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domingo, 24 de fevereiro de 2013

Ao Domingo com... Fernando Silva


Viva:
Vamos lá ver em que base consigo falar de mim: sei coisas razoáveis a meu respeito, mas também sei outras… ui! 


Podia falar como se fosse outra pessoa, plagiando o antigo ponta-de-lança Mário Jardel, quando este se referia a si na terceira pessoa: “Passaram a bola ao Jardéu… e o Jardéu márcou…!” Ou, simplesmente vendo-me ao espelho com óculos progressivos… mas como as lentes já tiveram a sua época, ou foco a cabeça e desfoco o corpo, ou vice-versa ao contrário!

Fui adulto muito novo, com apenas 12 anos. Recordo-me como se fosse hoje. Exactamente no dia do meu aniversário, dirigi-me com a minha mãe à farmácia de serviço. O tema era uma gripe e uma caixa de supositórios Dolviran. O senhor Zé, farmacêutico desde sempre, olhou-me desconfiado e questionou a minha mãe: “quantos anos tem o Fernandinho?” - “Doze, senhor Zé.”… Daí partiu a ordem para a auxiliar no interior do balcão: “Já é adulto!”

Que luxo, apesar da febre senti-me um herói. Já era grande! Na escola, era eu quem tinha aquelas “saídas” que faziam rir a turma. Ainda hoje acontece nas tertúlias de amigos. Não tenho culpa, saem-me!

Nunca me considerei um escritor. Em honra aos verdadeiros magos do pensamento em escrita e por respeito à verdade. Tenho 50 anos e escrevi dois livros. Há quem tenha escrito 20 com apenas 30 anos, que grande média! A minha é de 1 por 25 (e melhorou bastante, o ano passado era 1 em 49).

Um escritor a sério tem ideias, formata o que vê e não vê como se fosse um capítulo do próximo livro. Toma apontamentos, questiona-se, pensa e repensa. Enfim, vive para a escrita, num quotidiano inquieto e vigilante. Depois, vem a questão do talento… mas isso é outra história.

Não quero com isto dizer que quem escreveu apenas um ou dois livros, mesmo com 50 ou 60 anos, não seja um verdadeiro escritor. Pode ter feito muita investigação e apresentado uma obra minada de rigor e segurança, descarregando anos de trabalho onde cada elemento pode ser provado e comprovado. 

Porém, quem como eu escreve por impulso, fica refém de uma história onde normalmente nenhuma das tendências e previsões se confirma: “quem fez o quê?” ou “quem matou quem?”. É o acerto e desacerto do genuíno improviso. 


O primeiro livro, (desculpem-me, mas não me soa bem o termo “obra”, especialmente quando falo de mim) “27 Senha Azul”, começou do nada, como uma pequena experiencia, abordando temas que conheço com relativa profundidade: bandas de garagem, rádios piratas e campeonatos regionais de futebol, numa mistura de descontracção e caricatura social. Mas a ideia não era ter dado em livro. Por isso ficou parado a meio, num intervalo sabático de mais ou menos 2 anos.

Esta última aventura – “O segredo de Martinica”- teve outra intenção e outra dinâmica: devia ser um livro. E foi. Dois meses de alguma inspiração e razoável transpiração foram suficientes para descobrir o segredo que tinha escondido de mim, como quem procura uma pedra projectada para longe, depois de ter rodado sete vezes sobre si de olhos vendados.

No “27, Senha Azul”, a Introdução começava assim e transcreve um pouco o ambiente onde me criei:
“São as memórias das vivências com gente fantástica… que de um rolo de arame fazia uma gaiola, do mundo do improviso, do desenrascanço e da camaradagem. Gente de humor fácil, quase sempre pobre e onde a maior riqueza estava no partilhar com os amigos uma merenda, elásticos para uma fisga, uma cana-da-índia para inventar uma cana de pesca ou um canário para fazer criação…”

No mesmo livro, a minha biografia falava dos meus gostos:
“Gosta de alhos torrados, puré de batata, Allô Allô, Fawlty Towers, Marretas, Cerveja Preta, António Silva, Vasco Santana, João Villaret, Charlie Chaplin e Agatha Christie. Os seus ídolos desportivos foram Joaquim Agostinho, Livramento, Carlos Lopes, Jackie Stewart e Maradona. Na música, Bach, Beethoven e Carlos Paredes. As vozes de que nunca se cansa de ouvir são as de Amália Rodrigues, Freddy Mercury e Pavarotti. A árvore preferida é o choupo. O animal, o lobo.”

Na breve biografia do “Segredo de Martinica”, sou um pouco mais filosófico:
“Primeiro, nasceu à experiência e levaram-no logo a sério. Para não estar clandestino, arranjaram-lhe um nome. Quando abriu os olhos e percebeu onde estava, começou a gritar “não valeu, não valeu!”, mas a falta de dentes tornou completamente imperceptível a sua revolta. Quis fugir, mas a alcofa era alta. Uns dias mais tarde passaram-no para uma cama de grades- percebeu então que estava preso.”

E pronto, espero que esta os encontre de boa saúde que nós por cá todos bem. De mim, pouco mais resta dizer… a não ser que, “brigo” com pianos desde que me conheço, que também desde muito novo aderi à moda das bandas de garagem, o que na altura resultou num “fantástico” LP de um não menos fantástico e dedicado grupo chamado “Os Duques de Quibir”. Na altura, acumulava a música com a “limpeza” do pavilhão do Sporting Clube Marinhense, na pele desequilibrada de jogador de Hóquei em Patins. Mais tarde, tive a oportunidade de sentir o cheiro da gasolina e a adrenalina própria dos ralis. Por acaso, no papel de piloto nem me saí muito mal.  
Pianos, ralis, discos, patins e livros podem não ser da mesma família, mas este… sou mesmo eu!

Ao dispor.
Fernando L. Silva

2 comentários:

  1. Sou fã do Fernando Silva, mas assim tipo uma fã incondicional! Os dois livros apesar de bastante diferentes são muito bons, de leitura fácil e acessível. Não consegui parar de ler o "Segredo de Martinica", no sentido literal mesmo, uma história que nos amarra ao livro... Quanto ao "27, Senha Azul", quando me pedem a opinião o que digo é que é um livro terapeutico e todos os psiquiatras e psicologos o deviam prescrever como anti depressivo infalivel... Leiam os dois livros, vale muito, mas muito a pena!

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