"Um dia… o dia não se repete", Ana Paula Timóteo, ilustrações de Susana Matos, 2014
Sabendo do meu gosto pela leitura e pela escrita, Ana Paula Timóteo já me tinha falado do seu livrinho de contos breves e muitas histórias que tinha feito em parceria com uma talentosa amiga ilustradora de seu nome Susana Matos. Adquirido na última Feira do Livro de Lisboa, não foi um livro lido de uma assentada, antes intervalou outras leituras e, embora seja um livro, pelas suas características, a que apetece voltar mais vezes, foi uma das minhas leituras num Verão excessivamente quente.
Há uma nostalgia, uma melancolia, um olhar para um "paraíso perdido" na maior parte dos contos de Ana Paula Timóteo. Os animais, os velhos e a velhice são personagens e temas com frequência presentes nas suas histórias. O fim da meninice e, um dia, a surpresa de se perceber que a meninice acabou e que a velhice bate à porta… é o "corpo" do conto "As Férias" sempre marcadas para o dia 25 de Junho! É este o conto que dá título ao livro de Ana Paula Timóteo – "Um dia, o dia não se repetiu".
Apenas refiro alguns dos contos, em especial os que mais me disseram ou com os quais mais me identifiquei. "A Insónia" quando temos um despertador dentro de nós que, como por magia, nos desperta todos os dias sempre à mesma hora e que um dia, por força dos comprimidos, nada nem ninguém nos acordam quando tudo abana à nossa volta. "O Ritual" é a história dos sonhos que ficaram por cumprir. Quando tudo passou e as rotinas junto ao fogão em volta dos empadões, dos biscoitos para o cão e dos bolos para a professora de piano fazem parte de um passado já esquecido, só restam os gestos da mãe tocando ao fim do dia num piano imaginário. "O Bolachas" é um dos contos que fala daqueles animais que um dia entram na nossa vida. "A Lei" é uma história triste de uma sociedade que descarta os velhos e não lhes concede qualquer valor. A nossa! Também em "D. Cecília" temos as rotinas de um lar de idosos e uma reflexão sobre o que é individual e particular num espaço que uniformiza e retira identidade às pessoas que lá estão. "Alberto" é a história das pessoas que são diferentes, que não se integram na sociedade tal como ela está "organizada", que apenas são acolhidas e acarinhadas pelos pais, neste caso a mãe, até ao dia em que ela parte… "O Silêncio" – recordou-me "a cegueira" de Saramago – pode afinal ser uma bênção inesperada, um recomeço, um reaprender a viver e a comunicar. Em "A Parede" surgem-nos os medos que todos/as temos; os limites que não queremos passar; as dúvidas, as interrogações e o desconhecido que nos fascinam, mas nos tolhem.
As ilustrações de Susana Matos são maravilhosas. Delicadas, minuciosas, feitas com pequenos traços a preto e branco, contam histórias e completam os contos de Ana Paula. Certamente constituiu um privilégio a colaboração desta ilustradora neste livrinho de contos datado de 2014.
Almerinda Bento
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