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quinta-feira, 7 de maio de 2015

A Escolha do Jorge: A Hora das Sombras

De vez em quando gosto de me aventurar em policiais, preferencialmente nórdicos, tendo escolhido "A Hora das Sombras" do sueco Johan Theorin (Gotemburgo, 1963) para leitura do último fim-de-semana em registo mais descontraído.
A surpresa foi imensa na medida em que este livro é mais do que um tradicional livro policial. Além da trama em torno do desaparecimento de Jens, um menino de 6 anos, em 1972, que nos prende desde o início até ao fim, relata-nos também as transformações que ocorreram na ilha de Öland, na Suécia, em mais de um quarto de século, refletindo as transformações socioeconómicas verificadas no país durante aquele período, assim como a descoberta da ilha pelos residentes de Estocolmo como destino turístico sendo, pois, um local ideal para construir uma casa de veraneio.
Por outro lado, as descrições sobre o meio ambiente, assim como as preocupações ambientais constituem em certa medida um ponto de destaque nesta obra que nos leva a navegar muito calma e tranquilamente ao longo da narrativa.
O livro incute um ritmo próprio, ao sabor do mar e calma que a ilha transmite sobretudo no início do outono quando já todos os veraneantes partiram rumo às cidades e ao seu quotidiano.
Acrescente-se ainda que em "A Hora das Sombras", a vida e a morte constituem duas faces da mesma moeda na medida em que os idosos que tanto procuram Öland para gozarem a sua aposentação com qualidade de vida, são também alguns dos personagens principais do livro e sempre com a ideia de que o fim chegará invariavelmente, mais tarde ou mais cedo. É perante essa consciência de finitude que nos deixa melancólicos em certa medida com a leitura deste livro.
"A Hora das Sombras" é, pois, um policial muito diferente daquilo a que nos habituámos quando lemos este género de livros.
O escritor estabelece um ritmo natural, tão natural como a vida no seu dia-a-dia, tornando "A Hora das Sombras" numa história mais verosímil do que as que tantas vezes lemos noutros livros do género, pois aqui nada é vertiginoso, nada decorre em permanente sobressalto. Também nos inquieta, também nos fascina, mas é graças à tranquilidade e melancolia que o autor nos prende ao longo de toda a narrativa.
Excertos:
"Nils apercebe-se que Öland mudou muito desde o tempo da sua juventude. Há mais matagal e árvores na ilha, e a estrada estreita de gravilha que levava a Borgholm transformou-se numa estrada nacional alcatroada, tão plana e reta como a ponte. A linha de comboio que atravessava a ilha de norte a sul deve ter fechado, pois Nils não vê carris na charneca. A fileira de moinhos que se erguia junto à praia para aproveitar o vento do estreito também desaparecera; restam apenas uns quantos.
Parece haver menos pessoas na ilha, embora haja muitas casas novas junto à costa. Nils aponta para elas com a cabeça.
- Quem vive nestas casas? - pergunta.
- Os veraneantes - responde Fritiof, lacónico. - Ganham a vida em Estocolmo e compram casa em Öland. Atravessam a ponte de carro e passam as férias ao sol, depois voltam rapidamente para casa para ganhar mais dinheiro. Não querem ficar aqui no inverno... é demasiado frio e triste.
Por um lado, até os compreende." (pp. 320-321)
"- Stenvik é muito bonito, não é? - disse Ljunger. - Camo e aprazível, com a pedreira fechada e as casas de campo vazias - esboçou um sorriso. - Aqui temos optado por outra via, claro... expandir-nos e apostar no turismo, no golfe e nas conferências. Acreditamos que é a única maneira de manter as aldeias da costa norte de Öland com vida.
Julia assentiu, não sem alguma hesitação.
- Parece que funciona - comentou." (p. 148)
"Só acho que é melhor contar as histórias no seu ritmo. Antigamente as pessoas davam tempo para narrar histórias, agora tem de ser tudo a correr." (p. 170)

Texto da autoria de Jorge Navarro

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