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sábado, 30 de novembro de 2024
sexta-feira, 29 de novembro de 2024
"A Canção do Rio" de Eleanor Shearer
É ficção pelo que as personagens que nele surgem não existiram mas relata uma realidade passada no séc. XIX, 1834, maioritariamente na Ilha de Barbados. Mesmo após o fim da escravatura, os escravos ficariam a servir como aprendizes durante seis anos para o mesmo senhor. Ou seja, continuariam escravos, com as mesmas condições (ou falta delas!).
Para Rachel, a protagonista desta história, foi a gota de água. O seu pensamento permaneceu sempre com as cinco crianças que lhe foram tiradas e das quais nada sabia. A sua fuga para Bridgetown, que depois a levou para outros sítios, em busca dos filhos é um caminho que percorremos com ela, partilhando os seus medos de ser descoberta, as suas alegrias e tristezas ao saber dos seus destinos. Fica-se preso às palavras da autora que tão bem soube traduzir esses sentimentos e passá-los para o leitor.
Não é difícil imaginar situações semelhantes que terão ocorrido nessa época nem tampouco extrapolar para outros relatos que conhecemos. As dificuldades dos ex-escravos não acabaram com o fim da escravatura e o racismo, infelizmente, nos dias de hoje ainda mostra os seus dentes.
Gostei e recomento muitíssimo esta leitura que se faz num ápice pese embora as suas 300 páginas. Nada em demasia, sem tempos mortos, um livro perfeito para quem gostar desta temática.
Terminado em 15 de Setembro de 2024
Estrelas: 6*
Sinopse
«É isto a liberdade?», pergunta-se Rachel enquanto corre por uma floresta mergulhada na escuridão.
Aterrorizada e exausta, foge da plantação onde passou toda a vida, do trabalho exaustivo e de um patrão brutal.
O mesmo que, naquela manhã de 1834, anunciou o fim da escravatura para depois acrescentar que todos teriam de servir como aprendizes durante seis anos ao abrigo da Lei da Emancipação.
Um escárnio cruel.
Foi então que algo em Rachel estalou.
Porque dentro dela há cinco rostos que o tempo não pôde apagar: os das crianças que lhe foram arrancadas, empurradas para um destino que ignora.
Estarão vivas? Serão escravas como ela? Se os encontrasse, reconhecê-la-iam? Encontrar os filhos torna- se a verdadeira liberdade.
A viagem é difícil, o caminho longo e perigoso, as informações não são de fiar, tal como as pessoas que lhe oferecem ajuda.
No entanto, ela continuará até que as histórias dos filhos – como as águas de um rio – se fundam com a sua, para criar uma história maior, a de uma família.
Só então, e pela primeira vez, será livre.
Dos campos de Barbados ao movimentado mercado de Bridgetown, da Guiana Britânica às florestas de Trindade, nestas páginas desenrola-se uma viagem de esperança, um hino à força do sangue e ao amor infinito de uma mãe.
Cris
quinta-feira, 28 de novembro de 2024
A Convidada escolhe: "Um Cão no Meio do Caminho"
A escrita de Isabela Figueiredo não me desilude. Depois de “A Gorda” e de “Caderno de Memórias Coloniais”, este, que é o mais recente romance da autora, tem a fluidez e a sinceridade de um romance do quotidiano, das pessoas concretas e nem sempre visibilizadas. Logo a começar o romance, a autora aguça o interesse para a leitura do que virá a seguir: “Quando conheci a minha vizinha do lado a minha vida mudou” (pág. 19) e termina com “ninguém entra na nossa vida por acaso” (pág. 292).
Um romance sobre a solidão, as solidões. Será a solidão uma escolha ou antes fruto de alguma coisa que correu mal? As famílias que se desentenderam? Uma paixão não correspondida? Uma mágoa que não se apagou? José Viriato e Beatriz são dois recolectores: do lixo dos outros, dos “despojos de consumo excessivo” (pág. 45), de cenas, imagens, detalhes captados em fotografias. Cada um com o seu percurso. Ele escolheu viver a sua liberdade, sem conta bancária nem patrões, fazendo o seu próprio horário ao avesso do dos outros; ela enclausurou-se, rodeou-se das suas lembranças, era misteriosa, com a alcunha de “Matadora” para os vizinhos que viam nela uma personagem de filme policial. Se a avó Josefa a viver em Mafra era a única familiar de José Viriato, os cães – Nossa Senhora e Revoltado – livres como ele, eram os seus companheiros e a sua “prioridade” (pág. 87). Beatriz não tinha qualquer familiar e a única amiga que tivera – Nani – há muito falecera.
Estamos no final da segunda década de 2000, antes da pandemia, o contexto que se vive no mundo e na Margem Sul, onde vivem, é-nos recordado: a violência no Brasil de Bolsonaro, a revolta dos coletes amarelos em França, o surgimento de um partido de extrema-direita em Portugal, as incursões racistas da polícia no Bairro da Jamaica. Observador atento aos pormenores, “às miudezas” (pág. 72), sentado no Café Colina, José Viriato atenta no envelhecimento das pessoas e na triste realidade de que “destratar os velhos se tornara costumeiro” (pág. 76) o que lhe traz sentimentos de culpa, ele também pouco atento e nada presente na vida da avó, “alguém na prateleira” (pág. 78), a viver sozinha em Mafra.
As suas histórias que estes dois solitários vão partilhar um com o outro vão-nos sendo desvendadas em flashbacks e igualmente esses episódios das suas vidas vêm agarrados à história, aos tempos a seguir à revolução, as eleições presidenciais, os retornados, os anos 80 e a droga. E se o passado foi decisivo para o que eles são na actualidade, o título do terceiro e último capítulo do romance – “O passado acabou” – é o apaziguamento de duas pessoas que conseguiram ultrapassar a sua solidão, apoiando-se, sem deixarem de ser livres e independentes.
Uma bela história de superação. E de esperança. Nada escrevi aqui sobre Cristo, o primeiro cão de José Viriato e sobre a relação entre eles, tão importante em momentos difíceis no desenrolar da sua adolescência. Fico-me por algumas citações: “Ele não era a minha sombra, mas uma parte de mim” (pág. 153), “Os cães eram a única prisão na qual queria viver” (pág. 239), “O Cristo e o lenço da minha mãe foram a única bagagem que carreguei para casa da minha avó.” (pág. 203).
7 de Novembro de 2024
Almerinda Bento
quarta-feira, 27 de novembro de 2024
"Morte na Pérsia" de Annemarie Schwarzenbach
Falaram-me desta autora e a minha curiosidade levou a melhor, tanto mais
que tinha cá este livro à espera de vez! A nota biográfica, que vem no final do livro, transporta-nos para uma vida fantástica e muito atribulada para quem viveu no início do séc. XX (nasceu em 1908, em Zurique) e morreu tão jovem, apenas com 35 anos. Filha de uma próspera família, viveu em Berlim. Era alguém que desde cedo contestou os padrões da época e que conheceu mundo com as viagens que realizou.
O tom desta obra é intimista, criando uma proximidade com o leitor. Creio que tem de ser lido tendo sempre em perspectiva a época em que foi escrito e o quão revolucionária foi a sua visão do mundo. Gostava muito de ler uma sua biografia. Ativista, lutou contra o nazismo e tentou criar forma de viver a sua identidade homossexual numa época em que, como sabemos, isso não era possível. As muitas viagens que fez pelo mundo levaram-na a escrever sobre elas e o que via e sentia.
“Mas estará votado à indiferença tudo o que empreendemos, mesmo quando empenhamos todas as nossas forças e vivemos a nossa vida até ao fim sem cair no desespero? A fuga, as tentativas de escapar, os passos errantes que me trouxeram até aqui, ao limite mais extremo, não será tudo isso falso? Se tivesse resistido à doença e ao medo, teria uma vida melhor e mais corajosa? Serei alguma vez chamada a prestar contas, apenas porque não enfrentei o desespero atormentado e sem nome?” pág 139
Embora, como referi, gostasse muito de ler algo sobre ela, a sua escrita não me apaixonou sobremaneira. No entanto, fica aqui a dica.
Terminado em 7 de Setembro de 2024
Estrelas: 3*
Sinopse
«"Morte na Pérsia", livro escrito na primeira metade dos anos 30 mas que se manteria inédito até 1995, é um relato de viagens como nenhum outro. Annemarie parte para tentar escapar à ascensão alarmante do nazismo na Europa mas também à família, à infelicidade amorosa e à sua própria depressão. Empreende assim uma viagem em que se depara com a impossibilidade radical de fugir de si mesma. As paisagens persas adquirem as tonalidades da melancolia e da angústia da escritora. É esta viagem, simultaneamente por estrada e pelos atalhos mais recônditos da alma humana, que faz de "Morte na Pérsia" um livro comovente.»
Carlos Vaz Marques
Cris
terça-feira, 26 de novembro de 2024
Resultado do Passatempo "Toca a comentar!" - Mês de Outubro
Este é o link para o post onde se encontra anunciado o passatempo.
Assim, através do Random.Org, de todos os comentários efectuados nesse mês, foi seleccionada uma vencedora! Foi ela:
Parabéns! Terás que comentar este post e enviar um email para otempoentreosmeuslivros@gmail.com até ao próximo dia 5, com os teus dados e escolher um de entre estes dois livros:
sábado, 23 de novembro de 2024
quinta-feira, 21 de novembro de 2024
"Niketche, Uma História de Poligamia" de Paulina Chiziane
Já não tenho recordações muito específicas da história deste livro mas a ideia geral está ainda cá. É o que dá não fazer as opiniões a quente, como gosto…
“Mães, mulheres, invisíveis mas presentes.(…) Mulheres de ontem, de hoje e de amanhã, sem esperança de mudanças.” pág 97. Considerei esta frase o cerne da história deste livro que nos conta a vida de Rami, moçambicana do sul do país, seu marido Tony e suas outras mulheres. Nada do que eu possa dizer aqui constitui spoiler visto que o título é bastante elucidativo.
Foi um mergulhar noutro país, noutra cultura, com tudo o que isso pode trazer de estranheza mas também de conhecimento e reflexão posterior. Rami é uma mulher forte. Ela não sabe disso mas vai descobrindo toda essa força quando se dá conta de quanto vivia à margem da vida do seu amor, Tony. As outras mulheres que ele possui vão aparecendo na vida de Rami aos poucos e o choque é brutal. Mas… ainda bem que nas histórias de ficção (e nas reais também!) há sempre um mas, uma reviravolta que por vezes é dolorosa, em que se descobrem forças onde pensamos não existir!
Narrativa efetuada na primeira pessoa, bastante fluida, embora tivesse sentido que em alguns momentos se foi arrastando. A personagem central cresce psicologicamente no decorrer desta trama, começando por reconquistar o marido que a trai e evoluindo posteriormente nesse seu querer, equacionando a melhor forma de tratar “esse assunto”. Confesso que partes houve que o meu estômago se revolveu bastante! Mas gosto disso porque considero que retrata com bastante veracidade muitas das realidades vividas não só em África.
Muitas questões são colocadas por Paulina Chiziane nesta obra. Machismo, traição, maternidade vs paternidade, relações de género, de poder, emancipação feminina, colonização, são alguns dos temas que podem gerar um debate muito interessante em torno deste livro.
Gostei e recomendo.
Terminado em 03/09/2024
Estrelas: 4*
Sinopse
Rami, casada há vinte anos com Tony, um alto funcionário da polícia, de quem tem vários filhos, descobre que o partilha com várias mulheres, com as quais ele constituiu outras famílias. O seu casamento, de «papel passado» e aliança no dedo, resume-se afinal a um irónico drama de que ela é apenas uma das personagens. Numa procura febril, Rami obriga-se a conhecer «as outras». O seu marido é um polígamo! Na via dolorosa que então começa, séculos de tradição e de costumes, a crueldade da vida e as diferenças abissais de cultura entre o norte e o sul da terra que é sua, esmagam-na. E só a sabedoria infinita que o sofrimento provoca lhe vai apontando o rumo num labirinto de emoções, de revelações, de contradições e perigosas ambiguidades. Poligamia e monogamia, que significado assumem? Cultura, institucionalização, hipocrisia, comodismo, convenção ou a condição natural de se ser humano, no quadro da inteligência e dos afectos? Paulina Chiziane estende-nos o fio de Ariadne e guia-nos com o desassombro, a perícia e a verdade de quem conhece o direito e o avesso da aventura de viver a vida. Niketche, dança de amor e erotismo, é um espelho em que nos vemos e revemos, mas no qual, seguramente, só alguns de nós admitirão reflectir-se.
"Dizem que sou romancista e que fui a primeira mulher moçambicana a escrever um romance (Balada de Amor ao Vento, 1990), mas eu afirmo: sou contadora de estórias e não romancista. Escrevo livros com muitas estórias, estórias grandes e pequenas. Inspiro-me nos contos à volta da fogueira, minha primeira escola de arte. Nasci em 1955 em Manjacaze. Frequentei estudos superiores que não concluí. Actualmente vivo e trabalho na Zambézia, onde encontrei inspiração para escrever este livro." Paulina Chiziane
Cris
sábado, 16 de novembro de 2024
sexta-feira, 8 de novembro de 2024
"Olive Kitteridge" de Elisabeth Strout
Andava há muito para ler esta obra e espero não demorar tanto a ler a sua continuação pois, temo, será fácil esquecer-me de pequenos detalhes que podem fazer a diferença numa leitura.
No princípio não me cativou como esperava, sobretudo porque não conheço ninguém que o tenha lido e que não tenha gostado muito. Pensei por isso que entraria na história num ápice! Não foi assim e custou-me dar conta de tantas personagens e suas histórias pessoais que gravitam em torno de Olive e marido. Tampouco fixei seus nomes...
Da história de Olive, sim, gostei muito e fiquei muito curiosa em saber mais sobre ela. Apreciei, sobretudo, a forma como esta personagem foi construída e o seu carácter, das suas falhas enquanto ser humano, do seu crescimento, da maturidade crescente que lhe advém com a idade. Com muitas camadas, não é fácil sentir empatia com esta personagem de grande porte fisico e muito ríspida, para com os que a rodeiam, inclusive o seu marido que é um doce de pessoa. E, no entanto, é precisamente isso - essa complexidade - que é de particular interesse para o leitor.
Quero ler o quanto antes a "A Segunda Vida de Olive Kitteridge" e ver a mini série da qual já ouvi falar bem!
Terminado em 26 de Agosto de 2024
Estrelas: 5*
Sinopse
A obra mais importante e comovente de Elizabeth Strout, autora premiada de O meu nome é Lucy Barton e Tudo é possível. Em Crosby, uma pacata povoação costeira no Maine, todos conhecem Olive Kitteridge, a temível professora de Matemática do liceu, agora reformada, e Henry, o seu marido, farmacêutico gentil.
Lamentando os ventos de mudança que varrem a sua vila e o mundo, sempre pronta a apontar um dedo crítico, Olive nem sempre dedica aos que a rodeiam a sensibilidade ou tolerância que mereceriam.
Mas à medida que todas estas vidas se vão entrelaçando, Olive começa a conhecer-se melhor e a compaixão pelos outros e por si própria ganha terreno ao preconceito."
Cris
quarta-feira, 6 de novembro de 2024
"Deriva" de Madalena Sá Fernandes
Leitura leve e algo divertida com um humor próprio que, em algumas situações, me fez sorrir.
Pequenos apontamentos do quotidiano vividos pela autora e traduzidos em pequenas crónicas.
Confesso que pelo hype que esta autora teve com o seu primeiro livro (que quero ler), "Leme", ia com expectativas altas para esta leitura e que, se não foram de todo defraudadas, também não corresponderam ao esperado!
Houve, no entanto, algumas crónicas que considerei mais oportunas/engraçadas:
- sobre considerações entre a diferença linguística Portugal vs Brasil
- sobre o cão Jesus e sendo ela Maria Madalena, ficou "montado um evangelho"
- sobre a Turquia
Não é um género que me atraia particularmente mas o humor de algumas crónicas é bom!
Terminado em 20 de Agosto de 2024
Estrelas: 4*
Sinopse
«Uma viagem vem connosco quando acaba.»
Das saudosas férias em família à dormida penosa numa cama com percevejos; da aprendizagem lenta da solidão ao ódio às festas de casamento que mais parecem carnavais; do martírio da insónia às árduas negociações entre mãe e filhas; da navegação cega pelas redes sociais ao poder conciliatório da literatura; da redescoberta da terapia ao reencontro com um primeiro amor: Deriva deambula por assuntos tão diversos e inesperados quanto o ângulo espirituoso ou afiado que Madalena Sá Fernandes escolhe para os abordar.
Um livro que confirma a desenvoltura literária de uma escritora que, olhando para si mesma e para o que a rodeia, devolve a cada leitor uma espécie de reflexo no espelho.
Cris
segunda-feira, 4 de novembro de 2024
"Ela é Apenas Mulher" de Maria Archer
Numa altura em que a mulher era tratada, como fada do lar ou como moura de trabalho ou ainda, como mulher de má fama, Maria Archer traz-nos uma Esmeralda que é um pouco das três e este livro, caiu de supetão num Portugal moralista e de falsos costumes, em plena ditadura fascista e possuidor de uma censura impiedosa.
Com uma linguagem directa, crua, Maria Archer põe a nú os podres de uma sociedade em que a Mulher tem de pertencer a uma das três categorias acima referidas pelo que todas as que fugissem desse padrão não se enquadrariam.
Para além de Esmeralda temos tantas outras mulheres que giram em torno dela e que reproduzem fielmente os padrões de então. Implicitamente durante todo o romance, uma crítica ao Homem e aos padrões morais defendidos na época.
Maria Archer foi acusada de atentado ao pudor. Um livro que, infelizmente, ainda é actual. Porque em muitos lugares, ainda somos apenas mulheres. Permitirá a História da Literatura continuar a manter esta autora apagada?
Gostei e recomendo muito esta leitura.
Terminado em 19 de Agoato de 2024
Estrelas: 6*
Cris