Lídia Jorge é uma escritora portuguesa que muito admiro. A forma como traça o perfil de Milene Leandro, a personagem central de "O Vento assobiando entre as Gruas" é de uma delicadeza e sensibilidade verdadeiramente tocantes.
A narrativa vai-nos sendo apresentada e desvendada ao longo de mais de quinhentas páginas e há um tom de tragédia ao longo de todo o livro pontuado por frases curtas do tipo "Nós só saberíamos depois" que deixam o/a leitor/a preso/a à narrativa desde a primeira página. A narrativa é feita num suspense, num remeter para a frente, para a urgência de desvendar o futuro, os segredos.
Considero que é uma obra extremamente bem elaborada, rigorosa, perfeita.
A história de uma fábrica – Fábrica Conservas Leandro 1908 – intimamente ligada à história da família Leandro é afinal o retrato de uma sociedade ao longo de décadas, o retrato de uma elite que governa os destinos das pessoas de uma região, que se sente no direito de fazer a seu bel prazer, desrespeitando direitos fundamentais e interferindo sempre que a sua "ordem" pré-estabelecida é de algum modo posta em causa. E por isso, não há qualquer pejo em anular e despersonalizar, se tal for condição de sobrevivência e de inatingibilidade da classe dominante. A ganânia, o poder, as classes sociais, o racismo, a fama, o sucesso, a corrupção, o choque de culturas são alguns dos ingredientes de que é feito este excelente romance de Lídia Jorge.
É também uma história de solidão e de amor solitário. Milene recorda constantemente um Verão especial em que ela e mais dois primos viveram um verão inesquecível. Agora que precisa de desabafar e que eles estão longe, faz longos telefonemas para o atendedor de chamadas do primo João Paulo que lá longe, no Massachusetts, nunca atende. É também com a empregada que partilha sentimentos e emoções e com quem estabelece um pacto de silêncio; é o destino dos seres invisíveis.
A numerosa família Mata vinda de Cabo Verde – a 3ª vaga – tem neste romance um papel igualmente relevante. Desde Felícia, mulher-chave em toda a família, forte, lutadora, incentivadora dos sonhos dos filhos, cujos sonhos a atormentam e são o presságio de algo de terrível que há-de acontecer, até à velha matriarca – Ana Mata – que tudo ouve e vê, mas não é ouvida nem compreendida pelos seus, pois o seu mundo continua lá bem longe na África natal. E depois os homens, cada um seguindo o seu destino e em que Antonino, o gruísta, acaba por ter também um papel fundamental na narrativa.
Parabéns Lídia Jorge pelas belas horas de leitura que nos proporciona.
Almerinda Bento
Muito interessante não conhecia este livro de contos do Franz Kafka certamente um livro para ler.
ResponderEliminarFranz Kafka? Não é um romance de Lídia Jorge!
ResponderEliminarAlmerinda