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sábado, 31 de março de 2018

Na minha caixa de correio

  

  

 Ofertados pelas editoras parceiras:
- "Encontrei-te nas páginas de um livro" da editora Marcador;
- "Às cegas" da editora Topseller;
- "A última travessia" da editora Suma de Letras;
- "Matar o cancro" da editora Objectiva;
- "A mulher à janela" da Editorial Presença
- "A mulher do oficial nazi" da editora Alma de Livros

quinta-feira, 29 de março de 2018

A Escolha do Jorge: "O Meu Amor Absoluto"


“(…) Há uma parte do meu ser à qual tu jamais chegarás.” (p. 231)

É comum ao escolhermos cada livro que lemos que seja um livro que venhamos a apreciar tanto no que concerne à narrativa no geral, como também do ponto de vista literário. Seja qual for o género de livro que se segue na nossa lista de leituras, é comum criarmos alguma ou mesmo muita expectativa com o livro que temos em mãos, mais não seja o factor de motivação do momento que nos faz levar a leitura a bom porto.
      Há livros, no entanto, que pelas diversas razões ficam aquém daquilo que esperamos, talvez pela ideia que criámos em função de opiniões recolhidas previamente ou, em certos casos, quando alguns livros são alvo de uma forte campanha publicitária.
      Parecendo quase uma contradição, esta rubrica, no blog, que sugere livros que leio e que
recomendo, esta semana apresenta-se como o oposto, na sequência da recente leitura de “O Meu Amor Absoluto” de Gabriel Tallent.
      Tivesse a obra menos 150 a 200 páginas, conseguiria ao menos tratar-se de um livro razoavelmente conseguido, caso o autor centrasse a sua atenção na relação incestuosa entre o pai e a sua filha, mas acabou por se dispersar, integrando outros personagens cuja articulação está mal concebida, caindo em frequentes absurdos e contradições, tornando a narrativa em algo fútil e, não raras vezes, inverosímil, e até absurdo.
      A dimensão psicológica da personagem principal, uma adolescente de 14 anos, está bem construída, assim como os seus dilemas face à ideia de culpa, mas também de revolta, na sequência da sua relação imposta pelo seu progenitor. O círculo vicioso desta relação proibida apresenta-se, contudo, bem delineado. Há de facto material e um caminho seguro através dos quais Gabriel Tallent poderia ter trilhado, porém, acabou por conceber uma narrativa que chega a tornar-se enfadonha. Mesmo quando a narrativa atinge o pico da resolução, o autor ainda nos “presenteia” com mais trinta páginas de um inferno entediante e sem sentido, não trazendo nada de novo à narrativa.
      Gabriel Tallent tinha os ingredientes necessários para criar uma boa história assente numa escrita apelativa dados os seus recursos, porém acabou por conceber uma obra monstuosa que se engoliu a si mesma. “O Meu Amor Absoluto” é um dos exemplos em que escrever muito não é necessariamente sinónimo de conceber um bom livro. Mais, questiono-me como é possível ler, por exemplo, na contracapa do livro, rasgados elogios quando estamos perante um verdadeiro flop literário que também recentemente conheceu a sua edição portuguesa e que é vendido como gato por lebre.

Partilho aqui uma das passagens fulcrais da obra, talvez a mais importante e emblemática:

"Turtle deita-se nessa noite no chão do seu quarto, queixo posto nas mãos, a olhar para o lume do seu candeeiro a óleo, pés a fazerem festas um ao outro, enquanto pensa, ele voltou e foi-se tudo embora. Todos os sonhos com a rapariga que poderias ser. Desapareceram. Sempre achaste que a culpa era dele. Mas querias que ele voltasse. Também estás metida nisto. Foste em tempos uma criança, mas já não és, e aquilo que se poderia desculpar a uma criança não se te pode desculpar a ti. Deverias ter usado, pensa, a porra de um preservativo. Não sabe ao certo como funciona, mas a situação mudou. Se calhar a culpa foi sempre tua, pensa ela. Talvez tenhas algo em ti. Algo corrupto. Estavas a pedi-las ou querias. Claro que sim. Arrastaste-o para isto quando eras uma mera criança e a tua mãe percebeu e, ao perceber, matou-se, e agora ele não consegue fugir. Olha-te nos olhos e quer morrer.” (p. 248) 

Texto da autoria de Jorge Navarro

quarta-feira, 28 de março de 2018

Para os Mais Pequeninos: "O Coelho e o Urso, O Pica-Pau Barulhento"

Tal como referi neste post (aqui), as imagens deste livro têm apenas três cores. Desta feita, imperam o preto, o branco e o verde relva. Na verdade, o livro é tāo expressivo que me parece que essa falta de cor é propositada. Porque realmente nāo se dá por ela, tal sāo as expressōes assombrosas dos personagens que povoam estas páginas. 

Esta história é, um pouco, o seguimento da história anterior. O coelho e o urso sāo agora grandes amigos. Mas o feitio do coelho é um pouquito tramado. Ele resmunga, resmunga... E quando aprarece um pica-pau a coisa piora!

Uma história divertida, que nos fala do sabor da amizade e da sua importância. E do valor da felicidade. Para os mais pequenitos e graúdos também, porque nāo?

Ora vejam algumas fotos:








Cris

segunda-feira, 26 de março de 2018

"Dei o Teu Nome às Estrelas" de Rui Conceiçāo Silva

Confesso que esperava um romance "light" quando abri este livro. Talvez pelo título e/ou pela capa. Nas primeiras folhas nāo tive disso a confirmaçāo mas também nāo me empolguei totalmente. Algumas descriçōes, que achei belas, um subtil enquadramento à época (1883, Figueiró dos Vinhos) que achei perfeito. Mas, a história nas primeiras páginas nāo "avançava" grandemente, pareceu-me.

No entanto, a escrita límpida, escorreita e cuidada, fez-me continuar com agrado. Como referi, o ambiente foi cuidadosamente estudado e bem descrito, fazendo-me anotar alguns sítios deste Portugal, que às vezes desconhecemos, para visitar em dias de mais calor (Foz de Alge, por ex.).

Ao fim de umas poucas dezenas de páginas, a situaçāo alterou-se e a história prendeu-me. Joaquim Matheus é um jovem pobre que, com a ajuda do padrinho, conseguiu fazer com que as palavras escritas, a sua grande paixāo, definissem o seu modo de vida: era o mestre-escola da terra onde tinha mascido. Mas foi sempre um rapaz solitário, sem grandes amigos, metido com os livros e pouco mais. A situaçāo muda um pouco quando conhece dois jovens pintores (José Malhoa e Manuel Henrique Pinto) que tinham ido passar férias e conhecer Figueiró. Juntam-se, assim, alguns amigos que, explorando os sítios idílicos dos arredores, fazem caminhadas e passeios. Pintores, poetas, amantes de livros, inventores de palavras.

Joaquim apaixona-se por Olinda. Mas o leitor nāo se pode esquecer que a história se passa no século XIX. Outros hábitos e costumes fazem parte de um Portugal rural e retrógado que impediu muitos amores...

Gostei de tudo nesta obra. Se passarem pelo meu instagram (aqui) podem ler um pequeno trecho que lá coloquei e bateu fundo cá dentro. Sāo as palavras do autor sobre o que eu tinha pensado já. Muito bom. Recomendo!

Terminado em 24 de Março de 2018

Estrelas: 5*

Sinopse
Em 1883, numa terra como tantas outras, perdida na imensidão das serras e longe dos olhares do mundo, vivia Joaquim, professor e narrador desta história, um homem sem alento, esperando por tempos que não vinham. Contudo, nesse ano, chegam à terra duas pessoas que irão mudar a sua vida para sempre: José Malhoa e Manuel Henrique Pinto, semeadores de maravilhas. É com eles, e com outros caminhantes, que Joaquim encontrará o lado bonito da sua terra, qual paraíso escondido entre montanhas. Um dia, ele escuta a voz de Olinda, a mulher que lhe seduz os silêncios e os sonhos, e fica preso a esse amor, o único que guardará eternamente.

Cris

sábado, 24 de março de 2018

Na minha caixa de correio

  

  

Comprado nos saldos da Livraria Barata, A Filha do Governador.
Do passatempo do JN, A Herdeira dos Olhos Tristes.
Ofertados pela editora Planeta, Nāo Sou um Monstro e OMétodo Japonês para Viver 100 Anos.
Pátria chegou pelas māos da editora D.Quixote. Leitura para o próximo mês.
Da Matéria Prima recebi Kintgukuroi.

sexta-feira, 23 de março de 2018

"O Tatuador de Auschwitz" de Heather Morris

Tanta coisa para dizer sobre este livro e tāo poucas palavras aparecem no meu cérebro... Apenas vos digo que sendo uma história verdadeira esta, a do tatuador de Auschwitz, de tāo incrivel que é, parece ficçāo. Ter sobrevivido a esse campo de terror durante 3 anos foi um feito que poucos realizaram.

Uma das coisas que sempre me imprecionou foi saber que a realidade foi escondida de tal forma que poucos se deram conta do que realmente se passou nos campos de concentraçāo. E, saídos desses campos de extremínio, os prisioneiros tiveram de se "virar" por eles próprios e poucos tiveram ajuda profissional e cuidada. Muitos, também, preferiram tentar esquecer e viver o melhor possível a vida que ainda lhes restava. O silêncio imperou durante muito tempo. Demasiado!

Estas sāo apenas algumas consideraçōes sobre uma época terrível da História que me apraz fazer. Outras ficam por dizer e refletir.

O tetovierer (tatuador) de Auschwitz fez tudo o que pôde para sobreviver. Conseguiu uma posiçāo privilegiada que lhe permitia ter acesso a um sītio melhor para dormir e tinha direito a uma alimentaçāo melhorada. No entanto, nāo deixou de ajudar alguns amigos fornecendo alimentos que conseguia arranjar contrabandando. Sim, fez tudo para sobreviver e manter-se vivo. Quem nāo o faria?

O seu amor por uma prisioneira, Gita de seu nome, manteve-o sempre focado no dia em que poderiam sair daquele inferno. Mas houve momentos em que a morte dos amigos se abateu sobre si e o desânimo que se apoderou dele foi terrível...

Uma história da História que vos aconselho a ler. Nota máxima, nāo tanto pela forma como é descrita mas pelo seu conteúdo impressionante.

Terminado em 21 de Março de 2017

Estrelas: 6*

Sinopse
Esta é a história assombrosa do Tatuador de Auschwitz e da mulher que conquistou o seu coração - um dos episódios mais extraordinários e inesquecíveis do Holocausto.

Em 1942, Lale Sokolov chega a Auschwitz-Birkenau. Ali é incumbido da tarefa de tatuar os prisioneiros marcados para sobreviver - gravando uma sequência de números no braço de outras vítimas como ele - com uma tinta indelével. Era assim o processo de criação daquele que veio a tornar-se um dos símbolos mais poderosos do Holocausto.

À espera na fila pela sua vez de ser tatuada, aterrorizada e a tremer, encontra-se Gita. Para Lale, um sedutor, foi amor à primeira vista. Ele está determinado não só a lutar pela sua própria sobrevivência mas também pela desta jovem.

Um romance baseado em entrevistas que Heather Morris fez ao longo de diversos anos a Lale Sokolov, vítima do Holocausto e tatuador em Auschwitz-Birkenau. Uma história de amor e sobrevivência no meio dos horrores de um campo de concentração, que agradará a um vasto universo de leitores, em especial aos que leram A Lista de Schindler e O Rapaz do Pijama às Riscas, e que nos mostra de forma pungente e emocionante como o melhor da natureza humana se revela por vezes nas mais terríveis circunstâncias.

Para saber mais sobre este livro, aceda ao site da Presença aqui.

Cris

quinta-feira, 22 de março de 2018

A Escolha do Jorge: "A Tomada do Poder"



“Rezámos pela nossa libertação, e a libertação veio – sob a forma de uma nova ocupação.” (p. 104)

Filho de polacos e nascido na Lituânia, Czeslaw Milosz (1911-2004) é um dos mais importantes nomes das letras em polaco, tendo sido laureado com o Nobel de Literatura, em 1980, entre outros prémios literários que arrecadou ao longo da sua carreira.
      Para além da ficção e da poesia, Czeslaw Milosz notabilizou-se no campo da ensaística e obras como “A Mente Aprisionada”, publicada em 1953, vieram a questionar a forma de pensamento dos intelectuais no decurso da tomada do poder na Polónia, com a instauração do comunismo, no final da 2ª Guerra Mundial.
      Insatisfeito com a mudança de poder e o novo rumo que a Polónia seguia então, Czeslaw Milosz exilou-se em Paris e as suas obras foram proibidas na Polónia durante o regime. Somente em 1980, com a atribuição do Prémio Nobel de Literatura é que muitos outros escritores e a população em geral ficaram a conhecer as obras de Czeslaw Milosz, já numa época em que se verificava um apaziguamento do regime em oposição aos anos de severa governação sob o domínio estalinista.
Em relação à obra “A Tomada do Poder”, publicada em 1955, é um misto de romance e ensaio. Ainda que os personagens da obra sejam ficcionais, o enquadramento histórico e político é apresentado com bastante rigor.
      Na verdade, “A Tomada do Poder” constitui uma obra fundamental para a compreensão de um período fortemente conturbado na Polónia, e em especial, na capital Varsóvia, nos anos de 1944 e 1945. Não há muita literatura sobre esta temática específica, além de obras de referência historiográfica sobre o final da 2ª Guerra Mundial ou sobre o período comunista em geral.
      Mas esta obra é crucial na medida em que centra a sua atenção no episódio da Insurreição de Varsóvia que teve lugar em Agosto de 1944, em que os polacos com poucos meios mostraram grande resistência aos alemães ainda que estes estivessem já numa fase em que a guerra estava praticamente perdida. Em todo o caso, os alemães puseram cobro a este movimento, eliminando os opositores e acabando por destruir ainda mais a capital que, já de si, se apresentava em ruínas.
      A par deste episódio cujos monumentos à Insurreição de Varsóvia encontram-se numa das principais praças da cidade, a ideia de reconstrução da capital é algo que está bastante marcada nesta obra. A necessidade de reconstruir Varsóvia constitui em si mesma uma forma de ressurgir dos escombros e olhar para o futuro. Segundo Czeslaw Milosz, “a reconstrução de Varsóvia irá unificar a nação dividida.” (p. 129) “Respirou profundamente o ar da Primavera. A escala grandiosa dos recentes acontecimentos e o facto de se encontrar ali, a caminhar pelas ruas daquela cidade – destruída, mas já participante do futuro e de uma nova humanidade – embriagava-o.” (p. 97)
      Varsóvia é seguramente uma das cidades em que partindo de frases como “Varsóvia tinha deixado de existir.”(p. 113) ou “As cidades dos homens não são duradouras.” (p. 113) que compreendemos o sentido de ideias como “Prossegue a construção da História.” (p. 110), sobretudo porque o país, invadido pelos nazis, constituiu o motor de arranque de uma guerra sangrenta anunciada, passou, no final do conflito, do ponto de vista político, da extrema-direita à extrema-esquerda, no que concerne à forma como a Polónia passa a ser governada, seguindo as orientações de Estaline.
      Em “A Tomada do Poder” assistimos a indivíduos que se notabilizaram pelo seu carácter maquiavélico e que, tendo combatido do lado do nacionalismo, perseguindo judeus (e não esquecer que a população de Varsóvia antes do início da guerra tinha mais de 30% de judeus), é agora “aproveitado” pelo novo regime, comunista, com o objectivo de levar a cabo outras medidas extremistas assentes no medo e no terror. “Podemos ficar com ele. Dar-nos-ia outros pássaros da mesma plumagem.” (p. 101)
      Não raras vezes o leitor é confrontado com passagens perturbadoras que nos remetem não só para um período complexo tanto quanto conturbado em que o problema de identidade e o sentido da História se colocam quase em cada medida que é tomada face a uma política que se apresenta suja e abjecta. É este o universo em que se move Czeslaw Milosz. Questionar cada gesto e acto que fere, ferindo consciências, despertando para um (novo) poder que se instituiu e que em nada melhorou, mergulhando todo um país na obscuridade durante quase meio século.
      E curioso é pensar que sendo a distância entre Portugal e a Polónia  tão grande, como era possível alguém considerar que, antes da guerra, defendesse “uma ordem social baseada no catolicismo e na ditadura, à semelhança do regime de Salazar em Portugal.” (p. 51)
      Mas é o medo que ganha terreno, instalando, por sua vez o terror, que são as novas armas do comunismo. Os especialistas do terror com escola feita na Rússia vão agora impor-se numa Polónia que tenta ressurgir. É esse medo, esse permanecer de boca calada, o estar escondido, o ser vigiado que Czeslaw Milosz desenvolve em “A Tomada do Poder”. Um país que tenta ressurgir das cinzas, mas estando de cabeça baixa, acalentando a raiva e o ódio sem saber como descarregar, a não ser pela bebida ou pelo sexo fácil.
      “O meu trabalho é manter o clima psicológico debaixo de olho. Os nossos métodos para moldar consciências são quase ilimitados. Ilimitados. É esse o objectivo do terror.” (p. 99)
      “A Tomada do Poder” de Czeslaw Milosz constitui uma obra de grande fôlego e que se impõe como uma leitura obrigatória na actualidade como forma de compreensão do passado recente. Impõe-se uma tradução a partir do polaco e não do inglês, a edição possível, em 1987, quase uma década após o escritor ter recebido o Nobel de Literatura.
      Com “A Tomada do Poder” temos uma obra séria e literatura ao mais alto nível. A leitura não é fácil, a escrita é complexa e muitas vezes somos obrigados a parar para reflectir. Czeslaw Milosz continua a ser um escritor desconhecido em Portugal e, quiçá, com a publicação do ensaio “A Mente Aprisionada” no início de Abril, pela Cavalo de Ferro, este romance-ensaio possa ressurgir, com uma nova tradução, ganhando, dessa forma, o seu merecido destaque, para uma melhor compreensão da Polónia, na segunda metade do século XX e uma vez mais questionarmos o sentido da própria História.

Texto da autoria de Jorge Navarro

quarta-feira, 21 de março de 2018

Para os Mais Pequeninos: "O Coelho e o Urso - Mas Que Coelho Esquisito"


Um livro pequenino este, parecido com os livros de bolso. E, no entanto, tāo bonito! Os desenhos possuem apenas três cores (preto, branco e um azul celeste alegre) mas têm tanta alegria e cor! Ficamos verdadeiramente enfeitiçados com as expressōes do urso, do coelho e do lobo, os três personagens que povoam esta história.

E que tal a história, perguntam vocês? Simples mas com conteúdo, ensina a pequenada mas mantendo a boa disposiçāo e a alegria. Creio que uma leitura conjunta entre o "mais velho" e o "mais novo" irá trazer boas gargalhadas e sorrisos malandrecos... Bons momentos para partilhar entre pais (ou avós) e filhos e mais tarde recordar!

Vejam algumas fotos:







Cris

terça-feira, 20 de março de 2018

"Na Memória dos Rouxinóis" de Filipa Martins

Com uma capa perfeita, sóbria mas belíssima, este livro despertou logo a minha atençāo. Nāo conhecia a autora, embora este tenha sido, segundo creio, o seu quarto romance. 

Fui conquistada pela escrita. Muito. Bonita, cuidada, quase poética, daquele tipo de se querer voltar a trás e reler, mas, ao mesmo tempo, crua e intensa. Foi um bom começo. Depois confesso que a história levou o seu tempo a entrar. Sou irrequieta nas leituras, o meu cérebro precisa de algo muito fluente para se manter sossegado e nāo divagar. Talvez por isso custou-me a permanecer no livro. Agora que a história faz parte de mim, precisava de voltar ao início e reler algumas partes. Posso ter perdido algo e nāo gostava que assim fosse...

Às vezes, há livros dificeis para nós. Nāo maus (esses largo-os, abandonando-os!), mas dificeis. E eu insisto na leitura, teimosa, porque quero saber o que se vai passar, como acaba. Com este foi um pouco assim! Fiz bem em continuar (outra coisa nāo me passou pela cabeça!).

Gostei, de igual modo, logo no início, de me ter equivocado com o sexo de um personagem, neste caso daquele que é também o narrador. Por nada ser explícito (como por exemplo os tempos verbais) intuí erradamente que o narrador era... Mas pronto! Nāo vos digo mais porque pode ser que sintam o mesmo que eu e que gostem de ser surpreendidos!

Passado e presente. A vida do narrador e a vida de Jorge Rousinol, "o Sete". Um biógrafo e um biografado. 

Terminado em 17 de Março de 2018

Estrelas: 4*

Sinopse
Um romance extraordinário, feminino (embora sobre homens), em torno de um matemático que encomendou a sua biografia antes de morrer.
Jorge Rousinol é um matemático galego, que sempre defendeu o esquecimento como o melhor veículo para a tomada de decisões acertadas. No final da vida encomenda uma biografia sua a uma casa editora. Estranha decisão para quem nunca quis recordar. O biógrafo escolhido acaba por ser alguém com quem privara décadas antes e que se vê, ele próprio, enleado em memórias moribundas.

É um romance em três tempos (o do passado do biografado, o do passado do biógrafo - e o do presente, que os une), que vê no arrependimento outra forma de se lidar com as recordações. Biógrafo e biografado conseguirão, em parte, o que pretendem: não se trata de esquecer, mas sim de escrever uma confissão. Uma escrita fantástica, inesperada, inovadora - de uma leveza surpreendente. Diálogos muito bem escritos, sensuais. Incursões pela magia dos números primos. Desenlace inesperado.

Cris

segunda-feira, 19 de março de 2018

"Um Muro no Meio do Caminho" de Julieta Monginho

Quando soube que este livro tinha sido escrito na sequência de uma acçāo de voluntariado da autora num campo de refugiados sírios numa ilha grega, Chios, fiquei deveras interessada em lê-lo. Mesmo sabendo que os personagens sāo fictícios, sentimos tanta verdade neles que tomamos como verdadeiras as suas acçōes e comportamentos, as suas vidas passadas e as suas dores. Porque se eles sāo inventados, as suas histórias, porém, refletem as milhares de vidas que procuram na Europa um (re)começo, um novo sentido para as suas vidas destroçadas pela guerra sem sentido que se vive na Síria.

Isto foi o que senti em relaçāo às vidas reais que estāo por detrás destas histórias inventadas por Julieta Monginho.  E em relaçāo à história central posso-vos dizer que ficamos presos ao seu relato. Pela escrita escorreita e directa da autora, pelo ambiente bem descrito, espelhado e vivido por quem se encontra dependente da caridade alheia, num sítio que os prende sem estarem presos, por trazer para bem perto o que só assistimos pela TV. 

Um livro que devem ler se o tema vos interessar. Para refletir e porque nāo agir?

Terminado em 14 de Março de 2018

Estrelas: 5*

Sinopse
Trazem o que lhes restou: um caderno, um brinco, fotografias, a t-shirt do filho que morreu, um bebé a crescer na barriga, o barulho do seu quarto a ruir. Atravessado o mar, ergue-se o obstáculo inesperado: o muro construído pela hostilidade, esquecida dos que sucumbiram sem refúgio em território europeu, há menos de um século. À porta do muro alastram os campos de refugiados - chão de pedras, ratos, tendas fustigadas pelo sol, pela neve, pelas quezílias.
      De todo o mundo acorrem os que ajudam. Levam as mãos para amparar, mimar, oferecer e cozinhar, os olhos para ver e entender.
      As histórias são mais que mil e uma. A de Amina e Omid, os fugitivos, a de Dimitris, o grego cercado pelos seus próprios muros, as de Ann e Saud, Juan e Eleni. Vidas suspensas, à beira do muro, à porta da Europa.

Cris

domingo, 18 de março de 2018

Passatempo Matéria Prima

Mais um passatempo para os seguidores do blogue! Desta feita, um livro com coisas fofinhas para fazerem e comerem! Coisas saudáveis, pois entāo! Assim, O Tempo Entre os Meus Livros tem para vos oferecer um exemplar do livro A Pitada do Pai, de Rui Marques (já conhecem o seu blogue?).

O passatempo decorre até ao dia 31 de Março.

Mas vamos às regras:

1- Devem ser seguidores do blogue.

2- Podem participar apenas duas vezes, uma através do Facebook e outra enviando um mail para otempoentreosmeuslivros@gmail.com

3- No Facebook devem comentar este post tagando 3 amigos e fazer gosto na página do blogue aqui.

4- Por e-mail devem referir qual é o nome do blogue do Rui Marques e os vossos dados (nome e localidade onde moram).

Nada complicado, pois nāo?
Boa sorte!

Cris

sábado, 17 de março de 2018

sexta-feira, 16 de março de 2018

"O Grande Livro dos Animais" de Yuval Zommer


Quem é que é pequenino e nāo gosta de animais? Creio que nenhum garoto coloca o dedo no ar a esta pergunta! Assim sendo, apresento-vos um livro que foi feito para a pequenada: O Grande Livro dos Animais.

Grande em tamanho, ele é muito apelativo e multifacetado. Quantas histórias se podem inventar face aos inúmeros desenhos que povoam estas páginas! Em jeito de enciclopédia e com pequenas frases cheias de pormenores sobre os animais, o conhecimento vai passando para a pequenada. Daí, sugiro a invençāo de  pequenas histórias onde os desenhos sāo o mote para que a imaginaçāo flua.

Ficam algumas fotos para vos abrir o apetite:





Cris

quinta-feira, 15 de março de 2018

A Escolha do Jorge: "Um Muro no Meio do Caminho"


“Não percebo se a compaixão me esvazia ou me enche de raiva. Uma indignação estéril, a pior.”

“Um Muro no Meio do Caminho” é a mais recente obra de Julieta Monginho, publicada pela Porto Editora. A obra surge na sequência da sua acção de voluntariado, no Verão de 2016, na ilha de Chios, na Grécia, num campo de refugiados sírios que tentavam a sua sorte, como fuga à guerra, na Europa.
Entramos nesta obra e rapidamente compreendemos que estamos perante vários géneros de escrita. “Um Muro no Meio do Caminho” apresenta-se sob várias facetas, desde o romance, o diário, o ensaio ou o manifesto.

Apesar de os vários personagens serem fruto de ficção, há, certamente, em todos eles um reflexo de dor e esperança espelhadas em todas as pessoas que fugiram do seu país em busca de um futuro melhor. Aqui, não se trata de uma imigração voluntária, mas sim forçada perante a evidência da morte iminente. Ficar na Síria é sinónimo de morte iminente porque ninguém está a salvo.

“Um Muro no Meio do Caminho” é editado precisamente numa altura em que a guerra na Síria atinge contornos de uma crueldade atroz, incompreensível, que tem vitimado milhares ou mesmo milhões de pessoas, tanto aqueles que perdem a vida, como todos os outros que deixam de saber como viver, ficando à mercê das forças em conflito. As imagens e cenas de guerra deixam o mundo ocidental perplexo, contudo, inoperante.

O mundo avançou tecnologicamente, mas o Homem tornou-se incapaz de lidar com situações como esta guerra que se arrasta há anos, capaz de hipotecar, durante gerações, o futuro do país em apreço.
“Um Muro no Meio do Caminho” é simultaneamente um murro nas consciências do mundo ocidental face à sua inacção e (quase) indiferença perante esta catástrofe no Médio Oriente e com repercussões na Europa enquanto continente de destino de milhares de refugiados.

“Um Muro no Meio do Caminho” questiona continuamente o sentido da História. Levanta inúmeras questões, às quais as respostas, tantas vezes falham. Estes acontecimentos são registados, assinalados, questionados, reflectidos para memória futura, para orgulho ou vergonha do Homem, enquanto símbolo civilizacional.

Amina, Ashmahn, Shayma, J., Saud e Omid são os personagens criados por Julieta Monginho e que nos dão uma ideia do contexto de guerra na Síria, as suas histórias, o que deixaram, o que perderam, o que anseiam, os sonhos, a esperança. Histórias dolorosas que, sendo ficção, partiram de tantas, tantas histórias (certamente) ouvidas de fazer doer a alma e o coração. E é nesses momentos que o tom da escrita de Julieta Monginho, através da narradora, também uma voluntária na ilha de Chios, se endurece, sob a forma de um grito de apelo ainda que retorne sob a forma de silêncio.

Milhares de refugiados procuram um futuro risonho, de paz e de esperança numa Europa que crêem civilizada, solidária, mas que esbarram, literalmente, com “Um Muro no Meio do Caminho”, o muro da indiferença, mas também do ódio, à medida que o Velho Continente, não tendo aprendido com a História recente, endurece o seu discurso à medida que assistimos ao avanço da extrema-direita a ganhar terreno em países como a Áustria, Alemanha, Hungria e Polónia, entre outros.

O mundo apresenta-se cada vez mais perigoso e perante a ideia de que de facto vivemos melhor e de termos uma maior longevidade, o certo é que o mundo vive cada vez mais confrontado com os sucessivos ataques terroristas, gerando, assim, a insegurança generalizada.

“Um Muro no Meio do Caminho” é uma obra pejada de gritos e silêncios perante o absurdo do mundo em que vivemos, a incompreensão, a inacção, a culpa.

“Os sonhos que Amina desenhava tinham desejos humanos e caprichos divinos.”

Excertos:
"Quando um dia se fizer a história deste momento vergonhoso da atitude europeia e da ascensão xenófoba, do acervo fotográfico emergirão as fotografias que retratam estes móveis aleijados que um benemérito considerou à medida de quem não pertence ao mundo dos sonhos, mas ao mundo das sobras, ao que restou da devastação. O mundo dos desejos está reservado aos que moram no continente de marca, tanto mais altivo quanto mais se afasta da pobre costa sul. Aos que querem lá entrar exige-se que deixem à porta as ilusões e, se teimarem, ao menos que tomem o lugar de pessoal menor que lhes foi reservado à nascença. As poltronas escavacadas estão muito bem para eles, sentadinhos e à espera do lado de lá do muro onde está pendurado o letreiro ‘Do not disturb’.”

"Todas as frases da sua história começam com um 'No'.
No children, no husband, no parents. No food, no doctor, no answer.
Nada.
Pode alguém viver nessa palavra que nem o abismo consegue definir?
Pode a mulher que a ouve ficar ali, em frente dela, sem palavras, 
no words,
sem chão,
no ground,
sem ar que se respire.
no breath?”

"Estas vidas não se podem apanhar do chão e fingir que nunca lá estiveram, que o sol voltou a brilhar e a maré a encher à espera dos turistas. Estas são vidas que precisam de um sopro compassivo, solidário, plural, palavras em desuso."

"As pessoas em fuga limitam-se a apelar não aos impulsos, mas aos valores estruturantes com que a Europa dos néons pavoneia a sua superioridade perante os povos bárbaros. A Síria é um teste para a Europa. Um teste em que a Europa reprovou ao resignar-se aos muros e aos campos (...)."
"no words,
sem chão,
no ground,
sem ar que se respire.
no breath?"
"Aos que querem lá entrar exige-se que deixem à porta as ilusões e, se teimarem, ao menos que tomem o lugar de pessoal menor que lhes foi reservado à nascença. As poltronas escavacadas estão muito bem para eles, sentadinhos e à espera do lado de lá do muro onde está pendurado o letreiro 'Do not disturb'. mais altivo quanto mais se afasta da pobre costa sul."

Texto da autoria de Jorge Navarro

quarta-feira, 14 de março de 2018

"Quero-te Morta" de Peter James

Já tinha cá este livro na estante há bastante tempo. A chegada de um novo livro desta série fez mexer o bichinho que me leva a ler policiais/thrillers e fui buscá-lo para a minha mesa de cabeceira. Ao ouvir referências muito positivas sobre este "Quero-te Morta" pensei para comigo que "deste mês nāo passaria"... 

O livro começa com a narraçāo de um crime. O leitor parece que vai à frente dos acontecimentos e sabe um pouco mais do que os investigadores. Mas, pouco depois, a acçāo torna-se uma corrida vertiginosa para apanhar um psicopata cujo intento é torturar e matar uma ex-namorada e quem lhe é próximo. Bryce Laurent é um homem bem parecido, envolvente mas perigoso, sobretudo quando é contrariado. Inteligente, manipulador, narcisista, sem medo de morrer e de... matar. E é isso que faz, logo no início das primeiras páginas. A vítima tem um defeito: namora com Red, sua ex-namorada. E isso é algo que Bryce nāo vai deixar passar em branco...

A vida do investigador que lidera a equipa que trata este caso, Roy Grace, e a de alguns dos seus colaboradores imprime a este livro uma verosimilhança com a realidade que suponho ser como a vida de muitos polícias que trabalham em crimes.  O mistério que ronda a vida do inspector serve para manter uma aura de suspense que muito me agradou.

E está lançado o mote para muitas páginas de uma leitura que nos agarra com palavras possuidoras de verdadeiro terror, situaçōes que envolvem sobretudo Red, que nāo consegue livrar-se de uma má escolha amorosa. E também, está lançado o mote para se falar em temas que, infelizmente, ainda sāo tāo comuns na nossa sociedade dita "moderna", como por exemplo, a violência doméstica e o stalking (ver wikipédia, aqui).

Com capítulos curtos, este livro lê-se muito rápida e sofregamente. Estou pronta para ler a última obra de Peter James publicada cá, "Marcada para Morrer".

Terminado em 10 de Março de 2017

Estrelas: 5*

Sinopse
Quando uma mulher conhece o atraente e charmoso Bryce Laurent através de um site de encontros, a atração é imediata. Contudo, à medida que a ligação entre eles se torna mais intensa, a verdade sobre o passado de Bryce, e o seu lado mais negro, começam a emergir. Tudo o que contou sobre a sua vida revela-se uma teia de mentiras e, aos poucos, a paixão de Red Westwood converte-se em terror.

Cris

terça-feira, 13 de março de 2018

A Convidada Escolhe: "O Doente Inglês"

O Doente Inglês, Michael Ondaatje, 1992

Este era um dos livros que estavam “adormecidos” há duas décadas na minha estante. Vi há uns bons pares de anos apenas um pouco do filme baseado no livro e como não me entusiasmou, o livro ficou sendo esquecido, até que num clube de leitura uma opinião me levou a desenterrá-lo do seu esquecimento. Em boa hora!
      É um livro belo, poético, triste. Sobre a fealdade da guerra e os seus despojos, sobre os livros “única porta de saída da prisão”, sobre o amor. Considero que os quatro protagonistas do romance – o doente inglês, Hana, Caravaggio e Kip – são náufragos da guerra, mas também sobreviventes ou pessoas em busca da sobrevivência.
      A acção principal decorre no final da guerra num antigo convento de freiras – a Villa San Girolano – a norte de Florença, que havia sido ocupado pelas tropas alemãs e posteriormente convertido em hospital pelos aliados, entrelaça-se com os testemunhos dos personagens nos seus relatos de vidas passadas no deserto da Líbia, em Inglaterra, no Canadá ou na Índia.
      Hana tinha sido a única enfermeira que ficara naquele antigo convento para tratar aquele doente terminal, sem nome e quase sem rosto devido às queimaduras. Edifício destruído e sem infraestruturas mínimas, com salas entaipadas por precaução devido às minas deixadas pelos alemães antes da fuga, dispunha de um espaço exterior onde era possível plantar alguns vegetais e uma biblioteca onde Hana ia buscar alguns livros que lia ao seu doente sem nome.
      Deitado num quarto semidestruído, as antigas pinturas em trompe l’oeil das paredes amenizam o seu sofrimento e a destruição deixada pela guerra, com o apoio da morfina e da companhia de Hana e das suas leituras. Espião ou aliado, aquele homem que trabalhara durante anos como explorador e cartógrafo do deserto africano e que um dia foi transferido para um hospital em Itália, apenas tinha consigo o livro de “Histórias” de Heródoto que resistira ao fogo e que estava repleto de notas pessoais e recortes.  O doente inglês era um enigma.
      É com a chegada de Caravaggio, um antigo amigo de família de Hana que ela considera como tio e posteriormente com a presença do sapador sikh Kirpal Singh (Kip) especialista em desactivar bombas de acção retardada ou bombas que ficaram por explodir, que se vai alterar o quotidiano do doente e da enfermeira. Através das suas conversas, dos relatos e episódios cuja leitura não é linear, antes lenta e irregular, vamos desvendando os enigmas das suas vidas, os amores, as traições, os caminhos percorridos até àquela villa em ruínas. Como náufragos. Como despojos de guerra.
      Na difícil busca de um equilíbrio naquela villa da região toscana, naquele dia de Agosto de 1945 tudo se desmorona com a notícia do lançamento de duas bombas sobre Hiroxima e Nagasáqui. Para Kip, o especialista sikh treinado pelo exército britânico para desmantelar bombas, que nunca entendera os motivos do seu irmão mais velho preso por se opor ao poder colonial opressor, é o mundo virado ao contrário e os olhos abertos para uma realidade que ele nunca quisera ver. É o virar as costas ao velho continente, o virar as costas ao seu amor por Hana e o regressar às origens, à Lahore que o tinha visto nascer.
      Penso que este romance, até pelas frequentes referências à literatura, à história antiga, aos costumes e sabedoria das tribos de beduínos, à geografia, à arte e cultura de Itália e de Florença é um manancial para que outros possam discorrer muito para além destas breves notas que aqui trago. A literatura é um tesouro que nem sempre valorizamos e às vezes temos livros que aguardam aquele dia para serem descobertos.

Março de 2018
Almerinda Bento

segunda-feira, 12 de março de 2018

"A Filha" de Anna Giurickovic Dato

Há livros com os quais os nossos sentimentos nāo sabem lidar. Porque nos marcam, porque nos fazem doer o coraçāo, porque sāo tāo duros e pesados que, embora nāo nos larguem em pensamento, escrever sobre eles torna-se doloroso. Este livro faz-me sentir assim. E foi por isso, que acabada a leitura, nāo sabia o que escrever... Ainda nāo sei bem, na verdade, e por essa razāo vou deixar a pena fluir.

Há temas que magoam qualquer pessoa, penso. Excepto, por  exemplo, os perpetradores desse crime hediondo que é a violaçāo infantil. A forma como essa violência é ignorada e mantida sob o mesmo tecto, os sinais que querem ser reconhecidos mas que ninguém vê com clareza e sobre os quais ninguém age, os gritos silenciosos de quem é abusado, a vingança possível.

Mas o que mais me marcou neste livro e sobre o qual nāo vos posso falar sob pena de vos revelar a parte que mais me impressionou, foi a forma como essa violência sistemática mudou a vítima. E quando a vítima é uma criança e quando temos na nossa frente o Horror da transformaçāo, entāo fechamos as páginas do livro e pensamos, pensamos, pensamos.

Uma palavra apenas: muito bom!

Terminado a 5 de Março de 2018

Estrelas: 6*

Sinopse
Uma versão moderna de Lolita, ambígua e perturbante, que põe em causa todas as nossas certezas.

Ambientado entre Rabat e Roma, A Filha coloca-nos perante uma perturbante história familiar, em que a relação entre Giorgio e a sua filha Maria oculta um segredo inconfessável. A narrar tudo na primeira pessoa está, porém, a mulher e mãe Silvia, cuja paixão pelo marido a torna incapaz de reconhecer a doença de que este sofre.
      Enquanto observamos Maria, que não dorme durante a noite e renuncia à escola e às amizades, revoltar-se continuamente contra a mãe e crescer dentro de um ambiente de dor e de suspeita, vamos pouco a pouco descobrindo a subtil trama psicológica dos acontecimentos e compreendendo a culposa incapacidade dos adultos em defender as fragilidades e as fraquezas dos filhos.
      Quando, após a misteriosa morte de Giorgio, mãe e filha se mudam para Roma, Silvia apaixona-se por Antonio, e o almoço que organiza para apresentar o novo companheiro à filha despertará antigos dramas: Será Maria de facto inocente, será realmente a vítima da relação com o seu pai? Então, porque tenta seduzir Antonio sob os olhares humilhados da mãe? E seria a própria Silvia verdadeiramente desconhecedora do que Giorgio impunha à filha?
      Um livro que põe em causa todas as nossas certezas: as vítimas são ao mesmo tempo algozes e os inocentes são também culpados.

Cris

domingo, 11 de março de 2018

Ao Domingo com... Maria Jorgete Teixeira


Nasci em Angola, na província do Cunene. Quando eu nasci a minha mãe estava sozinha, apenas na companhia de umas amigas uma vez que o meu pai tinha partido em comissão militar para Macau. A minha mãe regressou a Portugal tinha eu apenas um mês. Foi em casa dos meus avós paternos que passei os três primeiros anos de vida, entre as sopas de “calondro” da avó Maria e os cuidados das tias Emília e Cecília porque a minha mãe, entretanto, tinha adoecido com febre reumática o que a impedia de cuidar de mim.  Esse foi o meu ninho, o lugar de afecto sempre intacto.
      A minha infância foi passada entre Portugal e Angola, de onde saí definitivamente em 1961 devido ao início da guerra colonial. Esta partida constituirá um dos cortes mais sofridos da minha vida de criança. África com o seu calor, alegria e liberdade nunca saiu da minha memória.
      A adolescência, passada em Vila Real, foi uma época tristonha. Numa sociedade repressora e claustrofóbica, era complicado romper as correntes e descobrir os desafios próprios da idade. Mas foi aí que me formei, entre as leituras dos livros requisitados na Biblioteca itinerante da Gulbenkian, o Liceu e a escrita do diário e cartas para uma grande amigacom quem, em virtude de alguns problemas, comunicava muitas vezes através de cartas e bilhetinhos. Os
nossos escritos, para cá e para lá, foram alavanca para participar em concursos de escrita e alguma colaboração em jornais locais e escolares.
      A literatura sempre fez parte da minha vida, tanto a nível pessoal como profissional. Licenciei-me em Línguas e Literaturas Modernas e fui professora de Português no Ensino Básico e Secundário.
      Mas o tempo e outras actividades mais prosaicas e urgentes foram adormecendo em mim esta faceta até que ela ressurge como catarse e forma de superar uma fase mais complicada da vida. Comecei a escrever e publicar no Facebook (aliás o eco positivo que nesta rede social obtive foi determinante na decisão de editar) e em alguns jornais e revistas.  Participei ainda em algumas antologias, das quais destaco “Erotismus” por ser a primeira vez que vi as minhas letras escritas num livro.
      Em 2015 sai o meu primeiro livro a solo “O coração é puta sempre à espera” edição da Alfarroba. É um livro em prosa poética, intimista, que, apesar de conter textos isolados, tenta fazer o percurso da vida de uma mulher e de cuja edição, ilustrada, gosto particularmente.
      Em Novembro de 2017, também com a Editora Alfarroba, aventurei-me a publicar o livro de contos “Mulher à beira de uma largada de pombos” inspirados em canções de José Afonso.
      E gostaria muito de publicar ainda outras coisas, entre elas um romance.
      Será?

Maria Jorgete Teixeira

sábado, 10 de março de 2018

Na minha caixa de correio

  


Três livrinhos recebidos esta semana, cada um dirigido a um público diferente (ou nāo, pois se forem como eu gostam de deitar o olho a géneros diferentes...). Assim, chegaram cá a casa, oferecidos pelas editoras:
- 25 Gramas de Felicidade, Editora Nascente,
- Os Mauzōes, Porto Editora,
- A Pitada do Pai, Matéria Prima

quinta-feira, 8 de março de 2018

A Escolha do Jorge: "A Maldição de Hill House"



Hill House “é uma obra-prima de desorientação arquitectónica.” (p. 91)

“A Maldição de Hill House” é o terceiro romance de Shirley Jackson (1916-1965), publicado em 1959, sagrando a escritora norte-americana como uma das mais destacadas do país e mais representativas do século XX. Com uma obra relativamente curta, Shirley Jackson é, a par dos seus romances de grande envergadura, conhecida por ser uma das mais célebres contistas estadunidenses, tendo em consideração “The Lottery”, o conto polémico que arrastou a escritora para acesas polémicas face à natureza cruel da narrativa apresentada.
      “A Maldição de Hill House” é a segunda obra de Shirley Jackson a ser publicada no nosso país, quase uma década após a edição do romance “Sempre Vivemos no Castelo”, uma obra tenebrosa, gótica, que, a par da sua forma própria de contar as histórias, não há certamente leitores que não saiam das obras incomodados face à crueldade espelhada nos personagens criados. Quem não se recorda de Mary Katherine?
      Uma casa assombrada que foi palco dos mais diversos horrores ao ponto de ser considerada uma casa maldita, será o centro desta narrativa de terror considerado um dos grandes romances do género alguma vez escritos.
      John Montague, um antropólogo e estudioso de manifestações sobrenaturais recruta algumas pessoas propensas a estas temáticas, para passarem alguns dias em Hill House, a fim de registarem eventuais movimentações fora do registo da racionalidade. “(…) O nosso objectivo aqui, já que é científico e exploratório, não deve ser afectado, talvez até deturpado, por histórias fantasmagóricas meio esquecidas, mais apropriadas, digamos… para um encontro de adolescentes.” (p. 61)
      A par do organizador, participam na experiência, Luke, o futuro herdeiro de Hill House, Theodora, uma mulher excêntrica e inconsequente e com espírito aberto a novas experiências e ainda Eleanor, uma mulher solitária que nada tem a perder em participar no projecto de John Montague.
      Rapidamente o leitor percebe que a narrativa ganha forma com Eleanor e que será nela que Hill House ganha fôlego. Uma mulher que é o reflexo da fusão da culpa com o medo que exponenciados conduzem à loucura. Uma mulher sem vida própria, pobre e totalmente dependente da família da irmã é uma quase sem-abrigo que procura a expiação/redenção através desta possível experiência em Hill House. “As viagens terminam com o encontro dos amantes.” (p. 37) -  a frase enigmática que se repete ao longo de todo o romance.
      São belíssimas tanto quanto tenebrosas as descrições de Shirley Jackson no que concerne à chegada de Eleanor a Hill House. Rapidamente percebemos que algo se passa com esta mansão. Parece viva e a sua imponência é quase esmagadora perante o visitante que chega sem saber ao certo o que vai encontrar, por fora e por dentro.
      Os vários participantes vão chegando e os empregados da casa ditam as regras, sempre no mesmo tom, como se tudo fizesse (e faz) parte de um mesmo processo e sempre num registo para causar medo ou o receio de que irá acontecer alguma coisa e que ninguém está seguro, não havendo ninguém por perto, dado que Hilsdale, a localidade mais próxima, fica a sete quilómetros de distância, além do facto de os seus moradores não gozarem de fama de serem as pessoas mais simpáticas e acolhedoras.
      Hill House está construída de forma que quem quer que circule no seu interior fique com a sensação de estar num labirinto, nunca conseguindo chegar à sala principal. “(…) O resultado de todas estas pequenas aberrações de medidas somadas umas às outras gera uma distorção total da casa. (…) [Hill House] é uma obra-prima de desorientação arquitectónica.” (p. 91) As experiências assombrosas tanto quanto tenebrosas vão tendo lugar noite após noite, assustando os vários participantes da experiência, de forma que o medo se vai instalando aos poucos, devagarinho, ao ponto de todos terem ficado contagiados ainda que John Montague desvalorizasse continuamente. “O medo (…) é a renúncia da lógica, a renúncia voluntária de padrões razoáveis. Ou nos rendemos a ele, ou lutamos contra ele, mas não podemos ficar no meio-termo.” (p. 134) “Nunca houve nenhum fantasma, em todas as longas histórias de fantasmas, que tivesse magoado alguém fisicamente. Os únicos danos são causados pela própria vítima a si mesma. Nem sequer se pode dizer que os fantasmas atacam a mente, porque a mente, o consciente, a mente racional, é invulnerável; no consciente de todos nós, enquanto estamos aqui sentados a conversar, não existe uma gota de crença em fantasmas. (…) Não, a ameaça do sobrenatural é que ataca o ponto mais fraco da mente moderna, o ponto onde abandonámos a armadura protectora da superstição sem a substituirmos por qualquer outra defesa.” (pp. 117-118)
      A semana vai decorrendo ao sabor do medo provocado pela excitação das experiências com o sobrenatural em Hill House até que a reviravolta ocorre com a entrada em cena da esposa de John Montague. Hill House é provocada, mas há alguém sensível aos apelos da mansão, deixando-se seduzir por esta. O desenlace final é inesperado e a loucura ganha uma dimensão ainda não vista. Garantidamente ninguém sai ileso da experiência de Hill House, nem os participantes, nem nós leitores!
      Shirley Jackson transformou “A Maldição de Hill House” num verdadeiro masterpiece da literatura contemporânea e uma das referências do género de terror. “A Maldição de Hill House” foi adaptada ao grande ecrã, em 1963 e 1999, e, este ano, conhecerá uma nova adaptação para uma série de televisão.

Texto da autoria de Jorge Navarro