A INCRÍVEL VIAGEM DO FAQUIR QUE FICOU FECHADO NUM ARMÁRIO IKEA, de Romain Puértolas, é, no mínimo, uma história insólita, muito divertida, que dispõe bem o leitor, mas que não deixa de chamar a atenção, seriamente, para os graves problemas atuais da imigração ilegal, uma das preocupações mais pertinentes da atualidade. A crítica à atuação das autoridades relativamente às situações angustiosas que se lhes deparam está bem presente, bem como às mafias do tráfico humano. São chamados "os últimos aventureiros do nosso século", os que sacrificam tudo para tentar entrar num país mais estável e alcançar uma vida melhor.
A personagem principal é um faquir indiano de fato de seda brilhante, gravata e o seu melhor turbante, que toda a vida sobreviveu enganando as pessoas com os seus truques de magia, mas que ao longo desta história e ao vivenciar tantas peripécias sonha em tornar-se uma pessoa melhor, o que vem a conseguir. Deixa a Índia e parte para França com passaporte legal e visto para o espaço Schengen, financiado pelos seus conterrâneos a quem consegue enganar uma vez mais, com o fim de comprar numa loja IKEA, em Paris, uma nova cama de pregos que vira em promoção numa revista. Chegado ao aeroporto burla o taxista, de etnia cigana, que o conduz à loja e que o virá a perseguir até ao final feliz da história. Como a cama de pregos só estará disponível para entrega no dia seguinte e o faquir não tem dinheiro para hotéis resolve passar a noite no Ikea. A dada altura vê-se obrigado a esconder-se num armário o qual, por azar, irá ser transportado num camião para Inglaterra. No camião viajam vários clandestinos. Assim, chegados a Inglaterra, o faquir, embora com passaporte válido, é tratado como os outros ilegais e são todos repatriados para Barcelona, pois a postura das autoridades é enviá-los para o mais longa possível, porque sabem que em breve eles irão tentar novamente passar a fronteira. E, assim, começou o seu deambular que o levou até à Líbia.
No Aeroporto de Barcelona encontra o taxista francês, personagem secundária que protagoniza cenas bastantes divertidas, que o ameaça com uma faca, pelo que se vê obrigado a fugir dentro de uma mala. No porão do avião que o levará a Roma ele começa a escrever na sua própria camisa o seu primeiro romance, que com a ajuda da dona da mala virá a ser publicado e lhe dará não só a independência económica, como lhe permitirá ser uma pessoa melhor e solidária, como passou a desejar ser a partir do momento em que se relacionou com os imigrantes ilegais e se questionou sobre a sua própria vida.
É um livro leve, inteligente, original, onde não está ausente a caricatura, séria o bastante quando o assunto assim o determina, sendo a personagem principal muito interessante e muito bem descrita.
Curiosa a personagem do inspetor inglês de ascendência indiana, que trata o faquir de forma tão dura. Há uma passagem em que ele comenta que provavelmente os pais do inspetor também viajaram clandestinos para que hoje ele tenha uma boa vida.
O percurso do indiano e seus comentários pela loja IKEA são interessantes para quem o já tenha feito.
Gostei muito e diverti-me.
Maria Fernanda Pinto
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