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sexta-feira, 16 de junho de 2023

A Convidada Escolhe: "O Hóspede de Job"

O Hóspede de Job”, José Cardoso Pires, 1963


Quando em 2022 li “Integrado Marginal” de Bruno Vieira Amaral, uma completa e excelente biografia sobre José Cardoso Pires, senti necessidade de ler ou reler alguns livros deste autor. Na altura, soube que “O Hóspede de Job” dedicado à memória do irmão “Nheca” que morreu durante o serviço militar em 1953, só em 1963 teve a sua edição final, embora tenha começado a ser escrito dez anos antes. O livro foi bem acolhido pela crítica, tendo em 1964 ganho o Prémio Camilo Castelo Branco.

Numa clara crítica à NATO e aos senhores da guerra, ao serviço militar que precisa dos jovens camponeses, operários e trabalhadores para sobreviver, o livro saiu no tempo da guerra colonial e das lutas estudantis que antecederam a revolução de Abril. “O Hóspede de Job” é, nas palavras de José Cardoso Pires, escritas no posfácio de Novembro de 1963, “uma história de proveito e exemplo – um romance, no sentido tradicional do termo, destinado unicamente a ilustrar uma legenda, uma moral ou um clima humano, para lá de qualquer imediatismo de tempo e de lugar histórico.”

É o tempo da fome e da repressão no Alentejo. O trabalho é mal pago e disputado pelos “ranchos de fora” que já partiram mal acabaram as ceifas “ os gaibéus e os ratinhos, em direcção ao norte, outros, os algarvios, em direcção ao sul. E todos eles insultados, à despedida, pelos olhares que os alentejanos lhes deitavam” (pág. 24). Para a GNR, que é chamada sempre que há revolta, só há uma conclusão dita à boca pequena. “Temos política”. “Na véspera, as mulheres tinham marchado sobre a Vila e, todas em coro, apresentaram-se na Câmara. Pediam pão para casa, trabalho para os maridos.” (pág. 25).

Os sonhos de uma vida melhor que os livrem da miséria e da doença podem estar em Lisboa em cima de um andaime, ou nas fábricas do Barreiro com as suas chaminés, ou na venda de um pedaço de ferro de uma granada que já tenha explodido. Velhos, crianças, velhas, jovens, homens, mulheres todos participam nesta luta pela sobrevivência, vigiados pela guarda sempre que os direitos dos senhores da terra são questionados. Para o capitão americano que coordena os exercícios militares “Este pequeno país é uma verdadeira praia a todo o comprimento, como podes verificar por um bom mapa. Basta que te diga que, de norte a sul, são mais de quinhentas milhas de costa e de areia fina como não conheço outra que se lhe compare, nem sequer na Itália. A vida é barata e tranquila, e os portugueses, embora tristes, são acolhedores.” (pág. 169). Assim descreve ele este país, na carta que escreve para a mulher, no Michigan. Mas o sonho das praias irresistíveis pode ficar toldado por duas simples palavras numa parede na estrada ou mesmo do hotel: “Go home!”

O Hóspede de Job” permite-nos, através de uma linguagem rigorosa e clara, acompanhar diferentes personagens que criam um ambiente em tudo contrastante com o país das praias ininterruptas a que se referia o oficial americano da barbicha.

8 de Junho de 2023

Almerinda Bento


3 comentários:

  1. Acredito que seja um livro muito interessante de ler. O autor é dos melhores que há em Portugal.
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    Feliz fim de semana
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