Assinalaram-se esta semana, no dia 26 de abril, os trinta anos após o acidente nuclear de Chernobyl que ficou conhecido no mundo como o maior desastre nuclear de sempre.
Como forma de não esquecer a data, foi publicado ainda este mês, a novela gráfica subordinada ao tema "Chernobyl – A Zona" dos espanhóis Francisco Sánchez (texto) e Natacha Bustos (grafismo), numa edição da Levoir.
Os personagens criados por Francisco Sánchez são ficcionais, mas cujas histórias poderiam representar as experiências e vidas de pessoas reais que viviam em Pripyat, nos arredores da central nuclear de Chernobyl. Na presente novela gráfica estão representadas três gerações de uma família, os avós que acabaram por permanecer na aldeia, a mãe e os filhos que foram evacuados de Pripyat. O pai foi um dos liquidadores (nome atribuído aos bombeiros, militares e voluntários que de forma heroica apagaram o incêndio que deflagrou no reator número quatro durante nove dias consecutivos) que acabou por vir a falecer dias mais tarde, num hospital em Moscovo.
Anos mais tarde, os filhos decidem regressar a Chernobyl como forma de (re)conhecer Prypiat, a cidade que ficou abandonada na sequência da evacuação quase dois dias após o acidente. O regresso a Pripyat marca de alguma forma o (re)encontro com o passado, através do reconhecimento de vários locais, edifícios, espaços da cidade, fazendo, em certa medida, "a ponte" com a história da sua família.
A presente novela gráfica não apresenta histórias que caem no sentimento fácil. Apresenta, sim, de forma clara e objetiva, através de diálogos muito simples, poucos até, e acompanhados de muitos, muitos desenhos, os dilemas, as preocupações dos habitantes de Pripyat aquando do acidente nuclear (embora não tivessem uma real dimensão dos factos porque a informação não era passada por indicações governamentais), assim como as suas consequências.
Ainda que os personagens apresentados na novela gráfica "Chernobyl – A Zona" sejam fruto da ficção, todo o cenário e circunstâncias seguem em linha, por exemplo, com os testemunhos apresentados no livro, também publicado recentemente, "Vozes de Chernobyl" de Svetlana Alexievich (Prémio Nobel de Literatura de 2015).
Não será de todo impertinente referir que a presente novela gráfica ilustra muitos dos episódios retratados nas "Vozes de Chernobyl" de Svetlana Alexievich!
Em todo o caso, em ambas as obras, fica o alerta para a humanidade. É preciso não esquecer que o acidente de Chernobyl surge na sequência da grande ambição da URSS em produzir energia nuclear no intuito de fabricar a mais poderosa bomba atómica, ainda num contexto da "guerra fria", na sua relação com os EUA. A central nuclear de Chernobyl recebeu claras instruções diretamente do Comité do Partido Comunista para que se aumentasse ainda mais a produção de energia nuclear ainda que o reator número 4 não estivesse totalmente operacional.
As consequências do desastre nuclear ocorrido há precisamente trinta anos são incalculáveis, tanto na perda de vidas humanas, animais, e toda uma área geográfica significativa (conhecida por "A Zona") tenha ainda níveis de radioatividade elevados, o que acontecerá ainda por mais alguns séculos.
O problema Chernobyl está longe de ser considerado um assunto do passado na medida em que o "sarcófago" que cobre o reator número quatro está a sofrer danos devido à chuva e à erosão. A situação é de tal forma grave que no interior do "sarcófago" existe combustível nuclear que se estima continuar ativo durante os próximos 100 000 anos. Parafraseando Francisco Sánchez, o autor de "Chernobyl – A Zona", "Chernobyl ainda agora começou." (p. 173)
Texto da autoria de Jorge Navarro
Sem comentários:
Enviar um comentário