tristes, sofridas, com muitos silêncios ou com palavras que não são ditas, onde a esperança e o sonho persistem, mesmo quando a pobreza, a solidão e o desenraizamento são a marca de que é feita a vida das personagens.
Cartola e Aquiles partem de Luanda a caminho de Lisboa para um tratamento a um defeito de nascença no calcanhar de Aquiles. Lisboa é a terra com que o pai Cartola sonha, imaginada em livros, mapas e postais; para Aquiles, o filho, é terra de salvação de um defeito que carregava, colado ao nome e com o qual era alcunhado de “o coxo” ou o “Botinha” entre os colegas da escola. Desde o início que tudo aponta que será uma viagem só de ida o que é percepcionado por Glória, a mãe, paralisada e esquecida numa cama, lembrando Samsa, o insecto de “A Metamorfose” de Kafka. “Glória fechou os olhos, apertou a camisa de noite contra o peito e disse em voz alta «até amanhã, Papá» sem se permitir soltar uma lágrima, mas pressentindo também que vira o marido pela última vez.”
Lisboa é afinal uma terra onde pai e filho andam à deriva, sentindo-se estrangeiros, perdidos. A fragilidade de Cartola “caminhava sem referências” é sentida pelo filho que o acha mais pequeno, menos firme, mais envelhecido. Pai e filho pouco comunicam, cada um encerrado no seu mundo, frustrados os seus sonhos de um futuro melhor. Para Cartola, perdido numa Lisboa estranha que o enjeitava, era no cemitério dos Prazeres que encontrava o sítio onde se sentia entre iguais. Nas cartas e nos telefonemas a Glória, Cartola fantasia em palavras os sonhos que não consegue concretizar, são a idealização de um sonho impossível. Em Luanda, a escassez, a pobreza e a guerra civil são mascarados com palavras doces e pedidos simples que Glória faz ao marido, projectando num futuro risonho as memórias de tempos felizes quando eram jovens.
A Quinta do Paraíso, a caminho de Caneças é a saída possível depois de uma história de pagamentos em atraso e dívidas na pensão Covilhã. As viagens diárias do bairro para a obra são as rotinas de Cartola para quem a dureza do trabalho o faz sentir cada vez mais velho e onde Aquiles é “o coxo da obra” ou “o preto coxo”. Paraíso, mas podia ser a Jamaica, é o lugar onde diariamente se descansa o corpo depois da jornada de trabalho dura na obra. As dores do corpo são mitigadas por uma refeição melhorada quando ainda há dinheiro, ou por uma conversa à volta duma fogueira, pautada por umas anedotas e lembranças da terra longínqua, ou pela rifa do cabaz de Natal que saiu a Cartola. O vizinho Pepe, o taberneiro galego vai ser a amizade que vai nascer na relação entre duas solidões. E que se vai reforçar quando ambos constróem a barraca que ardeu numa noite. A construção da “nossa casinha”, como lhe chamam, passa a ser o objectivo que vai dar sentido às suas vidas e motivar os mais novos – Aquiles, Amândio e Iuri.
Achei este livro tão lindo, tão dramático, tão sentido, para nos dar a entender melhor a vida de tantos cidadãos imigrantes que um dia acreditaram num paraíso em Portugal ou na Europa, que foram obrigados a fugir da fome ou duma guerra civil sem sentido, que aqui vieram procurar respostas para uma saúde que não dispõem nos seus países.
Com a força das palavras que Djaimilia consegue manejar com tanta mestria e sensibilidade.
9 de Fevereiro de 2019
Almerinda Bento











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