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sexta-feira, 31 de março de 2017

"O Poder das Pequenas Coisas" de Jodi Picoult

Já perdi a conta aos livros que li desta escritora! Sei que serei sempre uma sua fā. Incondicional. Digam o que disserem dela (algumas opiniōes sugerem que a sua escrita é algo lamechas!) eu adoro a sua forma tāo cativante de escrever que agarra a minha atençāo logo nas primeiras palavras. Nāo preciso de apontar num papel o nome dos personagens com medo de os trocar e de nāo saber quem sāo.  Nāo preciso de procurar palavras no diccionário. Gosto dos temas que aborda, que nāo sendo de todo leves, sāo surpreendentemente actuais.

Percebe-se que Jodi nāo pega numa caneta ou num teclado e começa a escrever sem pensar. Nāo. O assunto é cuidadosamente escolhido e abordado, possuindo como pano de fundo uma pesquisa exaustiva que aprofunda verdadeiramente e isso transmite ao leitor uma confiança e serenidade que impedem que determinados assuntos sejam tratados com leviandade. Gosto disso. Faz-me pensar como reagiria a determinadas situaçöes e repensar as minhas acçōes, se preciso for. 

Desta feita o tema tratado é o racismo. E mais do que a igualdade de raças que seria de desejar, fala-se aqui de equidade. As mesmas oportunidades para todas as raças segundo as diferenças de cada pessoa. Mais do que tratar toda a gente por igual é dar justas oportunidades consoante as diferenças de cada um de modo a poder ter êxito. Nāo vos vou contar esta histôria mas podem ler a sinopse para ficarem com um cheirinho do que este livro contém. E contém muito. Tanto que as 500 páginas voaram. Literalmente.

Small Great Things, o título original, como refere a autora nas consideraçöes que faz no final, é uma referência a uma citaçāo de Lutter King, que nāo posso deixar de mencionar aqui: "Se nāo posso fazer grandes coisas, posso fazer pequenas coisas de uma forma grande".

Recomendo. Leiam, vá! 

Terminado em 30 de Março de 2017

Para ter mais informações sobre este livro, consulte o site da Editorial Presença aqui.

Estrelas: 5*

Sinopse
Ruth Jefferson é uma enfermeira obstetra com mais de vinte anos de experiência. Um dia, durante o seu turno, começa uma avaliação de rotina a um recém-nascido. Minutos depois é informada de que lhe foi atribuído outro paciente. Os pais do bebé são supremacistas brancos e não querem que Ruth, afro-americana, toque no seu filho. O hospital acede a esta exigência, mas no dia seguinte o bebé enfrenta complicações cardíacas. Ruth está sozinha na enfermaria. Deve ela cumprir as ordens que lhe foram dadas ou intervir? O que se segue altera a vida de todos os intervenientes e põe em causa a imagem que têm uns dos outros.

Cris

quinta-feira, 30 de março de 2017

Novidade Nascente


Novidade Manuscrito

12 ingredientes, 60 receitas para toda a família

de Maria João Clavel
Neste livro encontra 12 «superalimentos» portugueses. Não, não têm nomes esquisitos, nem precisa de os ir comprar a nenhuma loja de especialidade. Basta abrir a despensa e/ou a porta do seu frigorífico. Não acredita? Ora veja: aveia, beterraba, morangos, pescada, cavala, frango, abóbora, amêndoa, pera, batata-doce, tomate, ervilha.
A partir destes 12 ingredientes nutricionalmente fabulosos, cultivados e criados nas nossas terras e mares, Maria João Clavel, autora do blogue e da escola de cozinha Clavel’s Kitchen, apresenta 60 deliciosas receitas para o dia a dia.
Em vez de usar abóbora apenas na sopa ou para fazer doce, que tal experimentar uns noodles de abóbora com pesto de espinafre? A beterraba pode ser usada, para além das saladas, numas saborosas panquecas de beterraba com robalo grelhado. Já tentou fazer leite-creme de aveia? Ervilhas com ovos escalfados ou tarteletes integrais de ervilha com crocante de bacon? Já experimentou cavala, um peixe tipicamente português? Os seus filhos fogem da pescada cozida a sete pés, mas e se experimentar pescada no forno com migas?

Novidade Clube do Autor

Imaculada
de Paula Lobato de Faria
Esta é uma história inspirada em acontecimentos reais em que a dualidade de ser e de parecer, da lealdade e da traição, do amor e da obrigação nos leva a caminhos imprevisíveis.

Portugal, 1956.
Tempo da ditadura de Salazar, da censura e da PIDE . Numa família da alta burguesia, no interior do país, o lema “Deus, Pátria e Família” é sagrado . Mas a vida estremece quando na casa dos Correia bate à porta o amor e o desejo de liberdade .

«Apenas um por cento é baseado em memórias e todo o resto na imaginação, mas muitos leitores vão aqui identificar pessoas que conheceram durante a vida, pois os personagens desta trama são gente comum, de carne e osso», avança a autora nas primeiras páginas do romance.

Novidade Quinta Essência

Desaparecida
de Elizabeth Adler 
Ao entardecer, na belíssima paisagem do Mar Egeu, uma mulher de cabelos ruivos cai da amurada de um iate de luxo. Em terra, o pintor Marco Polo Mahoney vê a queda, percebe que a jovem está ferida e assiste, perplexo, à embarcação a afastar-se deliberadamente. Marco tenta imediatamente salvá-la mas não a consegue encontrar. É como se a bela ruiva nunca tivesse existido. Mas ele tem a certeza do que viu. E está disposto a tudo para resolver o mistério.
Angie Morse acabou de ser atingida na cabeça com uma garrafa de champanhe. Caiu no mar, ferida, e os seus companheiros parecem estar a abandoná-la. O iate onde ela seguia está a afastar-se, levando consigo os supostos amigos e o namorado. E, embora cada um deles tivesse algo contra si, Angie estava longe de imaginar que quisessem vê-la morta. Agora, enquanto as ondas a tentam submergir, invade-a um sentimento apenas: raiva.
É a raiva que lhe vai dar forças para sobreviver… e também para se vingar…

Novidade Presença

Rumo a Casa
de Yaa Gyasi
Effia e Esi, filhas do mesmo pai, nasceram em aldeias diferentes do Gana do século XVIII. Effia casa com um inglês e vive confortavelmente no Castelo da Costa do Cabo. Já Esi, sem que Effia saiba, vê-se aprisionada nas masmorras do mesmo castelo, vendida como escrava e enviada para a América. Rumo a Casa retrata magistralmente o suceder de gerações a partir de Esi e Effia, no Gana e nos Estados Unidos da América. As duas descendências, com os seus episódios íntimos, belos e dramáticos, mostram-nos a história da escravatura e da cultura afro-americana nos continentes africano e americano até à atualidade, lado a lado num fio que se poderá unir.
Esta estreia literária de Yaa Gyasi, nascida em 1989, arrebatou a crítica e os leitores, tornando a autora numa das vozes mais promissoras da literatura norte-americana.

Para saber mais informações sobre este livro, consulte o site da Editorial presença, aqui.

Novidade Minotauro

A Última Paragem
de Matt de la Peña
A mais recente obra de Matt de la Peña, ilustrada por Christian Robinson, é um livro emotivo e estimulante que já ganhou o prémio Newbery no ano de 2015 – o segundo livro ilustrado a ganhar este prestigiado prémio como melhor livro infantil em geral. A Última Paragem conta a história de um rapaz afro-americano chamado Alex que, após ir à igreja todos os domingos, apanha o autocarro com a sua avó e atravessam a cidade rumo à Sopa dos Pobres, onde são voluntários. No entanto, no dia em que decorre a ação, ele faz muitas perguntas à sua avó: porque não têm um carro como o seu amigo Bernardo? Porque não tem um iPod como os outros meninos no autocarro? Porque têm sempre de descer na parte mais suja da cidade? Todas estas questões são clarificadas pelas respostas animadoras da avó, que o ajuda a ver a beleza e a diversão daquela rotina e do mundo à sua volta.
Esta viagem, cheia de energia, caraterística de uma cidade movimentada, dá relevo a um olhar maravilhoso, que só pode ser partilhado entre avós e netos, ganhando vida através da escrita vibrante do escritor hispânico Matt de la Peña, autor de cinco livros juvenis muito populares: Ball don’t lie, Mexican WhiteBoy, We were here, I will save you e The Living. La Peña é também autor do premiado livro ilustrado A Nation’s Hope: The Story of Boxing Legend Joe Louis (ilustrado por Kadir Nelson). Christian Robinson é ilustrador e já colaborou com a Pixar Animation Studios e a Sesame Street Workshop.

Novidade Marcador

O Ano da Dançarina
de Carla M. Soares
No ano de 1918, o jovem médico tenente Nicolau Lopes Moreira regressa da Frente francesa, ferido e traumatizado, para o seio de uma família burguesa de posses e para um país marcado pelo esforço de guerra, pela eleição de Sidónio Pais e pela pobreza e agitação social e política.
No regresso, Nicolau vê-se confrontado com uma antiga relação com Rosalinda, dançarina e amante de senhores endinheirados, e com as peculiaridades de uma família progressista.
Enquanto a Guerra se precipita para o fim e, em Lisboa, se vive a aflição da epidemia e da difícil situação política, a família experimenta o medo e perda, e Nicolau conhece um amor inesperado enquanto trava as suas próprias batalhas contra a doença e os próprios fantasmas.
Este é um romance de grande fôlego, histórico, empolgante e profundo, sobre a superação pessoal e uma saga familiar num tempo de grande mudança e turbulência em Portugal.

segunda-feira, 27 de março de 2017

"A Avó e a Neve Russa" de Joāo Reis

O que acontece quando um amor tremendo a uma avó doente faz um menino de dez anos procurar fora de portas um cacto para fazer um chá de forma a que ela melhore? E o que acontece quando a sua inocência e o seu amor são tão grandes que tudo fazem para não perceber que a avó não mais poderá respirar livremente e que o seu destino está traçado?

Esta é a história de um menino que a vida maltratou a ponto de só ter por perto uma avó muito doente, atacada por "ventos atómicos" (leia-se, vítima do acidente de Chernobyl) e um irmão mais velho que fuma "fumos medicinais". 

Escrito de uma forma sublime, irrepreensível até, com uma simplicidade tal que roça a complexidade, não pude deixar de admirar, enquanto lia e me mantinha atenta à história, da dificuldade que deve ser escrever com tanta subtileza. Escrito na voz de uma criança ingénua mas, ao mesmo tempo, com uma grande experiência que advém do sofrimento, este livro apaixona de imediato o leitor. A voz de um menino que age como um homem mas que sente como uma criança! Perfeito!

E o que acontece quando tudo isto está num livro? O leitor sorri amiude, entristece-se com as verdades e mentiras que mantêm a sociedade (de ontem e de hoje), respira a inocência e a fina ironia destas páginas escritas por um menino que à sua maneira nos conta como vive o mundo e o que vê ao seu redor.

Perfeito, como já referi. Um livro a ser lido por todos.

Terminado em 25 de Março de 2017

Estrelas: 6*

Sinopse
«As folhas caídas das árvores giram à minha volta com o vento, mas aperto mais o casaco, porque nem o vento nem as folhas- -bailarinas me alegram com a melancolia, só me deixam ensopado em tristeza, como a chuva nos faz por vezes. Os homens não choram. Avanço. Os catos que vejo alinhados na rua voltam a ser árvores e a Babushka, deitada na cama de hospital, é uma criança que aumentou e encolheu.» Babushka está doente. Esta russa idosa, emigrante no Canadá, sobreviveu ao acidente nuclear de Chernobyl. Esconde no peito a doença que a obriga a respirar a contratempo e lhe impõe uma tosse longa e larga e comprida e sem fim — um mal que a faz viver mergulhada nas memórias do seu passado luminoso, a neve pura da Rússia, recordação sob recordação. Na fronteira com a realidade caminha o seu neto mais novo, de dez anos, um menino que não desiste de puxar o fio à meada e de tentar devolver a avó ao presente. Para ajudar Babushka, precisa de encontrar uma solução para os seus pulmões destruídos, sacos rasgados e quase vazios — mesmo que isso o obrigue a crescer de repente e partir em busca de uma planta milagrosa, o segredo que poderá salvar a família e completar a matriosca que só ele vê. Narrado na primeira pessoa e escrito a partir da perspetiva de uma criança, "A Avó e a Neve Russa" é um livro feito da inocência e da coragem com que se veste o deslumbramento das infâncias. Romance simples e emotivo sobre a força da memória e da abnegação, relata a peregrinação de um neto através da esperança, do Canadá ao México, para encontrar a possibilidade de um final feliz.
Cris

sábado, 25 de março de 2017

Na minha caixa de correio

  

  

Ofertado pelas editoras parceiras do blogue (às quais agradeço a alegreia dada!), chegaram cá a casa:
Silêncios de Amor da Topseller,
O Feitiço de Marraquexe da Porto Editora,
Isabel de Aragão da Manuscrito,
Ofertado pela autora, Joana Santos Silva, "Oníria".
Ganho nos passatempo do JN, Um Lugar Chamado Angola e O lIvro Grande de Tebas Navio e Mariana,
Oferta de um amigo, "Mil Anos de Esquecimento.


sexta-feira, 24 de março de 2017

"A Serpente do Essex" de Sarah Perry

Este livro manteve-me expectante quase até metade das suas 400 páginas. Confesso até que um pouco duvidosa sobre o prazer que iria retirar da sua leitura. A Serpente de Essex? O título fez-me lembrar imediatamente algo irreal e acredito que escrever sobre monstros marinhos e suas lendas não deva ser tarefa fácil porque pode-se cair em efabulações que, particularmente, não me entusiasmam muito. No entanto, isso não se verificou de todo! O livro é de fácil leitura, com uma escrita atractiva.

A acção remete-nos para Inglaterra, por volta de 1890. Através da caracterização dos personagens a autora faz um retrato muito real da era vitoriana. A ideia que tinha sobre esta época é que seria uma sociedade pródiga em moralismos, preconceitos rígidos e proibições severas em que o papel da mulher era bastante limitado, claro. Ora, Cora, a personagem sobre a qual gira a acção, foge bastante ao esteriotipo de como deveria comportar-se a mulher na altura. Cora começa verdadeiramente a viver depois da morte de seu marido. Sentia-se aprisionada, limitada nos seus gestos, ignorada, reprimida e é com uma alegria que quer conter, ou pelo menos não mostrar abertamente, que assiste ao terminus do seu casamento e altera toda a sua vida. Um pouco excêntrica tanto na sua forma de vestir como nas suas ideias muda-se, com o seu estranho e distante filho e uma amiga para Colchester onde se depara com alguns rumores sobre a serpente de Essex e com alguns habitantes de uma aldeia próxima bastante sui generis.  A autora, quanto a mim, soube caracterizá-los ao pormenor e com mestria o que me despertou um interesse crescente.

Assim, lentamente, os personagens foram-se-me entranhando. Gostei particularmente das descrições dos procedimentos médicos no que concerne, por exemplo, ao tratamento e investigação da tuberculose e também, dos relatos das dificuldades sociais vividas pela população mais pobre.

O desenrolar dos acontecimentos adensa-se e, se tinha algum receio inicial de não gostar desta leitura, ele desvaneceu-se totalmente. A floresta, os pântanos, o denso nevoeiro muito bem descrito; a crescente empatia com os personagens; a forma como é descrita toda uma população que reage e sobre-reage a uma lenda dando outro sentido aos acontecimentos que se fazem sentir; o romance que nasce entre dois personagens, que sendo importante, não cai no erro comum de dominar a história, tudo isto fez-me estar presente no local e na época. E isso é o que nós, leitores, procuramos quando pegamos num livro, não é? Estar dentro da leitura, pertencer à história que estamos a ler...

Gostei particularmente do final que não poderei considerar como "aberto" mas sim de "subentendido". Como se o livro terminasse com reticências e não com dois pontos e muito menos com um ponto final.

Depois de acabar as últimas páginas tive vontade de pesquisar sobre esta lenda da serpente que dá título ao livro e de que não tinha ouvido falar. Existiu realmente todo este temor que chegou a condicionar a vida de algumas pessoas? E isso é outra das coisas que me faz ser uma leitora ávida: aprender, pesquisar, conhecer. 

Por tudo isto posso afirmar-vos que gostei muito desta leitura e que a recomendo!

Terminado em 18 de Março de 2017

Estrelas: 4*+

Sinopse
Londres, 1893. Quando o marido de Cora Seaborne morre, a viúva inicia uma nova vida marcada ao mesmo tempo por alívio e tristeza.
Não teve um casamento feliz e ela própria nunca se adequou ao papel de mulher da sociedade. Acompanhada pelo filho, Francis - um rapaz curioso e obsessivo -, troca a cidade pelo campo de Essex, onde espera que o ar fresco e os grandes espaços lhe proporcionem o refúgio de que necessita.
Quando se instalam em Colchester, chegam-lhe aos ouvidos rumores de que a Serpente do Essex, conhecida por em tempos ter percorrido os pântanos na sua avidez de colher vidas humanas, regressou à aldeia de Aldwinter. Cora, naturalista amadora sem interesse por superstições ou questões religiosas, fica empolgada com a ideia de que aquilo que as pessoas da região tomam por uma criatura sobrenatural possa, na realidade, ser uma espécie ainda por descobrir. Quando decide iniciar a sua investigação é apresentada ao vigário de Aldwinter, William Ransome. Tal como Cora, Will sente uma desconfiança profunda em relação aos boatos, que considera um fenómeno de terror de caráter moral e um desvio da verdadeira fé. Enquanto Will procura tranquilizar os paroquianos, inicia-se entre ele e Cora uma relação intensa; apesar de os dois não concordarem a respeito de nada, são atraídos e afastados um do outro inexoravelmente, a ponto de isso modificar a vida de ambos de formas inesperadas.
Escrito com uma delicadeza e uma inteligência cheias de requinte, este romance é sobretudo uma celebração do amor e das muitas formas que ele pode assumir.

quinta-feira, 23 de março de 2017

A escolha do Jorge: "Os Excluídos"

Há livros que passadas semanas pouco nos recordamos deles, dos seus personagens, das suas histórias, ficando somente uma vaga ideia se gostámos ou não da obra. Outros há que passados meses e até anos, os seus personagens e enredos apresentam-se gravados na nossa memória como se fizessem parte de nós.
O livro que apresento hoje é um pouco exemplo disso. Não se trata de uma leitura realizada nas últimas semanas, mas sim no Verão passado. Por alguma razão, acabei por nunca ter escrito sobre o livro, não que tivesse dado primazia a outros ou que tivesse gostado mais de outros em detrimento deste. Não aconteceu simplesmente.
O livro que proponho esta semana intitula-se “Os Excluídos” de Elfriede Jelinek (n. 1946), Prémio Nobel da Literatura, em 2004, e constituiu uma das minhas leituras preferidas de 2016, tendo sido igualmente o primeiro contacto que tive com a escrita desta autora austríaca.
Viena. Anos 50. Um grupo de jovens tem a pretensão de se demarcar do modo de vida e dos valores face à geração anterior com todo um passado ligado ao nazismo e a tantos outros esqueletos no armário. A Áustria, neste período da História recente, é ela própria um cadáver tentando sobreviver ao passado e às escolhas que fez enquanto país. Um país cujos jovens tentam sobreviver ao estigma da culpa dos progenitores face à mancha sangrenta derramada na História da
humanidade, mas cujas estratégias de sobrevivência não os torna necessariamente melhores pessoas, melhores seres humanos, em comparação com os seus pais.
Jovens que têm a pretensão a constituir uma elite formada, em boa verdade, por pessoas já falhadas por carregarem o estigma do passado. Jovens que almejam pertencer a um grupo culturalmente superior, mas cuja distinção apenas consegue fazer vítimas dos seus desejos primários. Sentirem prazer ao espancarem um indivíduo é tudo quanto o seu nível cultural consegue almejar! Mas estes jovens pretendem ir mais longe. Gostariam de perceber e de sentir o que é tirar a vida a alguém. Jovens pérfidos, psicologicamente perturbados, valores fora do lugar num país à nora que tenta
encontrar o seu rumo face a tanta loucura, sofrimento e assassinatos perpetrados no decurso da 2ª Guerra Mundial.
Elfriede Jelinek não é mansa a escrever! Diria que a autora é dotada de uma escrita fortemente masculinizada, bruta, despojada de sentimentos, fria como uma máquina numa fábrica que cumpre a sua função. Não raras vezes, o leitor é confrontado com momentos de irritação, má-disposição, enervamento e vontade até de largar o livro. A escrita de Elfriede Jelinek é despojada de floreados ou prosa poética. Se é para bater, bata-se com força! É para doer! Se é para matar, que se seja exemplar no acto!
Com Elfriede Jelinek temos o lado negro e obscuro da literatura que nada mais é do que um reflexo de tudo quanto é mau na humanidade, nos sentimentos e no agir. Elfriede Jelinek é crua e cruel na forma como escreve e talvez seja graças a esses traços que uma obra como “Os Excluídos” dificilmente de esquece, mesmo tendo passado tanto tempo depois da leitura.
Não direi de forma alguma que “Os Excluídos” é um livro amoral ou imoral ainda que os personagens actuem entre uma e outra, no entanto, não deixa de ser uma obra inquietante e não menos terrível. Em todo o caso, Elfriede Jelinek é um “monstro” a escrever!
Mais, não deixa de ser preocupante face ao rumo que a Europa está a tomar nos dias que correm, na sequência do avanço inclemente e impiedoso da extrema direita, que este romance não deixe de ter eco até ao presente. A indiferença e o desejo de opressão e de exclusão face ao outro que se considera estranho ou a mais na sociedade, passa gradualmente a ser alvo político de radicalismo onde falta o bom senso e o sentido de História e a recuperação da memória para medir perigos iminentes, tão semelhantes ao período da década de 30 e início dos anos 40 do século passado.

Excertos:
“Sade diz que é preciso cometer crimes. Usa-se a palavra crime a este propósito para seguir o consenso geral, mas entre nós nunca designaríamos assim um dos nossos actos (Anna). Nós precisamos da norma válida na consensualidade para nos excitarmos com a nossa própria desmesura. Somos monstruosos, ainda que tenhamos o aspecto de burgueses como camuflagem. Somos filhos de burgueses mas não ficámos por aí. No íntimo estamos corroídos de más acções, no exterior somos alunos do liceu.” (pp. 44-45)

“A mãe comete agora o erro decisivo, como sempre que se enfurece e já não consegue controlar-se perante o seu filho, de falar do campo de concentração, da criança que estava a comer uma maçã e que foi atirada contra a parede até morrer, e cuja maçã foi a seguir acabada de comer pelo assassino. E das crianças que foram atiradas da janela do segundo andar por crueldade. E da mãe que foi mandada para a câmara de gás com o filho de dois dias porque tinha pedido ao médico que ainda a deixasse dar à luz. O médico tinha autorizado.” (p. 144)

Texto da autoria de Jorge Navarro

sábado, 18 de março de 2017

Na minha caixa de correio

     

   

  

  

 



Comprados numa loja Cash Converters: A Grande Casa, Alguma Vez Tiveste Uma Família, Unha com Carne e Adeus Avô.
Não se Pode Morar nos Olhos de um Gato e Morrer Sózinho em Berlim, oferta de aniversário.
Três Bichos te Esperam e Quatro te Comerão oferta do autor.
A Substância do Mal, oferta de Suma de Letras.
Da Elsinor, chegou-me Yoro.
Deus não Mora em Havana, oferta da Bizâncio.
A Mãe Eterna foi oferta da Objectiva.
Da Editora Arena, O Segredo da Cura.
Da Chá das Cinco, Superalimentos - Refeições com Mais Vida.
Corações de Pedra, foi oferta da Saída de Emergência.
O Poder das Pequenas Coisas, presente da Editorial Presença.
O Livro do Chá Matcha, oferta da Planeta.
Comprado em segunda mão, entrou em casa Baluartes.




sexta-feira, 17 de março de 2017

Convite para primeiro lançamento da Editora Minotauro


Novidade TopSeller


E se o seu filho, sem nunca falar, lhe ensinasse a maior lição da sua vida?

Os Jewell podiam ser uma família comum, mas as suas relações disfuncionais e as sombras de um passado desconhecido não o permitem.

Ben Jewell bateu no fundo do poço. O seu filho de dez anos, Jonah, sofre de autismo profundo, e tanto ele como Emma, a mãe exausta, começam a não conseguir lidar com a doença. Para que o filho seja aceite numa escola adaptada às suas necessidades, decidem forjar uma separação. As lembranças de um casamento feliz são agora meras memórias, perdidas por entre os silvos e os ataques de Jonah.

Ben muda-se para casa do seu pai Georg e leva Jonah consigo. E a partir desse momento, o silêncio que habitava entre as três gerações de homens desaparece. A aura quase mágica de Jonah vai mudar o triste fado da sua família para sempre.

Novidade Presença

O Poder das Pequenas Coisas
de Jodi Picoult 
Ruth Jefferson é uma enfermeira obstetra com mais de vinte anos de experiência. Um dia, durante o seu turno, começa uma avaliação de rotina a um recém-nascido. Minutos depois é informada de que lhe foi atribuído outro paciente. Os pais do bebé são supremacistas brancos e não querem que Ruth, afro-americana, toque no seu filho. O hospital acede a esta exigência, mas no dia seguinte o bebé enfrenta complicações cardíacas. Ruth está sozinha na enfermaria. Deve ela cumprir as ordens que lhe foram dadas ou intervir? O que se segue altera a vida de todos os intervenientes e põe em causa a imagem que têm uns dos outros.

Com uma empatia, inteligência e simplicidade notáveis, Jodi Picoult aborda temas como a raça, o privilégio, o preconceito, a injustiça e a compaixão num livro magistral sem respostas fáceis. O Poder das Pequenas Coisas vai ser adaptado ao cinema, com Viola Davis e Julia Roberts nos principais papéis.

Para mais informações sobre este livro, consulte o site da Editorial Presença, aqui.

Novidade Minotauro

Serpente de Essex
de Sarah Perry 
Londres, 1893. Quando o marido de Cora Seaborne morre, a viúva inicia uma nova vida marcada ao mesmo tempo por alívio e tristeza. Não teve um casamento feliz e ela própria nunca se adequou ao papel de mulher da sociedade. Acompanhada pelo filho, Francis – um rapaz curioso e obsessivo –, troca a cidade pelo campo de Essex, onde espera que o ar fresco e os grandes espaços lhe proporcionem o refúgio de que necessita. Quando se instalam em Colchester, chegam-lhe aos ouvidos rumores de que a Serpente do Essex, conhecida por em tempos ter percorrido os pântanos na sua avidez de colher vidas humanas, regressou à aldeia de Aldwinter. Cora, naturalista amadora sem interesse por superstições ou questões religiosas, fica empolgada com a ideia de que aquilo que as pessoas da região tomam por uma criatura sobrenatural possa, na realidade, ser uma espécie ainda por descobrir. Quando decide iniciar a sua investigação é apresentada ao reverendo de Aldwinter, William Ransome. Tal como Cora, Will sente uma desconfiança profunda em relação aos boatos, que considera um fenómeno de terror de caráter moral e um desvio da verdadeira fé. Enquanto Will procura tranquilizar os paroquianos, inicia-se entre ele e Cora uma relação intensa; apesar de os dois não concordarem a respeito de nada, são atraídos e afastados um do outro inexoravelmente, a ponto de isso modificar a vida de ambos de formas inesperadas. Escrito com uma delicadeza e uma inteligência cheias de requinte, este romance é sobretudo uma celebração do amor e das muitas formas que ele pode assumir.

Novidade Idioteque

Três Bichos te Esperam, Quatro te Comerão
de Manuel Andrade
Um velho numa maca de hospital rebobina a vida, lembrando muito do que passou e questionando o que verdadeiramente subsiste desta passagem efémera. A obra, escrita em 2007, resulta de uma psicanálise retardada a uma relação que o escritor - na altura psicólogo clínico - manteve com um moribundo votado a uma maca de hospital: um velho agreste e violento, inveterado apalpador de rabos de enfermeiras, embora ao mesmo tempo filosófico e senhor de desafiantes derivas mentais. É uma obra catártica que Urbano Tavares Rodrigues não hesitou em classificar de “mergulho nas vísceras do ser humano”, por questionar, de uma forma quase cortante e não raro no fio da navalha, o que andamos afinal nós todos aqui a fazer, o que vale verdadeiramente a pena e o que não vale coisa absolutamente nenhuma. São novos horizontes que se abrem sobre o remorso humano, o desejo ardente que envelhece e as aspirações dolorosamente não concretizadas da existência humana.

quinta-feira, 16 de março de 2017

A escolha do Jorge: "Pastoralia"


Publicado em 2000, a colectânea “Pastoralia” de George Saunders (n. 1958) reúne uma novela e cinco contos, considerados como uma das referências da literatura estadunidense na viragem do século. A obra foi recentemente publicada pela Antígona, cujo autor passa a integrar o leque de autores insubmissos na forma como reflecte sobre a realidade, fazendo uma análise ao modo como o capitalismo estrangulou a vida comum das pessoas, sobretudo aquelas pessoas que perderam o comboio, ficando com a vida em suspenso.
Dificuldades económicas, doenças do foro psiquiátrico tantas vezes desenvolvidas na sequência do desemprego e desestruturação familiar, sobrevivência aniquilada por uma realidade que se impõe e que é estranha e cujos mecanismos de escape e de redenção são tantas vezes o reforço do alheamento social, assim como da consolidação das estruturas políticas e económicas corrosivas que transformam a democracia e o capitalismo numa derrocada social análoga à ideia de a carne se separar dos ossos por deixarem de fazer parte do mesmo organismo.
A falta de aspirações por falta de consciência e até de liberdade, contribui largamente para a dependência de uma parte significativa da sociedade de programas de televisão que ainda a vai embrutecer mais, tornando-a cada vez mais submissa. Toda uma cultura de massas em que não há espaço para a reflexão conduz sobremaneira para essa aniquilação e desmembramento.
“Pastoralia” é a novela de abertura deste volume de George Saunders e, provavelmente o melhor desta obra, talvez pelo seu desenvolvimento e toda a problemática social apresentada. A novela apresenta-se como uma distopia na medida em que apresenta, de uma forma crua e desprovida de
sentimentos, o modo como “simples funcionários” de uma empresa se submetem aos critérios e desígnios de funcionamento da mesma, transformando-se em verdadeiras peças de xadrez em que, face à pressão dos números e dos resultados, haverá sempre alguém a abater, como os mais fracos, os mais frágeis, os incapazes, entre outros. É a sobrevivência pela sobrevivência. É a sobrevivência de quem precisa do trabalho para viver para poder ajudar o filho doente que necessita de acompanhamento e de tratamentos em detrimento de quem precisa de trabalhar para garantir o vício da toxicodependência do filho e para pagar a alguém que cuide da mãe acamada. Uma prioridade que se sobrepõe sobre a outra sem dó nem piedade. Os números, as metas, o desempenho dos funcionários que geram a contenda e a mesquinhez entre si numa tentativa de sobreviver. De sobreviver a algo que não se sabe muito bem o quê, nem como! Mas cuja sobrevivência e modo de vida é controlada por esferas e cúpulas superiores que, tantas vezes, nem sequer um rosto possuem. É o poder da macroestrutura que se impõe, mina e corrompe a vida humana na sua essência, privando-a da realização do seu fim, a felicidade.
Imagine-se uma empresa, um parque de diversões decrépito que tem como objectivo mostrar aos visitantes como se vivia nos tempos do Homem de Neanderthal, no Paleolítico Superior. Os funcionários da empresa simulam habitar a caverna onde não pode haver espaço para falar inglês, libertando-se de tudo o que é referência civilizacional, reflexo das conquistas feitas pela Humanidade, abandonando-se ao viver primitivo, bárbaro, como o simular apanhar bichos para comer, grunhir, desenhando ou pintando na caverna aludindo parcamente à ideia da arte parietal.
É neste contexto que os funcionários deste parque de diversões decrépito vivem não vivendo, anulam-se perante a sua condição de seres humanos face a uma ordem superior que os controla totalmente. O andar por ali nos tempos livres, mesmo sem visitantes, reflecte a forma de rudeza e de indiferença a que a sociedade contemporânea chegou, uma total submissão à ordem estabelecida sem que para tal se questione, por falta de consciência, porque até o trabalhar e desenvolver essa faculdade foi aniquilado.
“Pastoralia” apresenta, neste sentido, situações que têm tanto de caricato, bizarro, mas também de surreal. O humor negro suaviza em certa medida o carácter agressivo das situações descritas, tornando até comoventes algumas das histórias. Se por um lado sorrimos perante a incredulidade apresentada, é certo que também sorrimos perante alguma incapacidade da nossa parte enquanto cidadãos em reverter essa mesma situação. Se “Pastoralia” nos diverte e ocupa o tempo, também nos transmite uma certa frieza e tristeza face à forma como a sociedade chegou até aqui, fazendo-nos questionar qual é o nosso lugar e como pretendemos ser felizes enquanto seres humanos na sua individualidade e em sociedade.

Excertos:
“- Vendeste a televisão? – diz ela.
- Nunca havia programas de jeito! – diz ele. – Se houvesse bons programas, eu teria recuperado de certeza. Mas não. Era tudo chato. Portanto decidi organizar uma festa para toda a gente, porque tinham sido todos tão simpáticos comigo ao deixar-me manter a televisão no meu quarto. E portanto, estás a ver, vendi a televisão, a pensar na festa, e levei o dinheiro à Loja das Festas, para comprar algumas coisas para a festa, chapéus e apitos e assim, mas depois tenho este problema, com substâncias, e portanto, tipo, assim de repente, apeteceu-me substâncias. E depois cruzei-me com um tipo que vendia substâncias. O tipo lixou-me à grande! Aparecer ali com substâncias logo numa altura em que eu tinha dinheiro? Ele estava-se a marimbar para o meu processo de recuperação. 
- Vendeste a televisão da clínica para comprar droga – diz ela.
- Para comprar substâncias, mãezinha, importas-te de usar as palavras certas? – diz ele. – Os nomes que damos às coisas são importantes, mãezinha, o Doe ensinou-me isso numa das sessões. Tudo bem, se calhar não devia ter vendido a televisão, mas tu não és uma consumidora involuntária de substâncias, e sabes que mais, eu sou, por isso é que lá estava. Percebes o que estou a dizer? Eu sei que gostavas de ter um filho perfeito, mas não tens, tens um filho que é um consumidor involuntário de substâncias e que por vezes comete erros de avaliação, tipo pedir uma televisão emprestada e depois vendê-la para comprar substâncias.
- Ou anéis e jóias – diz Janet. – Os meus anéis e as minhas jóias.
- Foda-se mãezinha, isso foi há tanto tempo! – diz ele. – Porque é que estás sempre a falar nessas merdas antigas? O Doe é que tinha razão. Para tu ganhares, eu tenho de perder. Tipo como quando eu era miúdo e disseste à frente da rua inteira que eu era torturador de animais? Isso magoou-me muito. Isso causou-me muitos problemas. Estávamos a resolver esse assunto nas sessões de grupo antes de me vir embora.
- Apanhei-te a torturar um gato – diz ela. – Com a porra de um espeto.
- Um espeto que eu próprio construí na aula de Trabalhos Manuais – diz ele. – Mas claro que dessa parte nunca falas.” (in “Pastoralia”, pp. 44-46)

"Na urbanização Carvalho do Mar não há carvalhos nem há mar, só uma centena de apartamentos sociais com vista traseira para os correios. A Min e a Jade estão a amamentar os bebés enquanto vêem um programa chamado 'Como o Meu Filho Morreu de Morte Violenta'. A Min é minha irmã. A Jade é nossa prima. 'Como o Meu Filho Morreu de Morte Violenta' é apresentado por Matt Merton, um loiro com um metro e noventa que está sempre a abraçar os pais pelos ombros e a dizer-lhes que foram santificados pelo sofrimento. O programa de hoje apresenta um miúdo de dez anos que matou um de cinco anos quando este recusou juntar-se ao seu gangue. O miúdo de dez anos estrangulou o miúdo de cinco anos com uma corda, encheu-lhe a boca com autocolantes, depois fechou-se na casa de banho e não saiu enquanto os pais não prometeram levá-lo à FunTimeZone, onde confessou o crime antes de mergulhar aos berros numa gaiola cheia de bolas de plástico. O público está a gritar ameaças aos pais do assassino enquanto os pais da vítima sugerem tolerância e misericórdia com tanta ênfase que a dada altura o público começa a ameaçá-los também.”  (in “Carvalho do Mar”, p. 113)

Texto da autoria de Jorge Navarro

terça-feira, 14 de março de 2017

A convidada escolhe: Contos Sublimes

De entre a extensa obra de Hermann Hesse, os vinte e sete contos que compôem esta colectânea foram escritos quando tinha e vinte e tal anos. São contos com temáticas muito variadas em que se percebe uma necessidade juvenil de reflectir sobre a vida, sobre o mundo, sobre o amor, sobre as angústias do crescimento. Certamente que muitos reflectem a própria vida do autor e as suas angústias enquanto membro de uma família muito religiosa e com padrões de vida e conduta demasiado rígidos e castradores, que o levaram mais tarde a romper com a família e seguir o seu próprio caminho.
São diversos os contos em que o personagem central é ora um menino solitário entregue á paixão pelo desenho, ou um jovem obrigado a frequentar o seminário e que encontra nos livros o escape para um futuro que não deseja, ou o jovem que corre mundo para aprender uma profissão começando por aprendiz até ser serralheiro. Mas, embora ainda jovem, o autor mostra em alguns contos uma capacidade de divagar e reflectir sobre a velhice, a decadência ou a solidão, mais próprios de um homem já avançado na idade.
A ideia da viagem, da errância, da descoberta de outras paragens é também um dos temas, ora como sinal de crescimento, ora como fuga, ora como descoberta pessoal, quer no contacto com outros, quer no encontro consigo mesmo. A literatura e a paixão pelos livros, a pintura e a música, para além de descrições de paisagens, verdadeiras pinturas cheias de detalhe que permitem ao leitor/a imaginá-las na sua diversidade e com a luz que lhes são próprias, consoante a hora ou a estação em que a acção decorre, são características destes contos que verdadeiramente me impressionaram.
Destaco aqui o último conto, talvez aquele de que mais gostei “Uma Viagem a Pé pelo Outono”. É um regresso ao passado, numa tentativa de reviver um período feliz da sua juventude, que me recordou aquela canção que diz que nunca se deve voltar ao lugar onde uma vez se foi feliz! O facto de o narrador fazer propositadamente a viagem a pé, para desfrutar desses lugares com uma memória precisa, encontrando pessoas que já não o reconhecem e que, entretanto, fizeram a sua vida e se modificaram, é um convite para o/a leitor/a o acompanhar nessa viagem, dada a forma soberba como as descrições da natureza, das paisagens, ambientes e situações reflectem não só o ambiente envolvente, mas o estado de espírito do viajante.
“O caminho seguia vale acima, acompanhando o ribeiro durante algum tempo e depois subindo em direcção ao cimo da floresta. Enquanto caminhava, ocorreu-me que no fundo tinha seguido sozinho por todos os caminhos, e não apenas nos meus passeios, mas em todos os passos da minha vida. Amigos e parentes, bons conhecidos e amores estavam sempre presentes, mas nunca me continham, nunca me preenchiam, nunca me desviavam para percursos diferentes daquele que eu próprio tinha escolhido. Talvez cada pessoa, seja ela como for, é como uma bola que foi atirada numa dada direcção, que segue um percurso há muito estabelecido ao mesmo tempo que pensa estar a forçar ou a provocar o destino. De qualquer modo, o “destino” reside em nós e não no exterior, o que dá à superfície da vida, aos acontecimentos visíveis, uma certa irrelevância. Aquilo que habitualmente nos pesa e que nos parece tão trágico torna-se então, muitas vezes, uma bagatela.”

Almerinda Bento
Março 2017

sábado, 11 de março de 2017

Na minha caixa de correio

        



A Serpente de Essex foi oferta de uma nova editora (Minotauro) que está a preparar novidades irresistiveis! Aguardem!
Os Preponderantes foi oferta de uma amiga pelo meu aniversário. Obrigada Vera!
Os restantes livros foram ganhos nos passatempos do JN.