A recente morte de Baptista-Bastos no passado mês de Maio levou-me a ler este seu livro ainda não lido, numa edição do Círculo de Leitores de 1993. Conhecia muitos dos seus escritos enquanto jornalista e a sua escrita que muito apreciava era frequente em manuais escolares de Língua Portuguesa, mas este livro continuava à espera do seu dia, na minha estante.
Esta edição do Círculo de Leitores começa com uma carta para um Círculo de Amigos. Nela dá conta que começou a escrevê-lo em Agosto de 1968 numa tarde quente em Montes da Senhora, uma aldeia beirã, “despovoada de gente nova que emigrara e onde os velhos, estáticos e extáticos, pareciam incrustrados num retábulo…”. Como BB diz, as dez páginas iniciais demoraram perto de seis meses e foram escritas e reescritas por oito vezes. Só em 1972, em Sesimbra, deu o romance por concluído, tendo sido editado em Fevereiro de 1974 e esgotando duas edições até Abril do mesmo ano. Como a certa altura confessa “É um dos meus livros que mais amo.”
O romance começa com o anúncio da guerra pelo avô do narrador. Que guerra? Desde logo se percebe que o narrador – o Manel – tem no avô materno a figura de referência e aquele momento do avô, sentado sobre as raízes expostas do grande carvalho junto ao palácio real, uma imagem recorrente da sua infância que irá recordar ao longo da vida. As diversas pessoas que constituem a sua família irão sendo apresentadas tendo em conta a valoração e apreciação que os olhos dum menino em crescimento fazem, sem esquecer o papel que têm os mais influentes e próximos naquilo que designamos por educação. O avô tinha o valor da dignidade como valor fundamental nos humanos o que o levava a gostar mais do genro do que do filho. Daí que, quando o avô faleceu o Manel comentou com o primo Mudo: “O nosso avô, lembras-te? O nosso avô era um cão velho entre flores. As flores é a valentia. Um homem deixa de ser um homem quando perde a valentia”.
Todo o texto é sobre a solidão. Pela perda da mãe, pelo afastamento da família, pelo abandono e desinteresse do pai, pelas mentiras, pelos passeios prometidos e não feitos ao Jardim Colonial, pelos silêncios, pelas bebedeiras, pelas prostitutas. Essa solidão, essa tristeza percorre todas as personagens. E no final, quando a família se “reencontra” na casa dos tios e do Mudo para resolver um assunto de família – a intenção de pôr a velha avó no asilo – e a tia anuncia “Amanhã vai para o asilo e a gente, volta e meia, vai lá vê-la” ao contrário da cólera que se pressentia na reacção da avó, esta ergueu-se da cama e docemente apenas disse “Amanhã, já?”
Junho 2017
Almerinda Bento
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